Um naufrágio mata catorze pessoas no Amazonas
e expõe os riscos da navegação na Região Norte
Leonardo Coutinho
Luiz Vasconcelos/AE |
Almirante Monteiro: abalroado por uma balsa que, segundo testemunhas, estava na contramão |
Navegar pela Amazônia requer coragem. Os barcos circulam nos rios da região apinhados de passageiros nas mais precárias condições de segurança. Na semana passada, um choque entre duas embarcações no Rio Amazonas expôs, outra vez, as dimensões do perigo. Catorze pessoas morreram afogadas. Entre elas, sete crianças. Na noite de sexta-feira, seis passageiros continuavam desaparecidos. Os sobreviventes contam que a tragédia foi causada por uma barbeiragem. O barco de passageiros Almirante Monteiro transportava 112 pessoas para Manaus. A maioria delas havia embarcado 27 horas antes na cidade de Alenquer, no Pará. Na madrugada do dia 21, nove horas antes de o navio chegar a seu destino, o comandante foi surpreendido pela rápida aproximação de uma balsa, que carregava combustível e descia o rio com as luzes apagadas. De acordo com os sobreviventes, a balsa trafegava no canal reservado às embarcações que navegam no sentido oposto. Ou seja, estava na contramão. Não houve tempo para evitar a colisão. O choque triturou o casco do Almirante Monteiro, um tipo de embarcação de madeira que é chamado de gaiola no Norte do país. A água invadiu seus porões e o gaiola começou a afundar.
A balsa nada sofreu, porque seu casco é revestido de placas de aço, mas seus tripulantes não pararam para ajudar os passageiros do Almirante Monteiro. O pedido de socorro do gaiola foi captado por uma embarcação da Polícia Civil que estava a meia hora do ponto do naufrágio. Desesperados, passageiros e tripulantes se jogaram nas águas escuras e tentaram nadar 90 metros até a margem. Muitos não conseguiram completar a travessia. Poderiam ter se salvado se tivessem ficado no Almirante, que bateu em um banco de areia e não afundou completamente. Identificado no dia seguinte, o piloto da balsa, Adejamar Andrade, nega que estivesse na contramão. A polícia suspeita que ele apagou as luzes da balsa porque transportava carga ilegal e queria passar despercebido. Ao fim da investigação, poderá ser indiciado por homicídio culposo.
Os rios são a única via de acesso às pequenas cidades e a localidades ribeirinhas da Amazônia. E, em capitais como Manaus e Belém, os barcos fazem papel de "ônibus" e conectam a terra firme às ilhas fluviais. O fluxo de passageiros registrado na Capitania Fluvial da Amazônia Ocidental, que abrange Amazonas, Acre, Rondônia e Roraima, chega a 2,8 milhões por mês. Cabe à Marinha fiscalizar esse movimento e monitorar as cerca de 100 000 embarcações que cruzam diariamente os 25 000 quilômetros navegáveis na região. Seria preciso checar se navegam com excesso de passageiros, de carga ou se respeitam as leis de navegação. Como a Marinha só dispõe de 200 homens para essa tarefa, os acidentes com vítimas fatais continuam a se suceder nos rios da Amazônia. É mais uma tragédia brasileira.