Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, abril 22, 2005

LUIZ CARLOS MENDONÇA DE BARROS:O que está acontecendo na economia...



O ano de 2005 tem se revelado um período de alta tensão para o analista que acompanha o vaivém da economia mundial. Encontra ele, a cada instante, lições aplicadas da teoria econômica de altíssima complexidade, e é preciso um esforço muito grande para não se perder nas armadilhas que vão sendo encontradas pelo caminho. Quem não consegue entender o processo de mudanças estruturais que está em curso no mercado global de hoje e abstrai esses efeitos sobre a análise econômica tradicional está tendo enormes dificuldades para manter antigas reputações.
Cito aqui dois exemplos recentes de erros de análise, cometidos por economistas de alta referência no meio financeiro, em razão dessas mudanças. Um, nos EUA, aconselhou seus clientes no início de 2004 a vender contratos futuros de petróleo quando o preço desse produto chegou a US$ 38 o barril. Outro, aqui no Brasil, disse a seus clientes, quando o real rompeu a barreira dos R$ 3, que o saldo de nossa balança comercial chegaria a zero em fins de 2004 por conta dessa valorização.
Estaria a teoria econômica tradicional ultrapassada, e o aparecimento de uma nova metodologia para explicar o comportamento dos mercados seria a única saída para que nós, economistas, possamos resgatar nossa capacidade de prever, com um mínimo de eficiência, o comportamento das variáveis econômicas?
Não me parece o caso. O conhecimento que temos hoje, quando devidamente entendido em sua dimensão de um processo histórico, é suficiente para acompanhar o que acontece no mundo. Mas é preciso que o analista, antes de utilizar seus computadores e modelos analíticos baseados no passado, gaste um pouco de energia na busca do entendimento do que se chama de fenômeno econômico. Tomemos o exemplo da balança comercial americana e sua resposta negativa à desvalorização de mais de 30% do dólar nos últimos anos.
Esse aparente enigma pode ser explicado quando se buscam nos ensinamentos do economista austríaco Schumpeter sobre a "destruição criadora" inerente do capitalismo as sementes de seu entendimento. Essa força que ocorre nos Estados Unidos do presidente Bush é que está criando a aparente divergência entre dólar mais fraco e importações crescentes. Tomemos o exemplo recente da General Motors e da Ford, dois nomes emblemáticos do capitalismo americano do século passado e hoje à beira de uma falência que parece inevitável.
Essas duas empresas estão pagando o preço de relações trabalhistas que seguem um modelo diferente das usadas por competidoras japonesas, sul-coreanas e, agora, chinesas. Além de salários mais baixos, são os custos de uma proteção social construída quando os sindicatos tinham força para impô-las que fazem com que as empresas não tenham condições de competição. Isso já aconteceu nos EUA com a indústria do aço e do transporte aéreo.
Esse processo ocorre há vários anos, mas esteve mascarado pelo comportamento do consumidor americano de preferir os mastodontes criados e produzidos em Detroit. Mas a diferença de preços, o aparecimento de novos consumidores e novas tecnologias de produção quebraram essa proteção e expuseram a indústria à nova realidade de mercado. Uma das formas que essas duas empresas têm para tentar sair da sua situação de hoje é produzir seus produtos em outros países e exportá-los para os EUA. Aliás, como estão fazendo a terceira grande empresa americana do setor, a Chrysler, na China, e a Volkswagen, no Brasil.
Com esse processo em andamento, no setor automobilístico e em outros ramos da indústria, a força de correção dos déficits comerciais dos Estados Unidos via desvalorização do dólar diminui e cria esse sentimento de que a teoria econômica tradicional não mais funciona. A perda de competitividade da economia americana é hoje um fato importantíssimo na busca de uma estabilidade macroeconômica do mundo e ainda vai dar muita dor de cabeça para todos nós.
Folha de S.Paulo

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