Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, abril 21, 2005

Paulo Nogueira Batista Jr.:Insistindo no êrro



Quando Bush foi reeleito, o Macaco Simão disparou: ''Errar é humano; insistir no erro é norte-americano''. A boutade se aplica também à diretoria do Banco Central, que é dominada, como se sabe, por financistas e economistas treinados em bancos ou universidades norte-americanos. Nesta semana, o BC resolveu aumentar a taxa de juro outra vez, surpreendendo a opinião pública, os empresários, os sindicalistas e até o mercado financeiro.

Uma leitora, indignada, reclamou: ''Vocês, economistas, ficam discutindo se cabe ou não dar autonomia ao Banco Central, quando ele já é autônomo e faz o que bem entende''. Realmente, nas circunstâncias brasileiras, a discussão sobre autonomia é bizantina. Noticia-se que o presidente da República teria ficado ''surpreso'' e ''decepcionado'' com mais esse aumento dos juros. Não é a primeira vez. Em relação ao poderoso BC, o presidente Lula é uma espécie de rainha da Inglaterra.

Imagino que a nossa rainha da Inglaterra esteja subindo pelas paredes. Afinal, diferentemente da original, ela não possui cargo vitalício e tem que se reeleger no ano que vem. Fica a dúvida: será que o BC concorda com as aspirações presidenciais?

As taxas de juro no Brasil são uma aberração, um escândalo inacreditável. Deflacionada pela inflação esperada, a taxa brasileira de curto prazo supera os 13%. Nenhum país desenvolvido ou ''emergente'' pratica juros semelhantes em termos reais. A média é de apenas 0,6% nos países desenvolvidos e de 2% nos ''emergentes'', segundo levantamento realizado pela consultoria GRC Visão.

O dogmatismo e a inflexibilidade da diretoria do BC ultrapassaram todos os limites, inclusive os da lógica e da coerência. O BC vive repetindo, em suas avaliações periódicas, que existe uma defasagem considerável entre as variações da taxa de juro e seus efeitos sobre a inflação. Pode-se inferir que a política de juros de hoje afeta sobretudo a inflação de 2006. Ora, no seu último relatório trimestral de inflação, divulgado há poucas semanas, a autoridade monetária informou que, pelas suas projeções, uma taxa de juro de 19,25% seria consistente com uma inflação abaixo do centro da meta no ano calendário de 2006 - um motivo para, em princípio, ter reduzido e não aumentado para 19,5% a taxa de juro nesta semana.

Os custos dessa política de juros são extremamente elevados - repito pela enésima vez (se eles insistem nos erros, só me resta insistir na crítica).

Os juros exorbitantes provocam basicamente quatro problemas interligados.

Primeiro: a alta dos juros tende a dificultar a sustentação da recuperação em curso desde fins de 2003. Estima-se que, em 2005, o crescimento econômico diminua para a faixa de 3,5% a 4% - resultado medíocre para um país que não cresce de forma sustentada há 25 anos e ainda sofre de taxas elevadas de desemprego e subemprego.

Segundo: o enorme diferencial de juros entre o Brasil e o resto do mundo atrai capital especulativo e provoca valorização da moeda nacional. Essa valorização é duplamente inconveniente: prejudica a produção, o investimento e o emprego nos setores que exportam e naqueles que concorrem com importações no mercado doméstico, reforçando a desaceleração da economia e afetando negativamente as contas externas do país.

Terceiro: os juros elevados desestabilizam as finanças do governo, uma vez que a maior parte da dívida pública é interna, de curto prazo ou diretamente referenciada à taxa de juro fixada pelo BC. O radicalismo da autoridade monetária constitui assim uma fonte permanente de desequilíbrio das contas públicas.

Quarto: a política de juros é um fator poderoso de concentração da renda. Beneficia apenas aquela minoria que é proprietária de riqueza financeira e credora da dívida pública - os bancos, as demais instituições financeiras, as pessoas físicas de elevado patrimônio etc. Prejudica, por outro lado, aqueles que dependem do trabalho e vêem as suas oportunidades se estreitarem com a retração da economia e do mercado de trabalho.

Em resumo, uma beleza. Enquanto isso, o ministro Palocci, que habita certamente outro planeta, declarou nesta semana que nós, brasileiros, ''precisamos nos acostumar com o sucesso''...
JB

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