Sem apoio nos partidos, governo busca voto de dissidentes para eleger Aldo na Câmara Desta vez não são as querelas do PT, mas a briga interna do PMDB que desenha com traços firmes de novo um cenário de derrota para o governo na disputa pela presidência da Câmara.
Convencido pelos senadores governistas Renan Calheiros e José Sarney de que não convinha apostar em candidato petista, muito menos apoiar o nome do presidente do PMDB, Michel Temer - adversário de ambos no partido -, o presidente Luiz Inácio da Silva jogou suas fichas em Aldo Rebelo, cuja candidatura dá sinais explícitos de fragilidade.
Até coordenadores da campanha de Rebelo já reconhecem isso em conversas com articuladores de outras candidaturas. Há ministros, por exemplo, dizendo francamente que não foram responsáveis pela escolha.
Eles transferem claramente a responsabilidade para o presidente do Senado, Renan Calheiros. Aliado de Rebelo nas questões eleitorais de Alagoas e inimigo de Temer dentro do PMDB, ele patrocina a candidatura com dois objetivos: estender seu poder de influência à Câmara e se fortalecer no partido.
Até agora tem obtido resultado contrário e o clima entre os deputados já guarda semelhança com o ambiente geral de rejeição que se estabeleceu em torno da candidatura petista de Luiz Eduardo Greenhalgh quando da eleição de Severino Cavalcanti.
Na ocasião, o colegiado reagiu contra o que interpretou como uma tentativa de imposição do PT e do Palácio do Planalto de um nome que atenderia ao mesmo tempo às vontades do governo e às conveniências do PT, àquela altura necessitado de fazer um gesto de boa vontade à esquerda e aos chamados movimentos sociais simpáticos a Greenhalgh, que tampouco atrapalhava os planos dos petistas envolvidos no embate pela candidatura ao governo de São Paulo.
Agora, por outras vias e motivos diversos, repete-se a contrariedade com mais gravidade porque a interferência é dupla: do governo, pois Rebelo era até outro dia ministro e recentemente foi testemunha de defesa de José Dirceu no processo de cassação, e do Senado, explícita nos movimentos do presidente daquela Casa.
A 48 horas da eleição, o quadro realmente não é numérica ou politicamente animador para o candidato do Planalto. À exceção do PC do B e do PSB, que juntos somam 30 dos 513 votos, nenhum partido deu apoio orgânico a Aldo Rebelo. Nem o PT, a quem o governo não teve a cerimônia de consultar antes de patrocinar a candidatura faz-de-conta de Arlindo Chinaglia, retirada 24 horas depois da decisão dos petistas de darem apoio ao líder da bancada.
Na disputa de fevereiro, Chinaglia e Virgílio Guimarães ficaram na frente de Greenhalgh na prévia interna do PT e também na sondagem feita aos outros partidos governistas na Câmara. Lá como cá, a vontade da maioria foi ignorada.
Essa tentativa de ganhar ao arrepio das condições objetivas acrescenta pontos à possibilidade de derrota.
Michel Temer, que no início estava disposto a concorrer apenas se fosse por consenso, reagiu ao que considera uma "traição" do presidente do Senado e não só manteve a candidatura, como conquista apoios no PMDB governista, valendo-se do argumento de que Renan Calheiros agiu contra os interesses partidários. Se desistir, ou ficar de fora do segundo turno, Temer levará seus votos para a oposição, jamais para o governo.
Tanto ele quanto o candidato do PFL, José Thomaz Nonô, disputam o apoio do baixo clero, da frente formada por PDT, PPS e PV e da chamada "aliança do mensalão", integrada por PP, PTB e PL, que apresentou candidatos e já avisa que, na hipótese do insucesso, não caminhará para o apoio a Aldo Rebelo.
Cada qual por uma razão: no PP, Ciro Nogueira e Francisco Dornelles vêem no ex-ministro um homem a serviço do Planalto; no PTB, Roberto Jefferson trabalha a distância para levar o partido à oposição; no PL, o candidato João Caldas, alagoano, faz qualquer negócio para não dar fôlego a Renan Calheiros no Estado.
Aqui, poder-se-ia lembrar os R$ 500 milhões em emendas parlamentares cuja liberação foi prometida pelo governo na sexta-feira e imaginar uma possibilidade de apoio utilitário a Aldo Rebelo. Acontece que os apetites fisiológicos no Congresso já não funcionam na base do crédito, em função do histórico de promessas não cumpridas pelo Planalto.
E, ainda que o governo lhes garantisse o pássaro na mão, a votação é secreta.
Mas, na situação presente, as traições não podem ser consideradas exceções, já que os partidos não fecharam questão a favor do candidato. Se houvesse o apoio das estruturas partidárias, bastaria ao governo administrar as dissidências contrárias.
Não havendo, a situação é sob todos os aspectos anômala e desvantajosa, pois ao Palácio do Planalto resta trabalhar para conquistar dissidências a favor, numa conta de varejo de resultado imprevisível, em que a probabilidade de vitória é a mais remota.
A escala de apostas se inverteu: em fevereiro, a zebra foi a derrota do governo; agora, o azarão tem aparato de candidato oficial. Pode ganhar?
Pode, mas vai ser uma surpresa e, portanto, uma vitória e tanto.