Lembrou-se muito nos últimos dias da morte de Tancredo Neves, que na última quinta-feira completou 20 anos. A data coincide com o início do mais longo período democrático do país, o que, por si só, é algo que merece registro. Mesmo o intervalo democrático que começa com o fim do Estado Novo, em 1945, e se estende até a ruptura militar de 1964 conviveu com restrições legais, como o banimento de correntes políticas -caso dos comunistas.
O ciclo democrático atual é, portanto, não apenas o mais longo mas também o mais amplo no reconhecimento e garantia de direitos políticos já vivido em nossa história republicana. É preciso levar em conta ainda a novidade que representa um regime democrático realmente massificado. Em 1960, por exemplo, quando Jânio Quadros venceu, os eleitores eram cerca de 15,5 milhões. Em 1989, quando o país voltou a escolher seu presidente pela via direta, esse número ultrapassava 82 milhões.
Qualquer balanço que se faça do país nos últimos 20 anos, por parcial que seja, terá de se defrontar com a coexistência de inegáveis avanços, sobretudo no campo político-institucional, e a permanência de sérias mazelas sociais e gargalos econômicos, os quais seguem desafiando governos e adiando o passo decisivo do país rumo ao mundo desenvolvido.
Com a morte de Tancredo e a posse do vice, José Sarney, ambos eleitos pelo Colégio Eleitoral, o país iniciou em 1985 uma trajetória que, a despeito do imprevisto na origem, não conheceu recuos. Do ponto de vista institucional, o restabelecimento pleno da democracia veio primeiro com a Constituinte de 1988 e, a seguir, com a eleição de Fernando Collor, em 1989, o primeiro presidente escolhido pelo voto em 29 anos.
O impeachment do próprio Collor, em 1992, representou o primeiro grande teste do enraizamento democrático nas instituições e costumes nacionais. A ele se seguiram o interregno do então vice, Itamar Franco (1992-1994), e a eleição de Fernando Henrique Cardoso, que governou por dois mandatos e entregou a Presidência oito anos depois, em janeiro de 2003, a Luiz Inácio Lula da Silva.
Não parece exagerado ver na condução de um líder operário oriundo de um partido de esquerda ao topo da República o ponto de chegada do caminho que começou a ser trilhado com a eleição de Tancredo. "Stricto sensu", a presidência de Lula equivale à conquista da maioridade democrática do país.
Não é outra, aliás, a avaliação que se tem quando se observa o funcionamento dos outros Poderes e, sobretudo, a maneira desimpedida com que a sociedade pode se manifestar e cobrar seus governantes. É notória a vigência hoje no país de mecanismos institucionais e de pesos e contrapesos pelos quais variados grupos de pressão reivindicam e fazem valer seus interesses.
Não obstante isso tudo, a democracia brasileira ainda parece inacabada. A incorporação social de milhões de pessoas segue sendo seu maior desafio. É dramática a percepção de que a concentração da riqueza praticamente não se alterou nos últimos 20 anos. Os números falam por si. Em 1985, os 10% mais ricos da população detinham 47,7% da renda nacional; em 2002, último dado oficial disponível, os mesmos 10% detinham 47,0%. Da mesma forma, em 1985, os 50% mais pobres absorviam 12,4% da renda do país; em 2002, esse dado pouco havia mudado: 12,9%.
Acresce que o desempenho da economia no período foi muito frustrante. A média anual de crescimento do país entre 1985 e 2004 foi de pífios 2,66%, fato agravado pelo aspecto descontínuo das taxas ano após ano.
As escolhas do país e a dinâmica da economia mundial nas últimas décadas reduziram muito as chances de que pudéssemos nos tornar uma nação socialmente integrada. É esse ainda o objetivo maior a ser perseguido por uma democracia substantiva.
FOLHA D E S PAULO EDITORIAIS
Entrevista:O Estado inteligente
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domingo, abril 24, 2005
DEMOCRACIA INACABADA
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