Da mesma forma que chamara o candidato do PTB, Luiz Antonio Fleury Filho, para convencê-lo (certamente com bons argumentos) a manter sua candidatura, para dividir os votos do "baixo clero" que iriam ser canalizados para o candidato do PP (e do Severino) Ciro Nogueira, o Planalto convocara Costa Neto para pedir-lhe apoio direto a Aldo Rebelo, imaginando-se tudo o que possa lhe ter oferecido, em troca. Dessa forma, a costura tentada pelo candidato peemedebista com o PL e o PTB foi prontamente desalinhavada pelo presidente Lula. Se isso não bastasse, cinco ministros foram despachados para o recinto da Câmara horas antes da votação para a escolha de seu presidente. E, depois do empate em primeiro turno (por 182 votos) dos candidatos do governo (Aldo Rebelo, do PC do B) e da oposição (José Thomaz Nono, do PFL), como era de se esperar, o rolo compressor do governo, certamente rolando sobre o eixo de muitas verbas e promessas, acabou resultando em uma vitória final do candidato governamental - embora pela exígua diferença de 15 votos.
Há que se observar, despudores na cooptação à parte (especialmente na captação dos 135 votos "soltos" do baixo clero, mais propícios à adesão fisiológica), que o governo Lula cravou uma importante vitória depois de sucessivas derrotas - especialmente desde o advento da desastrada era severina. Mais importante ainda - e aí não só para o governo, mas para o Legislativo e o País - foi o fato de na disputa final estarem dois parlamentares de nível e estatura ética compatíveis com a responsabilidade de comandar a Câmara. Ambos fizeram bons pronunciamentos, salientando a importância de a Câmara dos Deputados exercer e valorizar sua independência. É verdade que o candidato vitorioso, o comunista Aldo Rebelo - pessoa de idoneidade irreprochável -, deve ter feito um certo esforço moral (quem sabe com o auxílio da crença ideológica segundo a qual "os fins justificam os meios") para superar o constrangimento causado pelo rolo compressor governamental.
Aliás, em termos de constrangimento, outros vitoriosos - como o ministro das Relações Institucionais, Jaques Wagner - podem ter disfarçado o choro de pejo com o de alegria. E não precisaria Wagner dizer que o Palácio venceu sem vender a alma porque ninguém suspeitou dessa venda - sabendo tratar-se de compra... De qualquer forma, o que fica é um homem de bem à testa da Câmara dos Deputados, em um momento especialmente importante, no qual essa Casa Legislativa deverá passar por uma indispensável faxina moral. Tenhamos presente, ad cautelam, que os parlamentares que se mostravam mais aliviados - e mesmo eufóricos - com o resultado dessa eleição interna da Câmara eram, justamente, os mensalados, a saber, o grupo de deputados já indicados para cassação, pelos relatórios das CPIs em curso no Congresso. Registremos, também, que o deputado Aldo Rebelo é uma das testemunhas de defesa do deputado José Dirceu - que talvez seja o deputado sobre o qual recai o maior grau de responsabilização pela crise moral que se abateu sobre o governo Lula e seu principal partido.
Que essas cautelas, no entanto, sirvam para enfatizar a necessidade de Aldo Rebelo vir a cumprir a expectativa de independência de atuação, que levou a seus pares e à Nação, ao candidatar-se à presidência da Câmara dos Deputados. Pois a verdadeira expectativa da sociedade brasileira é a de que quando for colocado, para deliberação da Casa, o destino dos mandatos dos mensaláveis, se perceba que estes foram precipitados em seu eufórico alívio, com a vitória do novo presidente.