Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 23, 2008

Miriam Leitão

Várias fontes


O desenho do grande linhão que atravessará a Amazônia para interligar Tucuruí a Manaus tentou contornar alguns obstáculos, conta o presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), Mauricio Tolmasquim. Evitou terra indígena e áreas de preservação. O traçado, em apenas 150 km, atravessa a floresta. Ele acha que o projeto é tão bom que poderá ter crédito de carbono.

Quando Manaus estiver consumindo energia hidroelétrica, estarão sendo economizados R$ 2,2 bilhões de subsídios pagos pelos consumidores de outras áreas do país através da CCC e, segundo Tolmasquim, vai se deixar de emitir um milhão de toneladas de CO2 ao se desativar as usinas termelétricas a diesel que hoje iluminam Manaus.

O presidente da EPE diz que, quando falou das torres do tamanho da Torre Eiffel atravessando o Rio Amazonas, o fez apenas por orgulho nacional: — Não se tem orgulho de a Petrobras ir ao fundo do mar buscar petróleo? Neste projeto, as enormes torres receberão linhas por helicóptero, mas a tecnologia nacional sabe fazer isso. Como o projeto será leiloado, o vencedor pode querer fazer cabo submerso, mas deve sair mais caro.

Tratei desses temas na coluna do último sábado, mas o assunto ainda continua.

David Zylbersztajn acha que a interligação nem sempre é aconselhável.

— A interconexão total não é necessariamente o melhor modelo. Sistemas interconectados, quanto maiores, são mais instáveis e podem provocar imensos blecautes. Nos EUA, por exemplo, são cinco grandes grids — diz o consultor.

David acha que o custo financeiro e ambiental dessa ligação pode ser alto demais e que a demanda na região não justificaria esses investimentos. Acredita que talvez seja melhor um projeto de geração renovável local.

Tolmasquim, como todo mundo no governo, e grande parte dos especialistas, rejeita outras fontes renováveis, como a solar e a eólica, pelo preço: — A energia eólica está o equivalente a R$ 220 na Europa; a energia de Madeira sairá por R$ 178. Além disso, não há espaço para pequenas centrais hidrelétricas, e a energia solar sairia por quase R$ 500 o MW — afirmou.

Ele acha que, se optar por fontes mais caras, o Brasil terá de continuar mantendo a CCC. Essa sigla que, os mais velhos sabem, tem triste memória (era o Comando de Caça aos Comunistas, que aterrorizava a criação artística brasileira), hoje significa apenas Conta de Consumo de Combustíveis e tem até um objetivo nobre: reduzir as disparidades dos custos de energia, o que poderia ser uma barreira ao investimento em áreas mais remotas do país. O problema é que, como toda solução artificial, ela provocou distorções.

O linhão Tucuruí-Manaus seria para acabar com o subsídio ao uso de energia fóssil em Manaus, o que é uma irracionalidade dupla: subsidiar a poluição.

O consultor Adriano Pires, do CBIE, acha que a saída é investir mais em gás natural: — A melhor solução para gerar energia na Região Norte com menor impacto ambiental é o gás natural.

Na Amazônia, existem oito blocos de exploração, cinco na região dos rios Juruá e Urucu e três na região do Alto Solimões; nos municípios de Silves, Itacoatiara e Borba. As reservas de gás em Silves chegam a 6 bilhões de metros cúbicos e existe já um campo chamado Uatumã 1, que produz 700 milhões de metros cúbicos/dia. Por que não se termina o gasoduto Coari-Manaus e UrucuPorto Velho? — questiona Adriano.

Tolmasquim lembra que Coari-Manaus está terminando, mas acha que o gás natural não será suficiente para o consumo da região, que precisará da energia de Tucuruí e Belo Monte.

Adriano diz que a reserva de gás na região amazônica é a segunda maior do país.

Energia é tema polêmico, que mobiliza os especialistas.

E os divide. Adriano acha que não se pode comparar países como a Alemanha, que eu disse aqui que já tem 22 mil MW de energia eólica, porque, argumenta, o caso daquele país é totalmente diferente do nosso.

— A Alemanha está substituindo fontes de energia antigas e poluentes por novas e renováveis, como a eólica. Não sou contra as fontes eólica e solar. Ocorre que as duas não reúnem condições de escala e custo para atingir o volume da energia elétrica necessária para que o Brasil cresça a 5% — disse Adriano Pires.

Mas ninguém está defendendo que toda a oferta nova de energia venha dessas fontes. O que, sim, precisa acontecer é o governo analisar com uma visão mais contemporânea várias fontes e construir uma matriz mais diversificada; exatamente para reduzir os riscos de falta de energia.

Adriano é a favor de aumento de térmicas a carvão mineral, gás natural e nuclear.

O carvão, segundo ele, tem hoje tecnologias que reduzem a quantidade de poluição gerada. A conferir.

Existem, de fato, algumas tecnologias, elas também são caras, e apenas reduzem as emissões do que é ainda o mais poluente dos combustíveis fósseis.

Tolmasquim disse que não é contra a energia renovável e que, em sua vida de acadêmico, dedicou-se muito ao estudo delas. O que o entusiasma neste momento é a chance de usar a bioeletricidade.

— Limpa, renovável e pode chegar a ser até 5.000 MW. Parte vai entrar já em 2009.

A bioeletricidade vem do bagaço da cana, e os produtores de São Paulo estão preparados para fornecer no ano que vem. Os de Mato Grosso em 2010. Será um passo na direção de mais diversidade, o único norte que temos de buscar.

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