Entrevista:O Estado inteligente

sábado, novembro 04, 2006

Confusão no ar

É preciso melhorar a gestão dos recursos do setor aéreo; taxas pagas por usuários deveriam ser gastas todas no sistema

O CAOS nos aeroportos brasileiros provocado pela operação-padrão dos controladores de vôo arrefeceu um pouco ontem.
É possível, porém, que a redução no número de vôos típica de meio de feriado prolongado tenha contribuído mais para a melhora do que as medidas emergenciais adotadas pela Aeronáutica. O grande teste será amanhã, quando a demanda por transporte aéreo voltará a registrar picos.
Independentemente do que ocorra, é preciso reconhecer que a crise no controle de tráfego aéreo é grave e necessita de solução estrutural. Se o governo se limitar a adotar medidas paliativas, é questão de tempo até que o problema volte a manifestar-se ou, pior, ocorra um novo acidente, como o que vitimou 154 pessoas a bordo de um Boeing da Gol.
No momento, a principal questão a motivar o movimento parece ser a falta de controladores. O tempo de formação de um profissional nessa área é dilatado -cerca de três anos-, e a rotatividade no emprego, alta, por conta da perversa combinação de estresse e baixos salários.
Melhorar a remuneração, de modo a tornar a profissão mais atraente, não seria, em princípio, um problema. Trata-se de um contingente de pouco mais de 2.600 controladores, e o setor aeroviário não é exatamente pobre: passageiros pagam -e muito- por seus bilhetes e ainda arcam com taxas aeroportuárias.
Existem, entretanto, duas dificuldades. A primeira é que o sistema tem mais dinheiro no papel do que de fato. O governo vive a contingenciar as verbas do setor. Neste ano, por exemplo, foram executados apenas 46% do que estava previsto para a segurança aérea. De resto, nem sempre as empresas aéreas repassam à Infraero as taxas de embarque.
O outro problema reside no fato de que 75% dos controladores são militares -a maioria com patente de sargento. Isso impede, por exemplo, a criação de um plano de carreira específico para controladores. O máximo que se pode fazer, sem criar um efeito-cascata que afetaria o conjunto das Forças Armadas, é oferecer gratificações diferenciadas aos controladores militares.
Uma solução alternativa seria tornar todo o controle de tráfego aéreo civil, a exemplo do que ocorre na maioria dos países. Tal projeto, entretanto, demandaria um longo tempo de maturação e teria o grave efeito colateral de criar um sindicato com poder de paralisar a aviação do país.
Se uma simples operação-padrão levada a cabo por controladores constitucionalmente impedidos de cruzar seus braços, como são os militares, já provocou tantos transtornos e prejuízos, a situação seria muito pior se o movimento estivesse sob a direção de um sindicato de trabalhadores com direito de realizar paralisações.
Para tentar contornar a crise, o governo deve mesmo tentar tornar a profissão de controlador mais atrativa, de modo que mais jovens a procurem e nela se mantenham. Precisa também melhorar o gerenciamento dos recursos do setor aéreo. Taxas pagas por passageiros não são um tributo. Trata-se da remuneração por um serviço prestado que, portanto, não deveria ser contingenciada pela política fiscal. É dinheiro que precisa fluir integralmente para a segurança de vôo.

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