Quatro semanas após ter engavetado a ampla reforma ministerial que reorganizaria politicamente o governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se reuniu com membros da cúpula petista na última quarta-feira (19/04) a fim de tentar achar uma saída justamente para a série de problemas de natureza política que enfrenta. E ainda não havia sido derrotado no STF (Supremo Tribunal Federal), novo tropeço que será abordado nesta coluna.
Lula chamou à Granja do Torto o ministro José Dirceu (Casa Civil), que tentou negar que tivesse ido, mas foi. Também estiveram presentes o presidente do PT, José Genoino, e os líderes do governo no Senado, Aloizio Mercadante (SP), e na Câmara, Arlindo Chinaglia (SP).
Apesar das negativas de praxe, a reunião foi importante. Lula pediu segredo. Mais uma vez, o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, que continua a ser bombardeado pelo PT, foi excluído de um encontro para discutir política.
O presidente pediu aos petistas a elaboração de uma estratégia para dar respostas aos ataques da oposição, principalmente às críticas de aumento de gastos públicos, de elevação da carga tributária e de fracasso da área social.
Abordou também a necessidade de o PT discutir em quais Estados poderá abrir mão de projetos majoritários (candidaturas a governos e ao Senado) em benefício de aliados, sobretudo do cobiçado PMDB.
Por último, foi mencionado na reunião o desfecho pífio da reforma ministerial discutida durante cinco meses. Apesar de negar, Lula estuda reabrir a reforma. As posições de Aldo e de Romero Jucá (Previdência) estão em risco. O primeiro continua na mira do PT. O segundo responde quase diariamente a acusações de desvio de verbas públicas. A eventual saída de Jucá seria até mais complicada, pois, por enquanto, o governo o banca em nome da governabilidade. A troca deveria ocorrer por iniciativa do ministro ou da ala peemedebista que o apóia.
O presidente, porém, tem sido claro nas conversas com auxiliares: se houver vazamento para a imprensa, não fará nada. Ou seja, vamos culpar os jornalistas pelos nossos problemas. Afinal, é mais fácil do que encarar a dura realidade. E bota dura nisso.
Mais uma
Não bastassem os percalços seguidos na Câmara e no Senado, o governo sofreu nesta semana uma derrota acachapante no STF (Supremo Tribunal Federal), corte judicial para a qual indicou quatro novos ministros, além de contar com a simpatia de pelos menos outros três. Contabilmente, teria a "boa vontade" de sete dos onze componentes do STF.
Mas o que aconteceu nem surpresa mais é. Por dez a zero, o STF decidiu derrubar a intervenção federal em hospitais da rede municipal do Rio de Janeiro. Eros Grau, um dos ministros, não estava presente.
Foi a decretação dessa intervenção federal que salvou o ministro Humberto Costa (Saúde) na reforma ministerial, quando ele já havia sido avisado pela cúpula petista de que seria substituído por Ciro Gomes (Integração Nacional). A intervenção enfraqueceu o prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia, pré-candidato pefelista a presidente da República em 2006. O governo, que achou que havia marcado um golaço, entrou numa fria.
O STF acatou o mandado de segurança apresentado por Maia. Foi a maior derrota judicial do governo Lula em 28 meses de governo. Como isso aconteceu num tribunal onde o governo, em tese, conta com a simpatia da maioria?
Arrisco um palpite: incompetência e arrogância. No governo FHC, que sofreu derrotas jurídicas, era sempre feita uma sondagem antes de adotar providências judiciais que julgava polêmicas. Havia mais cuidado.
Para o STF, Lula não apresentou argumentos jurídicos consistentes para medida tão dura, chamada pelo advogado-geral da União, Álvaro Ribeiro da Costa, de "requisição administrativa".
Veja só o que disse o ministro Carlos Ayres Brito, indicado pelo presidente para a corte: "É uma intervenção disfarçada, enrustida". Os outros foram na mesma linha.
Uma goleada de dez a zero só se explica por falta de competência política, porque há muitos ministros em posições erradas, e excesso de arrogância, essa mania da administração Lula de que tudo o que faz é "inaugural".
Pesquisas não são urnas
A cúpula do governo continua a acreditar piamente nas pesquisas que apontam vitória de Lula no primeiro turno. Esses levantamentos, hoje, podem dar ao presidente a falsa ilusão de invencibilidade.
A inacreditável coleção de derrotas políticas do governo neste ano pode ser assunto, por ora, dos formadores de opinião e não da maioria silenciosa que elege presidentes. Mas algum estrago fará. Falta muito tempo para outubro de 2006.
Ainda que vença, pois falta mesmo um candidato de peso na oposição, o risco será Lula se reeleger com dificuldade, tendo que vender a alma ao diabo para governar até 2010. E o governo que mudaria o Brasil viraria mais um a administrar a crise, exatamente o que fez FHC no segundo mandato.
FOLHA DE S.PAULO
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