Para fazer uma reforma estrutural nas polícias do Estado do Rio, só há duas saídas: ou a desfusão ou a desconstitucionalização da questão da segurança pública, deixando que cada estado possa decidir a melhor maneira de tocar seu projeto. A opinião é do ex-secretário nacional de Segurança Pública Luiz Eduardo Soares, que coordenou o Plano Nacional de Segurança Pública do governo Lula.
“O Rio precisaria de liberdade legal, uma intervenção de monta, começar tudo de novo”, afirma Luiz Eduardo, com a experiência de quem conhece a questão não apenas por estudá-la, mas pela prática, tanto no plano estadual, onde foi coordenador de segurança do Rio, quanto no federal.
Como há um engessamento constitucional que faz com que todas as tentativas acabem frustradas por obstruções legais, Luiz Eduardo lembra que no Plano Nacional de Segurança chegou-se à decisão de partir para a desconstitucionalização, sem o que “o que resta é um trabalho que se faz mais na franja, no varejo, identificando um desvio de conduta, uma corrupção policial, punindo aqui e ali, mas sem perspectiva de uma mudança nas estruturas das organizações policiais e em termos de pessoal”.
Todas as idéias de mudanças são travadas por conta do veto de lobistas das instituições, ou pelos interesses contrariados de alguns estados, que não têm condições políticas de mudar, ou mesmo não consideram adequado mudar, lembra Luiz Eduardo, dando alguns exemplos de situações concretas: a Brigada Militar do Rio Grande do Sul goza de grande prestígio na sociedade, e a Polícia Militar de Minas Gerais, segundo ele, é a melhor do país. “É evidente que os governadores desses estados não podem apoiar mudanças”, concorda Luiz Eduardo.
Ele define a situação dizendo que temos “o pior dos dois mundos”: cada polícia estadual tem sua própria maneira de organizar os dados, tem sua metodologia própria para contratar seus profissionais, os próprios critérios para organizar seu funcionamento, e não conseguem trocar informações ou buscar formas de cooperação.
Luiz Eduardo lembra que foi conseguido um consenso entre os governadores e preparada uma reunião no Palácio do Planalto, quando o presidente Lula assinaria a emenda constitucional que daria autonomia aos estados, e ao mesmo tempo o Sistema Único de Segurança Pública, que está em vigor. A questão da autonomia estadual, embora permaneça no corpo do Plano Nacional, nunca mais foi retomada, e Luiz Eduardo acha que sem ela não será possível resolver as questões das polícias em estados em que a situação está deteriorada, como o Rio.
***
A idéia de que tecnologia e inteligência é que resolverão a questão da segurança pública no país, como afirma o ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, tem sua comprovação exatamente no Rio, onde funciona um serviço pioneiro e exemplar, baseado nesse binômio: o Disque-Denúncia, criado em 1995 devido à sucessão de seqüestros ocorridos no início da década de 90. Mas, além de tecnologia e inteligência, o Disque-Denúncia trabalha com outro instrumento fundamental: a mobilização da população.
A garantia de anonimato e o pagamento de recompensas são as bases do programa, que é coordenado por uma ONG que, por não ser subordinada ao governo estadual, embora esteja instalado no prédio da Secretaria de Segurança Pública, consegue ter o mesmo diretor, Zeca Borges, e a equipe básica há dez anos, sem sofrer interferências políticas. Ao contrário de São Paulo, onde o sistema não funciona com tanto sucesso, as ligações para o 2253-1177 são pagas, e essa é considerada uma das razões de sua eficiência. Quem se dispõe a pagar para fazer uma denúncia, geralmente não está dando um trote.
Zeca Borges lembra que seria temerário mobilizar a polícia em investigações resultantes de ligações anônimas e gratuitas. A polícia de São Paulo recebe em média mais de cem mil denúncias, das quais apenas cerca de dez mil são processadas. No Rio, o volume de denúncias é muito menor, mas o grau de consistência é maior, permitindo um trabalho mais eficiente.
No caso da chacina recente na Baixada Fluminense, algumas vantagens trazidas pelo sistema para o esclarecimento de crimes foram reforçadas, segundo os organizadores do Disque-Denúncia: as informações geralmente já são de conhecimento da polícia, mas não necessariamente do secretário de Segurança e da cúpula da secretaria. O Disque-Denúncia retirou do policial de ponta a reserva de mercado das informações dos crimes. O secretário passa a ter na população mais uma fonte de informações sobre as investigações. Zeca Borges lembra que “o denunciante não está de olho apenas no bandido, mas acompanha as ações policiais e informa o comportamento da polícia”. Durante as investigações da chacina, o Disque-Denúncia recebeu diversas ligações narrando operações policiais, inclusive da Polícia Federal.
O banco de dados da Central Disque-Denúncia acumula mais de 850 mil informações sobre crimes das mais diversas categorias, e permite rastrear as atividades de suspeitos, verificando seu envolvimento em crimes anteriores. Os suspeitos envolvidos e presos por participação na chacina da Baixada Fluminense, por exemplo, já freqüentavam o banco de dados da ONG desde 2002, como matadores, receptadores, envolvidos até em crimes políticos na região.
O Disque-Denúncia vai promover brevemente uma campanha que tem tudo para mobilizar o estado: desarme o bandido. Vai instituir uma recompensa para as denúncias que levem a locais onde os criminosos escondem armamentos e munição.
Entrevista:O Estado inteligente
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