Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, setembro 15, 2005

JANIO DE FREITAS Capital dos cheques

folha de s paulo
 
Um dia como nenhum outro, nem mesmo em Brasília.
O presidente da Câmara dos Deputados é levado à escada do cadafalso nas asas do cheque sujo que afirmara não existir. O plenário da Câmara dos Deputados vota a proposta de cassação do deputado que denunciou os cheques da patifaria recebidos por outros deputados -aquele mesmo a quem Lula daria um cheque em branco. E o marqueteiro do presidente da República é conduzido a outro aperto na polícia sobre cheques depositados em suas contas no exterior.
À corrupção faltou, porém, a sincronia dos seus eventos. Severino Cavalcanti e o empresário pagador sobrepuseram-se ao julgamento de Roberto Jefferson e apropriaram-se de grande parte da expectativa criada pelo prometido espetáculo na Câmara. No país das novelas recomendava-se a divisão em capítulos.
Mas as aflições políticas não ficaram com Jefferson nem com Severino. Caíram sobre o Planalto e o PT. A vitória de Jefferson significaria uma derrota onerosa para o governo e humilhante para o PT, que desde o primeiro momento das denúncias lutou como pôde para destruir o denunciante, já que a histeria de sua negação inicial às acusações descambou para o ridículo sem saída. A vitória, por sua vez, não traria solução para os problemas do PT e do governo.
E então sobrevém o caso de Severino. Ou porque a boca já lhe está inevitavelmente torta, ou pela paralisia mental que o acomete nos últimos tempos, o PT logo se põe ao lado do acusado de corrupção.
Para ser mais exato, não foi de modo assim tão reto, até porque isso implicaria retidão. Feita a acusação a Severino no fim de semana, o PT cobriu-se de cautelas. Pegou mal. Por isso o líder do PT na Câmara, o nervoso deputado Henrique Fontana, abriu a segunda-feira petista com uma inversão: o partido ia aliar-se aos outros partidos no pedido de investigação da denúncia contra Severino. Antes que o dia terminasse, no entanto, o deputado Henrique Fontana já representava nova inversão, agora oposta à representação contra Severino no Conselho de Ética da Câmara. Era a preparação do vexame de ontem: como se recusara a assinar o pedido, o governo e o PT foram tão atingidos quanto Severino pelo aparecimento do cheque da propina ou extorsão de que é acusado o presidente da Câmara.
Circunstâncias técnicas me obrigam a escrever antes de feita a votação na Câmara. A capacidade do jornalismo de produzir frustrações é inesgotável. Mas não seria preciso o resultado para esta afirmação: mantido ou perdido o seu mandato, Roberto Jefferson prestou um serviço gigantesco ao país, e não se pode dizer o mesmo, nem de longe, dos seus adversários atuais.

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