A condenação de Lula aos hereges que tomam crédito a juros extorsivos é similar à de um filósofo-economista, defensor contumaz da política econômica, que, recentemente, concedeu longa entrevista nessa linha. Dá-se uma conotação moral ao ato de consumir. E a condenação é justamente sobre quem, não dispondo de renda, tem que se submeter aos juros escorchantes como única forma de acesso aos bens de consumo.
Alguns anos atrás, a babá de minha filha quis levá-la à sua casa, na periferia. Foram de ônibus. Fomos à tarde para buscá-la. Entramos em uma casa construída por eles próprios, em cima de uma outra construção. Havia uma sala, um quarto e um banheiro. A sala estava irrepreensível, com móveis baratos, novos e reluzentes, uma TV simples e uma geladeira. Tudo adquirido em uma dessas lojas populares que vendem a perder de vista.
A moça conseguiu comprar porque, tendo carteira de trabalho e renda comprovada, pela primeira vez teve acesso a crédito. O que se via ali não era a figura pecaminosa do esbanjador, mas a alegria genuína de quem, tendo acesso a bens de consumo, experimentava o gosto da cidadania. Mesmo pagando juros extorsivos.
Recebeu-nos dignamente, serviu um refrigerante e, depois, um cafezinho. E percebemos o orgulho que ela tinha em praticar algo inédito, até então: o ato de receber.
Quem não passou por privações pode se dar ao luxo de uma vida asceta. O filósofo é ele e seus livros. Mas ai de quem ousar recriminá-lo por gastos excessivos com livros. Aí não é consumo conspícuo, é alimento para o espírito.
Do mesmo modo, é extraordinariamente cômodo culpar a vítima pelos abusos que sofre. Papel de presidente da República é criar as condições para que os consumidores possam ter acesso aos bens de consumo sem passar pela garfada das taxas de juros do financiamento. A isso se chama praticar a cidadania.
Nesse país do nonsense, cultua-se a economia de mercado, mas condena-se toda forma de consumo, justifica-se a usura, mas condena-se a vítima. Moralismo por moralismo, inverteu-se até a ética secular da igreja. A usura tornou-se virtude; a incapacidade de se defender da usura tornou-se vício.
Só Ratzinger e Severino para colocar ordem nessa bagunça.
Andrade Gutierrez
Sérgio Andrade e Otávio Azevedo, da Andrade Gutierrez, entram em contato para afirmar que, pelo menos até a entrada de Daniel Dantas na Telemar, não houve nenhum acordo entre os dois grupos. Nem o acordo prévio que teria permitido ao Opportunity participar, posteriormente, do capital da Telemar.
Antes da privatização das teles, disputaram várias privatizações -entre as quais a do porto de Santos e a do Metrô do Rio-, e o Opportunity venceu todas, pagando ágios expressivos. Os recursos eram dos fundos de pensão.
Depois que o Opportunity entrou na Telemar, tornou-se sócio da Andrade Gutierrez em vários empreendimentos, como o iG e a Sanepar. Mas essa aproximação só teria ocorrido após a privatização das teles, segundo a versão de ambos.
FOLHA DE S.PAULO
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, abril 27, 2005
LUÍS NASSIF:Consumo e cidadania- ainda o "levantar o traseiro da poltrona.."
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