Periodicamente se encontram bodes expiatórios para "explicar" as altas taxas de juros no país. O último é a prática das redes varejistas de embutir os juros no preço à vista e depois anunciar a venda em prestações sem juros. Para muitos, esse seria o ponto central que explicaria os abusos das taxas de juros e dos direitos dos consumidores.
Há desconhecimento de princípios financeiros nessa história.
Grosso modo, na hora de vender o produto, o comerciante forma o preço incluindo custo de aquisição do bem, seus próprios custos operacionais, impostos e a margem de lucro. A margem pode ser de 10%, 20% ou 100%, pouco importa. Não existe nem tabelamento de preço nem de margem. O que define a margem é o mercado. Em setores mais competitivos, a margem é menor; em setores mais oligopolizados, a margem é maior.
Suponha que, para determinado produto, o preço de aquisição seja 50 e os custos operacionais do comerciante sejam 30. O custo total do produto é 80. Suponha que o comerciante coloque uma margem de 50%, o preço salte para 120 e ele ofereça ao distinto público dez prestações de 12. O que é margem, o que são juros? É impossível determinar e não tem a menor relevância na discussão sobre o custo do dinheiro no país.
Se o financiamento for feito com capital próprio do comerciante, a parcela atribuível aos juros corresponderá ao chamado custo de oportunidade da aplicação -ou seja, quanto os recursos renderiam se aplicados em um investimento alternativo. Se captar o recurso no mercado, a taxa de juros corresponderá ao custo desse dinheiro tomado.
Suponha que a taxa de juros embutida seja de 5% ao mês. A conta fica assim:
1) custo do produto: 50;
2) juros cobrados: 27;
3) margem do comerciante: 13.
Suponha que se considere uma taxa de juros de 3% ao mês:
1) custo do produto: 80;
2) juros cobrados: 17,7;
3) margem do comerciante: 22,3.
Sem cobrança de juros:
1) custo do produto: 80;
2) juros cobrados: 0
3) margem do comerciante: 40.
É um mero jogo de número, uma conta de chegada que não leva a nenhuma conclusão.
Em qualquer circunstância, se o comerciante chama o preço a prazo de preço à vista sem juro ou não, essa discussão sobre juros embutidos é uma boutade, que só tinha significado nos tempos em que os preços e as margens eram controlados.
A maneira de analisar o custo do dinheiro é quando a mercadoria negociada é dinheiro. Quando se toma um crédito direto ao consumidor, paga-se uma taxa de cheque especial, tomam-se recursos para capital de giro. Aí se está medindo efetivamente o custo do dinheiro, comparando preço à vista com preço a prazo.
Por qualquer critério que se observe, por qualquer taxa que se analise, é evidente que as taxas são extraordinariamente elevadas.
Problema regulatório, excesso de tributos sobre a intermediação, cartelização de mercado, taxa Selic excessiva, qualquer que seja o motivo é um problema de política econômica.
FOLHA DE S.PAULO
Entrevista:O Estado inteligente
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quinta-feira, abril 28, 2005
LUÍS NASSIF :As prestações sem juros
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