A campanha do Brasil por uma vaga permanente no Conselho de Segurança (CS) das Nações Unidas poderá não lograr seus objetivos, mas já contribuiu para abalar a boa relação diplomática com a Argentina. O governo platino está agora se queixando do protagonismo brasileiro durante a crise no Equador. Reclama de que o Itamaraty nem sequer esperou pela reação da OEA (Organização dos Estados Americanos) e que tenta se valer das desventuras equatorianas para reforçar suas pretensões na ONU.
Já há tempos a Argentina vinha dando sinais de insatisfação com a atuação diplomática brasileira. Em dezembro, o presidente Néstor Kirchner deixou de comparecer ao lançamento, no Peru, da Comunidade Sul-Americana de Nações, uma iniciativa do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para conglobar 12 países da região. Autoridades argentinas imitaram o exemplo do chefe em outras ocasiões. Mais recentemente, a Argentina não apoiou o candidato brasileiro à diretoria-geral da Organização Mundial do Comércio.
Seria um erro atribuir à disposição do Brasil para obter uma cadeira permanente no CS todos os atritos e diferenças com a Argentina. É certo que outros fatores interferem, entre eles as disputas comerciais no âmbito do Mercosul e a falta de apoio do governo brasileiro a Kirchner na difícil renegociação da dívida argentina com credores internacionais.
No caso específico da Comunidade Sul-Americana de Nações, pesou ainda a rivalidade entre o presidente argentino e seu antecessor, Eduardo Duhalde, um dos patronos da iniciativa. Ainda assim, são os próprios argentinos que afirmam para quem quiser ouvir que se opõem à entrada do Brasil no CS, alegando que esse fato alteraria para pior o equilíbrio de forças na região.
É verdade que o Brasil não deve submeter aos humores argentinos a decisão de se candidatar a membro do Conselho. Se o esforço brasileiro for coroado de êxito, o país, ao ser agraciado com o assento permanente, ganharia projeção internacional, mesmo que não contasse com o poder de veto dos cinco atuais ocupantes dessas vagas.
A questão é saber se o Itamaraty não está, por assim dizer, vendendo a alma ao diabo. Em sua campanha, além de azedar a relação com a Argentina, o Brasil concedeu aos chineses vantagens comerciais sem exigir contrapartidas e ajudou a bloquear, na Comissão de Direitos Humanos, resoluções contra a China e a Rússia. Também se absteve na votação para exigir que os responsáveis pelo genocídio de Darfur (Sudão) fossem julgados pelo Tribunal Penal Internacional. Ironicamente, é a cortejada China que agora se dispõe a lançar mão de todos os recursos para impedir mudanças no CS -se isso for necessário para evitar o ingresso do Japão, seu histórico rival.
FOLHA DE S.PAULO EDITORIAIS
Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, abril 27, 2005
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