Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, novembro 08, 2006

Clóvis Rossi - Idéias sobre a insidiosa moléstia



Folha de S. Paulo
8/11/2006

Luiz Carlos Bresser-Pereira fez na segunda-feira, nesta Folha, uma ótima análise do caso argentino, louvando o crescimento e as políticas adotadas a partir da crise de 2001, que arrasou o país.
Pena que tenha esquecido de mencionar, em uma linha que fosse, o calote aplicado em 2001, não por decisão política, mas por absoluta falta de recursos para pagar.
É um eloqüente sinal de como o tema "dívida/serviço da dívida" é proibido no debate público brasileiro, como era proibido usar a palavra "câncer" quando comecei no jornalismo, faz 43 anos. Usava-se "insidiosa moléstia".
A pergunta básica sobre a recuperação argentina é simples, mas Bresser evitou-a totalmente: como teria sido a recuperação se não tivesse havido o calote?
Repito, pela enésima vez: não, não estou defendendo calote. Só quero uma discussão com todos os elementos postos à mesa, sob pena de o debate girar em falso.
Até o BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento), que não é exatamente uma agência a serviço da ultra-esquerda, acaba de divulgar estudo sobre a dívida, conforme o jornal britânico "Financial Times". Lista sugestões sobre como administrá-la.
Exemplo: "O pagamento dos juros poderia ser indexado aos preços das commodities, aos termos de intercâmbio ou à taxa de crescimento da economia. Quando, por exemplo, os preços das commodities caírem ou o crescimento desacelerar, o peso do serviço da dívida declinaria, na medida em que os investidores compartilhariam com o governo parte da carga relativa ao serviço da dívida", diz o texto.
Se é factível ou não, que o digam os especialistas. O que evidentemente não é factível é escamotear da discussão sobre o crescimento/ gastos do governo a questão do serviço da dívida. Pode-se chamar câncer de insidiosa moléstia, mas é melhor tratá-lo ou tratá-la.

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