Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 22, 2005

Gesner Oliveira:UMA BOA E UMA MÁ NOTÍCIA

Os últimos dias trouxeram uma boa e uma má notícia em termos de política econômica. Primeiro a boa notícia. O governo fixou limites para a carga tributária e gastos no projeto de lei de diretrizes orçamentárias (LDO) para 2006. A má notícia foi a oitava elevação da taxa de juros pelo Comitê de Política Monetária (Copom).

A decisão de limitar carga tributária e despesa é uma boa notícia por várias razões. Para se manter solvente o setor público terá de garantir as contas minimamente equilibradas. Isso exige assegurar superávits primários, ou seja, receitas superiores às despesas líquidas de gastos com juros.

Cortar gastos é sempre doloroso. Isso vale para a economia doméstica, a empresa ou o orçamento federal. A diferença é que as famílias e empresas não têm opção. Diante de dificuldades financeiras, são obrigadas, mais cedo ou mais tarde, a cortar despesas. Já o setor público pode recorrer ao financiamento inflacionário, endividamento ou impostos.

A superinflação foi domada com o Plano Real. Aumentou igualmente a consciência de que o nível de endividamento como proporção do PIB deve ser mantido estável sob pena de insolvência. Infelizmente, entre conter despesas ou aumentar a arrecadação, prevaleceu o caminho mais fácil: a carga tributária subiu mais de dez pontos no espaço de uma década. Seu nível atual de cerca de 37% estimula a informalidade e inibe o crescimento.

Mais grave ainda, o Governo Lula emitiu sinais de que elevaria os gastos em ritmo ainda maior, fazendo com que a sociedade projetasse novas elevações de impostos. E estas últimas continuariam, não fosse a reação de segmentos organizados da sociedade que evitaram a derrama sobre os prestadores de serviços através da MP 232.

Assim, a fixação na LDO de limites de 16% do PIB para a arrecadação de tributos federais e de 17% para as despesas correntes representa sinal positivo.

Seria ingênuo, contudo, supor que os problemas terminaram. O estabelecimento de limites é um primeiro passo. No entanto, é preciso garantir seu cumprimento na lei e execução orçamentárias. Mais importante, será necessário implementar reduções de gastos de forma sábia, introduzindo critérios de cortes de despesas de acordo com prioridades sociais e de estímulo ao investimento. Isso contrasta com os contingenciamentos lineares e extremamente ineficientes que vêm sendo tradicionalmente aplicados. Além disso, serão necessárias novas e sucessivas mudanças na legislação, estendendo os limites de gasto aos governos locais, entre outras providências. Mas pelo menos foi dado um sinal positivo no curto prazo, além de representar mudança institucional com efeitos potenciais benéficos no médio prazo.

Por sua vez, a decisão do Copom de aumentar a taxa SELIC de 19,25% para 19,50% é uma má notícia. Embora tenha havido uma aceleração dos índices de inflação nas últimas semanas, pareceria mais cauteloso aguardar os efeitos defasados das altas passadas. Na linha, aliás, daquilo que declararam há poucos dias tanto o ministro da Fazenda, Antonio Palocci, quanto o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles.

Com a última elevação, a taxa real de juros brasileira atingiu patamar superior a 13%, cerca de seis pontos superior ao da Turquia (7,3%), oito pontos maior que o da África do Sul (5,2%) e onze pontos maior que o da China (2,4%). Trata-se de nível incompatível com a elevação da taxa de investimento.

Quando se imagina uma retomada do crescimento sustentado, os níveis de juros são significativamente menores. No cenário de longo prazo para 2007-15, contido no Mapa Estratégico da Indústria que será lançado pela Confederação Nacional da Indústria (CNI) na próxima terça-feira, trabalha-se com uma média de juro real de 6% até 2010 e de 4% até 2015.

Para colocar na linguagem quase tecnocrática de recente texto de discussão do campo majoritário do Partido dos Trabalhadores, "mesmo que não haja receitas prontas nesse terreno, deve-se sempre buscar um equilíbrio adequado entre os instrumentos fiscal e monetário, de modo que todo o potencial de crescimento da economia brasileira se realize." Não é preciso muito esforço para verificar que a atual combinação de políticas fiscal e monetária está longe da ideal.

FOLHA DE S.PAULO

Nenhum comentário:

Arquivo do blog