Entrevista:O Estado inteligente

sábado, abril 30, 2005

O mapa da indústria GESNER OLIVEIRA-



O brasil está mudando. O verbo planejar começou a ser conjugado. O "Mapa Estratégico da Indústria", lançado pela CNI (Confederação Nacional da Indústria) na última terça-feira em Brasília, é um exemplo. Ilustra uma tentativa de se desvencilhar das emergências do curtíssimo prazo e dedicar tempo para pensar o futuro.
Não surpreende que o documento da CNI tenha recebido pouco destaque relativamente à sua importância. Foi uma semana de mudanças na equipe econômica, mais propostas esdrúxulas do deputado Severino e até mesmo o raro evento de uma entrevista coletiva do presidente Lula. Prevaleceu o curto prazo.
Mas o documento da CNI é um primeiro passo para a aplicação de gestão e planejamento estratégico no debate sobre os rumos da indústria e do país. O exercício da CNI usa o chamado "Balanced Scorecard", na denominação em inglês, livremente traduzido por "gestão estratégica" ou "mapa estratégico". Tal método, desenvolvido por Robert Kaplan da Universidade Harvard e aplicado em várias empresas, consiste na tradução de objetivos estratégicos em um conjunto bem definido de programas de ação. Esses últimos estão sujeitos a acompanhamento sistemático mediante um painel de indicadores.
A utilização de indicadores objetivos é essencial. Alguns defendem que Zico foi melhor do que Romário. É uma questão empírica. Não é possível respondê-la sem contar com indicadores pertinentes e saber, por exemplo, quais os percentuais de finalização com sucesso, passes certos, desarmes, dribles, entre tantas outras estatísticas que ganharam espaço nas seções de esportes. Não se pode prescindir de um painel de indicadores relevantes para avaliar o desempenho de um jogador, de uma equipe ou de um país.
As metas fixadas pelo "Mapa Estratégico da CNI" são ambiciosas. Estabeleceu-se uma taxa média de crescimento de 5,5% até 2010 e de 7% até 2015. Isso equivale a mais que o dobro da taxa observada nos últimos dez anos (2,43% anuais). Se o Brasil tivesse crescido a 5,5% na última década, o PIB per capita seria de US$ 5.125, mais de 53% de nível atual (US$ 3.330). A última vez em que o PIB cresceu mais de 5,5% foi em 1994, ano de lançamento do Plano Real (5,85%). A última vez em que o PIB cresceu mais que 7% foi em 1986 (7,51%), ano do Plano Cruzado.
Embora singulares, as experiências da China e da Índia são úteis para aguçar a vontade nacional de resgatar o crescimento rápido e sustentado. Fenômeno que ocorreu no Brasil durante a maior parte do século 20, mas foi interrompido nas duas últimas décadas.
Para retomar a trajetória de crescimento, será preciso concentrar esforços em uma mesma direção e em ritmo mais acelerado. A impressão que se tem é que o Brasil está promovendo mudanças na direção certa, mas a um ritmo excessivamente lento. Tome-se a Lei de Falências, aprovada neste ano. Tramitou no Congresso por mais de dez anos, em um período marcado por forte endividamento e reestruturação industrial, durante o qual instrumentos modernos de recuperação de empresas teria sido essencial para preservar os fatores produtivos no mercado.
Não adianta chorar sobre leite derramado. Mas não se pode se dar ao luxo de postergar aquilo que no "Mapa da CNI" é tido como base do desenvolvimento como a logística, a oferta de energia, a infra-estrutura de telecomunicações e o saneamento básico. Como se sabe, a situação é trágica nessa matéria. Basta tomar um dos indicadores selecionados pela CNI: o estado de conservação das rodovias, que, segundo o próprio presidente Lula admitiu na entrevista de ontem, constitui uma fragilidade de seu governo.
A conquista da estabilidade de preços nos anos 90 dá condições mínimas para discutir médio prazo. A maior exposição da economia brasileira ao mundo crescentemente competitivo e marcado por um ritmo alucinante de inovação tecnológica obriga ampliar horizonte de planejamento.
Não há nada de errado na ambição das metas, antes pelo contrário. Mas, para alcançá-las, será fundamental garantir monitoramento adequado dos programas. Nesse sentido, os próprios autores do "Mapa Estratégico" admitem ser necessário detalhar mais alguns dos objetivos e programas propostos. Contudo não há dúvida de que o setor privado tenha dado um passo importante. Está na hora de o setor público fazer o mesmo.
FOLHA DE S.PAULO

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