No artigo de terça-feira, confessei a suspeita de que a campanha do desarmamento, com plebiscito marcado para outubro, estava perdendo alento. A reação ao artigo, mesmo sem ter o rigor de uma pesquisa de opinião, sugere que nossa pólvora está mesmo molhada.
Não faltam baldes d'água nos e-mails recebidos. São aparentes algumas dúvidas e restrições sinceras — assim como equívocos aparentemente honestos. Vamos a uma amostra. Mas antes é irresistível a tentação de abrir os trabalhos com a mais espetacular de todas as denúncias. Literalmente: "Prezado amigo: O desarmamento é uma prática dos comunas antes de tomarem o poder pelas armas. Quem viver, verá. O preço da Liberdade é a eterna vigilância." Não identifico o signatário dado o risco de terem feito brincadeira de mau gosto com o nome de algum inocente cidadão.
Vamos a quem, aparentemente, falou sério:
1. "...não acredito mais nessa história de desarmamento no Brasil de hoje. Minha opinião é que falta vontade e competência do governo para fiscalizar o comércio de armas, reprimir o tráfico bélico e garantir o acesso às armas legalizadas somente aos cidadãos preparados para tal... Detesto esses fabricantes de armas e seus lucros e lobbies nojentos, mas as armas nunca deixarão de existir enquanto houver homens dispostos a matar para alcançar seus objetivos. O Estado organizado deveria ser a resposta da civilização aos bárbaros. Mas, onde está o Estado? Os bárbaros, esses, estão à nossa frente."
2. "Discordo do seu ponto de vista que a Câmara está cheia de machistas. Ela representa, mal ou bem, as expectativas da população, e com certeza eles já consultaram as bases e verificaram que a quantidade de pessoas que quer ficar indefesa frente ao banditismo crescente, diminuiu, graças às falácias deste governo que prometeu muito na área de segurança no ano passado e resultou num parto de montanha. Na Suíça, talvez seu comentário seja válido."
"O 'x' da questão está exatamente na noção, em nenhum momento negada, de que a Campanha do Desarmamento levaria a uma queda geral nos índices de criminalidade. Esta foi a percepção da população e esta é a visão de muitas das ONGs que participam da campanha. A prova está na outra campanha Eu Sou Da Paz e nas diversas passeatas e manifestações pedindo paz. Como diz o Jabor, estão pedindo paz pra quem?! Pra mim é que não é!!! Se uns acham que colocar uma camiseta e soltar balões brancos vai afetar o pensamento da bandidagem, a recente chacina da Baixada deixou claro que não..."
Procurei selecionar reações que não me pareceram originárias do lobby das armas. Posso ter pecado por ingenuidade; não será a primeira vez. Seja como for, aí está o disponível retrato do desencanto com o desarmamento: é menos amor às armas do que desalento com a solução proposta.
Ainda com alento, lembremos aos de boa-fé que continua óbvio o que era evidente no começo da campanha: com armas de fogo por perto, brigas de amantes, parentes ou amigos sempre terão mais chances de terminar em tiros — inclusive nas crises românticas entre adolescentes. Acontece todos os dias. Às vezes, morrem um ou dois, protagonistas ou testemunhas.
Também é notícia freqüente a história do neurastênico que acaba com a festa no playground de seu prédio com rajadas de tiros. Não raro, atingindo crianças. Às vezes, morrem uma ou duas.
Continuam igualmente comuns as histórias de meninos que mostram aos amigos, às vezes em casa, outras no banheiro do colégio, como funciona o revólver do papai. Às vezes, morrem um ou dois.
Essas são histórias tristes comuns nos jornais.
Se você ainda exige outros tipos de argumentos, responda por favor: quantos episódios conhece em que um cidadão brasileiro, valente mas amador nesse tipo de ação, empunhou seu .38 e botou para correr os bandidos que invadiram sua casa ou o cercaram numa rua ou estacionamento e ameaçaram sua família e seu patrimônio? Três, duas, uma? Ou, seja franco, nenhuma?
Compreende-se, com a necessária dose de piedade, a teimosia dos que adoram uma teoria conspiratória. Mas é duro entender quem sai da briga por desalento ou falta de fôlego ético.
Repito que estamos arriscados a perder a boa luta. Será triste uma derrota para os bobalhões que acreditam no direito da força. Pior ainda se o vencedor da briga vier a ser o nosso próprio desânimo.
O GLOBO
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
sexta-feira, abril 29, 2005
Luiz Garcia :Tiros sem misericórdia?
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
abril
(386)
- VEJA Entrevista: Condoleezza Rice
- Diogo Mainardi:Vamos soltar os bandidos
- Tales Alvarenga:Espelho, espelho meu
- André Petry:Os corruptos de fé?
- Roberto Pompeu de Toledo:A jóia da coroa
- Baby, want you please come here - Shirley Horn, vo...
- O mapa da indústria GESNER OLIVEIRA-
- JANIO DE FREITAS:A fala do trono
- FERNANDO RODRIGUES:220 vezes "eu"
- CLÓVIS ROSSI :Distante e morno
- PRIMEIRA COLETIVA
- Dora Kramer:Lula reincorpora o candidato
- AUGUSTO NUNES :Entrevista antecipa tática do candi...
- Merval Pereira:Mãos de tesoura
- Miriam Leitão:Quase monólogo
- O dia em que o jornalismo político morreu
- Eles, que deram um pé no traseiro da teoria política
- Lucia Hippolito: O desejo de controlar as informações
- Goin way blues - McCoy Tyner, piano
- O novo ataque ao Copom - LUIZ CARLOS MENDONÇA DE B...
- JANIO DE FREITAS :Mensageira da crise
- FHC concedeu coletiva formal ao menos oito vezes
- CLÓVIS ROSSI :Todos são frágeis
- ELIANE CANTANHÊDE :Pelo mundo afora
- NELSON MOTTA:Coisas da política ou burrice mesmo?
- Dora Kramer: PFL quer espaço para Cesar
- Miriam Leitão:Dificuldade à vista
- Luiz Garcia :Tiros sem misericórdia?
- Merval Pereira:Barrando o terror
- Villas-Bôas Corrêa: A conversão de Severino
- Lucia Hippolito: A hora das explicações
- Let’s call this - Bruce Barth, piano
- CÂMBIO VALORIZADO
- CLÓVIS ROSSI :Quem manda na economia?
- ELIANE CANTANHÊDE :"Milhões desse tipo"
- DEMÉTRIO MAGNOLI:Preto no branco
- LUÍS NASSIF :As prestações sem juros
- Dora Kramer:À sombra dos bumerangues
- Miriam Leitão:Erro de identidade
- Merval Pereira:Sentimentos ambíguos
- Guilherme Fiuza:A culpa é do traseiro
- Georgia on my mind - Dave Brubeck, piano.
- Lucia Hippolito: Ele não sabe o que diz
- PALPITE INFELIZ
- TUDO POR UMA VAGA
- CLÓVIS ROSSI:Presidente também é 'comodista'
- FERNANDO RODRIGUES:Os traseiros de cada um
- "Liderança não se proclama", afirma FHC
- O dogma de são Copom- PAULO RABELLO DE CASTRO
- LUÍS NASSIF:Consumo e cidadania- ainda o "levantar...
- Dora Kramer:Borbulhas internacionais
- Zuenir Ventura:Minha pátria, minha língua
- ELIO GASPARI:Furlan e Bill Gates x Zé Dirceu
- Miriam Leitão: Nada trivial
- Merval Pereira:Palavras ao léu
- REFLEXOS DO BESTEIROL
- Villas-Bôas Corrêa: A greve das nádegas
- AUGUSTO NUNES:O Aerolula pousa no mundo da Lua
- VEJA:Jorge Gerdau Johannpeter
- XICO GRAZIANO:Paulada no agricultor
- Por que ele não levanta o traseiro da cadeira e fa...
- Lucia Hippolito: Eterno enquanto dure
- Luiz Garcia:Sandices em pleno vôo
- Arnaldo Jabor:Festival de Besteira que Assola o País
- Miriam Leitão:Economia esfria
- Merval Pereira:Liberou geral
- GUERRA PETISTA
- Clóvis Rossi:Apenas band-aid
- ELIANE CANTANHÊDE:De Brasília para o mundo
- JANIO DE FREITAS:Os co-irmãos
- Dora Kramer: Sai reforma, entra ‘mudança pontual’
- AUGUSTO NUNES O pêndulo que oscila sobre nós
- Resgate em Quito (filme de segunda)
- Round midnight - Emil Virklicky, piano; Juraf Bart...
- Reforma política, já- Lucia Hippolito
- INCERTEZA NOS EUA
- VINICIUS TORRES FREIRE :Bento, Bush e blogs
- FERNANDO RODRIGUES: Revisão constitucional
- Os trabalhos e os dias- MARCO ANTONIO VILLA
- Zelão / O Morro Não Tem Vez - Cláudia Telles
- Fora de propósito
- JOÃO UBALDO RIBEIRO:Viva o povo brasileiro
- Merval Pereira: O desafio das metrópoles
- Miriam Leitão:Música e trégua
- DEMOCRACIA INACABADA
- GOLPE E ASILO POLÍTICO
- CLÓVIS ROSSI:A corrida pela esperança
- ELIANE CANTANHÊDE:Asilo já!
- ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES: Reforma tributária e ga...
- ELIO GASPARI:A boca-livre deve ir para Quito
- JANIO DE FREITAS:Sonho de potência
- LUÍS NASSIF Racismo esportivo
- Quando as cidades dão certo - JOSÉ ALEXANDRE SCHEI...
- AUGUSTO NUNES: O encontro que Lula evita há dois anos
- O depoimento de uma brasileira no Equador
- Sabiá - Elis Regina]
- Diogo Mainardi:A revolução geriátrica
- Tales Alvarenga:Assume mas não leva
- André Petry: Isso é que é racismo
- Roberto Pompeu de Toledo:Fato extraordinário:um pa...
-
▼
abril
(386)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA
Nenhum comentário:
Postar um comentário