Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, fevereiro 01, 2008

Fed: a maior queda de juros em duas décadas

Empuxo duplo
contra a recessão

O Federal Reserve aciona foguete dos
juros baixos para reverter a freada americana


Giuliano Guandalini

Tim Sloan/Reuters
Bush: pacote extra de 150 bilhões de dólares na economia

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A divulgação, nos últimos dias, de uma série de indicadores vitais para aferir a pulsação da atividade econômica americana deixou ainda mais exposta a desaceleração do país. Já não há nenhuma dúvida de que os Estados Unidos pisaram forte no freio depois do estouro da bolha no mercado imobiliário, em agosto do ano passado. Os sinais de enfraquecimento estão em toda parte. A construção de residências caiu 30% nos últimos doze meses, e as vendas de casas caíram ao menor nível desde 1995. O consumo perdeu fôlego, a atividade industrial recuou e o número de pessoas na fila do seguro-desemprego não era tão grande desde outubro de 2005. O produto interno bruto (PIB) do país atingiu um crescimento acumulado de 2,2% no ano passado, a menor taxa em cinco anos. Para piorar, já há quem detecte sinais incipientes de "estagflação", termo usado para indicar um período de ausência de crescimento associada à alta de preços.

Certamente é cedo para falar em estagflação. E não há consenso, entre os analistas, se os Estados Unidos vão entrar em recessão – seria a primeira desde 2001, causada pela explosão da bolha da internet no ano anterior. O que se sabe é que as autoridades econômicas do país não vão poupar energia para impedir que uma desaceleração ainda sob controle vire uma retração duradoura e acentuada. Combustível para isso não falta. O Federal Reserve – o Fed, o banco central do país – vem executando a mais agressiva redução na taxa de juros em duas décadas para fazer decolar a nave econômica americana. No dia 22 de janeiro, em meio à turbulência nas bolsas de valores, os diretores do Fed decidiram fazer um corte emergencial de 0,75 ponto porcentual na taxa básica de juros, derrubando-a para 3,5% e debelando a onda de pânico que ameaçava se instalar nos mercados. No dia 30, a instituição agiu de novo. Ceifou mais meio ponto de sua taxa básica, reduzindo-a para 3% ao ano. Assim, o Fed, comandado há dois anos pelo economista Ben Bernanke, deixou evidente que, a curto prazo, a possibilidade de uma recessão o preocupa mais do que o aquecimento inflacionário. Num intervalo de meros quatro meses, Bernanke operou uma redução sem precedentes na taxa de juros.

Houve quem criticasse a reação agressiva. "O Fed sacrificou sua independência ao ceder a pressões políticas e do mercado", disse a VEJA Allan Meltzer, da Universidade Carnegie Mellon. "É o mesmo erro cometido na década de 70: ação rápida contra a possibilidade de inflação e negligência no combate à inflação." De fato, a inflação está acima da chamada zona de conforto do Fed, que é uma taxa entre 1% e 2%. Nos últimos meses, o índice de preços ao consumidor tem subido num ritmo superior a 4% ao ano. Segundo os analistas, no entanto, o Fed optou por tolerar, por ora, uma alta dos preços acima do que gostaria. A prioridade, no momento, é descarregar toda a munição possível para evitar a recessão. A estimativa é que haverá uma nova redução na taxa de juros na próxima reunião do comitê de política monetária do Fed, que ocorrerá em março. Ao reduzir os juros, o Fed tenta sustentar o crédito e manter os níveis elevados de consumo americano. Os seguidos cortes na taxa de juros também se justificam diante da lambança em que se transformou o sistema financeiro americano. Com o estouro da bolha imobiliária, revelou-se um intrincado sistema de investimentos criativos e arriscados, que tinha como lastro papéis (hoje se sabe) de qualidade baixíssima. A pirâmide financeira que vinha estimulando a economia do país, a despeito de suas fragilidades – entre elas os déficits gêmeos, nas contas públicas e externas –, ruiu da noite para o dia. Aplicações feitas em fundos com nomes exóticos (veja o quadro ao lado) viraram pó, e os bancos já anotaram em seus balanços prejuízos que totalizam 100 bilhões de dólares. A sangria não deve parar por aí. De acordo com estimativas da agência Standard & Poor’s, as perdas das instituições financeiras podem chegar a 265 bilhões de dólares. Esse rombo bilionário levou os bancos a fechar a torneira do financiamento fácil. Embora esse ajuste seja saudável, uma retração acentuada nas linhas de crédito agravaria ainda mais a freada econômica. É isso que o Fed tenta evitar. Tão logo a turbulência se acalme e a economia recupere tração, a autoridade monetária poderia voltar a elevar os juros e assim combater a inflação – essa que é a sua principal meta.

Além da ação do Fed, a economia americana contará também com um pacote de estímulo fiscal proposto pelo governo do presidente George W. Bush. A despeito da disputa eleitoral, que começa a se acirrar conforme se aproxima a eleição presidencial de novembro, congressistas democratas (de oposição) e republicanos concordaram a respeito da urgência em aprovar um plano de ajuda financeira às famílias endividadas. O pacote inclui restituição de impostos de até 600 dólares para indivíduos e 1.200 dólares para casais, com adicional de 300 dólares por filho. Com a desaceleração econômica e o aumento do desemprego, mais e mais pessoas terão dificuldade para honrar suas hipotecas – o total de casas colocadas à venda por causa da inadimplência aumentou 75% no ano passado. Ainda é cedo para prever se a ação incisiva de Bernanke e o pacote de Bush terão empuxo suficiente para reverter a trajetória descendente do foguete americano. Recomenda-se, no entanto, fugir do catastrofismo. Entre 1999 e 2004, enquanto muitos enxergavam apenas crises no capitalismo, 135 milhões de pessoas saíram da pobreza em países que aderiram às regras de mercado. As soluções costumam vir do próprio sistema financeiro.

Uma crise selvagem...

Um número cada vez maior de produtos e serviços financeiros escapa do controle das autoridades monetárias.

Subprime - Empréstimos feitos a pessoas com histórico ruim de crédito. No setor imobiliário, em que a a crise começou, o buraco pode chegar a 300 bilhões de dólares

Monoline insurance companies - Empresas especializadas em oferecer seguro para papéis emitidos por prefeituras. Para ganharem mais dinheiro, elas recentemente expandiram seus serviços para o mercado de subprime. Deram-se mal. Resultado: prejuízo de 5 bilhões de dólares

Collateralized debt obligation (CDO) - Bancos emprestaram a quem não tinha emprego nem renda. Depois, empacotaram o direito de cobrar esses empréstimos em papéis, os CDOs, que pulverizariam o risco de inadimplência. Acabaram espalhando um megaprejuízo

Structured Investment Vehicle (SIV) - É um CDO mais agressivo, exclusivo do mercado hipotecário. Com o estouro do boom imobiliário, esses fundos viraram pó

Num mundo próspero...

Photodisc
Divertindo-se no torvelinho bursátil


Entre 1999 e 2004, enquanto muitos viam apenas as rodas injustas da engrenagem capitalista, 135 milhões de pessoas saíram da pobreza em países que aderiram aos mercados – uma revolução sem precedentes. Quase metade da humanidade mora hoje em 40 países com crescimento igual ou superior a 7%, taxa a partir da qual as economias dobram no prazo de uma década. Existem duas vezes mais pessoas nessas condições do que há três décadas




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