Entrevista:O Estado inteligente
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sábado, abril 30, 2005
AUGUSTO NUNES :Entrevista antecipa tática do candidato
Sejamos clementes: pela primeira vez em 28 meses, o presidente Lula da Silva aceitou expor-se publicamente a questões formuladas por um grupo de jornalistas. Isso é bom. E desta vez não houve, registre-se, a detestável triagem de nomes e temas sempre reivindicada por inquilinos do Palácio do Planalto.
Livremente indicados pelos órgãos de comunicação, 14 profissionais escolhidos por sorteio fizeram perguntas com igual liberdade: não havia assunto proibido. Pouco mais de uma hora depois, quando saiu do auditório que servira de cenário para a estréia longamente esperada, Lula reconhecera na prática que tais encontros figuram entre os deveres do presidente. O país quer saber? Cumpre ao chefe de governo explicar (e explicar-se).
Nesta sexta-feira, Lula rendeu-se à evidência: assim são as coisas nas democracias genuínas. Formalmente, prometeu conceder com regularidade entrevistas do gênero. Tomara que as próximas sejam coletivas de verdade. A de ontem ainda não foi. E não foi porque a maioria dos Altíssimos Companheiros entendeu que Lula deveria jogar na defesa. Para evitar a infiltração de adversários na pequena área do time do Planalto, subtraiu-se aos jornalistas o direito à réplica, mesmo se considerassem a resposta inconsistente, inconvincente, inexata, equivocada ou fantasiosa.
A supressão desse direito democrático matou no nascedouro a possibilidade de confrontos inevitáveis nas coletivas que efetivamente buscam iluminar zonas de sombra em qualquer setor do governo, rastrear a mente do entrevistado, pinçar a verdade na areia movediça forjada por declarações contraditórias. Banida a réplica, a entrevista pareceu ainda mais engessada que os penosos debates entre candidatos. Lula disse o que quis. Não pôde ser contestado.
Perguntou-se por que as instituições financeiras controladas pelo governo, como o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal, não determinam reduções sensíveis nos juros aplicados aos cheques especiais. (Esse bom exemplo induziria multidões de comodistas patológicos a levantarem o traseiro e mudarem de banco com fundados motivos.) Lula desconversou sobre a essência e passou a discorrer sobre os programas de crédito que o governo vem abrindo.
Uma jornalista observou, em meio à pergunta, que o Planalto sofrera uma relevante derrota com a ascensão de Severino Cavalcanti à presidência da Câmara. "Acho Severino um aliado", disse Lula ao começar a resposta. "Acha mesmo?", sorriu a entrevistadora. Resumida em duas palavras, foi a única réplica do encontro. Os jornalistas respeitaram o silêncio obsequioso que lhes fora imposto mesmo quando Lula escorregou em contradições. Não foram muitas. Mas exigiam a contestação que não houve.
Convidado a mencionar três erros cometidos pelo governo, Lula abriu a lista com um episódio que, minutos antes, procurara desdenhar: a vitória de Severino. Como assim?, indagaram dezenas de fisionomias vincadas pelo desconcerto. O deputado é companheiro ou adversário? Rostos dispensam palavras para expressar-se. Mas não podem ser ouvidos. É preciso vê-los. Não foram capturados por nenhuma das imagens geradas pela Radiobrás.
Quem conhece de perto esse talentoso comunicador percebeu que, na ligeiríssima introdução, Lula estava tenso. Segundos depois, esbanjava a segurança de quem fora submetido na véspera a vigorosos interrogatórios dirigidos por Duda Mendonça, com assessores no papel de jornalistas. Aprovado na fase dos preparativos, preparou-se para o que viesse. O tom e o conteúdo das respostas lembravam palanques.
A primeira coletiva do presidente acabou transformada no primeiro discurso do candidato à reeleição.
JB
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