Maria Cristina Fernandes |
Valor Econômico |
23/9/2005 |
O PT tem sido o melhor escudo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva contra a insinuação de que seu governo tende ao chavismo. Com a ausência na votação do domingo, Lula corre o risco de perder esta proteção. Mas o presidente não parece nem um pouco preocupado com isso. Estivesse, teria inventado uma viagem qualquer para justificar a ausência. Mas passou o domingo inteiro em São Bernardo enquanto manifestantes lulistas e anti-lulistas lotaram o diretório local das 9 da manhã às 5 da tarde aguardando sua presença. O argumento de que se temia por sua segurança só reforça os risco de sua ausência. Se além de desprezo, Lula tem medo de seus correligionários, deve ser lembrado que o prazo para mudança na filiação partidária das eleições de 2006 esgota-se no próximo dia 30. Recomenda-se-lhe o PMDB, partido que tem agido nesta crise com astúcia de fazer inveja ao presidente da República. Lula dá sinais de que quer manter-se à distância da briga de foice que se desenrola na sucessão petista. Isso como se sua trajetória no partido não tivesse sido marcada pelo fomento às divergências internas no PT. Lula sempre foi o principal estrategista do PT. A imagem de operário com ingênua autenticidade de classe, lembra o ex-dirigente petista e sociólogo Rudá Ricci, foi incensada pela Igreja Católica. Foi como estrategista partidário que Lula fomentou o dissenso para evitar o surgimento de uma alternativa hegemônica à sua Articulação, hoje transmutada em Campo Majoritário. O professor Mauro Iasi, eleitor há 25 anos do mesmo diretório de São Bernardo em que vota Lula, relata uma conversa de Lula com o economista Celso Furtado em que este havia aconselhado o líder petista no seu relacionamento com as facções de seu partido - "A melhor forma para se controlar a esquerda é mantê-la sempre por perto". Iasi votou em Plínio de Arruda Sampaio e entregou sua carta de desfiliação depois da eleição. Atribuiu a descaracterização do PT em grande parte à instituição das eleições diretas no partido. Até a ascensão do deputado José Dirceu ao comando, os filiados eram chamados a participar de encontros em que se elegiam teses e delegados que as representavam nos Congressos. Nestes, os delegados debatiam as teses e escolhiam a direção do partido. Hoje o debate de teses foi esvaziado e o militante é chamado de quatro em quatro anos para eleger as chapas que dirigirão o partido. O novo formato retirou fôlego das disputas internas, mas não conseguiu extirpá-las. Para fugir à guerra das facções, Lula criou canais independentes do partido. Foi assim que surgiu o Instituto da Cidadania, transformado num fórum de elaboração das políticas do governo paralelo que marcou sua oposição petista dos anos 90. Também foi por fora do partido que se costurou a Carta ao Povo Brasileiro. Antes das denúncias virem à tona, o PT se preparava para o encontro nacional que incorporaria as premissas da 'Carta' ao programa do partido. Pelo céu de brigadeiro em que corriam as chances de reeleição de Lula, era bem possível que viessem a conseguir. Presidente despreza o PT de olho em 2006 Lula sempre elaborou as estratégias, diz Ricci, mas foi José Dirceu quem, a partir de 1995, ao assumir o partido, passou a operá-las. Foi assim até as vésperas da posse, quando Dirceu montou o acordo com o PMDB e foi impedido por Lula de fechá-lo por razões até hoje pouco esclarecidas. Uma hipótese é a de que Lula, percebendo a facilidade com que Dirceu transitava no acordo com o PMDB, temesse perder a ascendência sobre a coordenação política de seu governo. Achou mais fácil dispersar o apoio entre PTB, PL e PP, assim como sempre manteve atomizada sua oposição interna no PT. Lula parece convicto de que foi ele quem levou o PT ao poder e não o contrário. É possível que esteja certo. Antes de chegar à Presidência, Lula costumava dizer que, antes de ser de esquerda, é metalúrgico. Mas, para romper o histórico quarto do eleitorado que o PT sempre pontuou nas eleições precedentes e chegar ao eleitorado de centro, foi decisiva a tardia percepção de que o metalúrgico converteu-se à mudança sem ruptura. As forças que agora retomam poder no partido forçarão a ruptura que o presidente não deseja. Lula já previa isso quando decidiu faltar à eleição que se desenrolava na porta de sua casa. Agora já não tem mais Dirceu ao seu lado para mantê-las a uma distância regulamentar. Se a estratégia com que buscará o segundo mandato é o apelo direto às massas, nada mais conveniente que um partido consumindo-se internamente. Some-se a isso o fato de líderes dos movimentos sociais não estarem sendo capazes de convencer suas bases a romper com Lula. Marilena Chauí talvez tenha exagerado ao dizer que o PT é o pilar da democracia brasileira. O desprezo de Lula por seu partido pode até ajudar sua reeleição, mas é uma ameça à fagulha democrática que o PT ajudou a pontuar na cena política brasileira. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, setembro 23, 2005
Política - Abstenção abre porta ao chavismo
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