O Globo |
28/2/2008 |
A chefe da Casa Civil, ministra Dilma Rousseff, pode não vir a ser a candidata do PT à sucessão de Lula, mas, ao contrário de uma "metamorfose ambulante", ela tem opinião formada sobre tudo, desde como deveria ser a próxima campanha presidencial até como deveriam evoluir as relações entre o PT e o PSDB no futuro. Ela acha, por exemplo, que qualquer aproximação, como a sugerida pelo governador de Minas, Aécio Neves, só pode ser apoiada em programas de governo, o que implica dizer que dificilmente um eventual acordo poderia gerar uma candidatura única em 2010. Essa hipótese poderia ocorrer em Minas, diz ela, por causa de questões locais, mas provavelmente não haverá clima político para, já na próxima eleição, PT e PSDB estarem unidos em torno de um nome, pelo menos no primeiro turno. A senadora Ideli Salvatti, que também participava da conversa, vai mais longe e não acredita que Aécio Neves tenha condições de ser o candidato tucano na sucessão de Lula: "Ele será serrado em pleno vôo", brinca Ideli, se referindo à maior força política do governador de São Paulo, José Serra, na estrutura partidária do PSDB. Com Serra ou Aécio, Dilma torce por uma campanha eleitoral "sem rancores". Serra seria mais próximo ideologicamente do PT, e Aécio teria uma maneira de fazer política que visa ao entendimento. Mas tanto Dilma quanto Ideli não vêem disposição dos líderes do PSDB em se aproximar do PT, pela expectativa de poder real que detém, e pela necessidade de marcarem uma posição de confronto: "Na votação da CPMF ficou claro: os governadores e boa parte das bancadas faziam um acordo de madrugada e no dia seguinte o Fernando Henrique e o Bornhausen quebravam o acordo", diz Ideli. Embora haja um consenso, pelo menos na parte petista que a ministra e a senadora conhecem, de que seria bom para o país um acordo entre as duas forças partidárias que polarizam nossa vida política há quase 20 anos, há também a sensação de que ainda não amadureceram as condições para que isso aconteça, apesar dos avanços mineiros. "Se conseguíssemos fazer uma campanha eleitoral de alto nível, já seria um grande ganho", devaneia Dilma Rousseff. Na sua avaliação, os políticos de maneira geral não estão atuando à altura do momento que o país vive: "Acho que estamos numa situação econômica e social como há muito não vivíamos", diz ela, e os políticos deveriam pautar suas ações por um entendimento do que é melhor para o país, "independentemente dos interesses partidários". Ela admite que o PT na oposição foi radical e levava em conta mais os interesses políticos, como agora reclama da oposição. Mas tem uma explicação e uma certeza: "Nós não tínhamos experiência de governo e nunca mais seremos uma oposição como fomos". O que Dilma cobra é que um partido que já esteve à frente do governo federal, como o PSDB, não deveria se comportar com o radicalismo do "antigo PT", porque de outro modo "isso não terá fim, e é ruim para o país". Como dizia Engels, e não Marx, pontifica a ministra, "a repetição se transforma em farsa". Ela diz ter esperança de que, superada a campanha eleitoral sem radicalizações, PT e PSDB possam encontrar alguns pontos comuns num futuro programa de governo. Talvez sem lembrar que o próprio ex-presidente Fernando Henrique Cardoso disse isso em seu livro de memórias, Dilma diz que com a transição "tão civilizada" do poder para Lula, em 2003, ela pensou que se abriria um caminho para uma negociação entre os dois partidos. Fernando Henrique escreveu que esperava que Lula chamasse o PSDB para um governo de união nacional. E Lula tem dito em diversas ocasiões que o que Fernando Henrique queria mesmo é que seu governo fracassasse e que ele tivesse que pedir ajuda aos tucanos para se salvar. Apesar disso, houve momentos nos primeiros anos do governo Lula, antes do escândalo do mensalão, em que o próprio Lula antecipou o desejo de procurar o PSDB para um acordo, mas nunca se criou um clima propício para tal passo. Para a ministra Dilma, houve uma "desqualificação" do debate político no decorrer do tempo que impediu essa aproximação. A senadora Ideli Salvatti parece menos entusiasmada do que a ministra com a aproximação com o PSDB, avaliando que a disputa de poder, especialmente em São Paulo, impede a realização desse projeto. Ela admite que sua análise é influenciada pela situação do Senado, onde ela diz que o PSDB atua "a reboque dos Democratas": "É claro que o PT e o PSDB têm muito mais pontos em comum do que com os Democratas. Mas os interesses eleitorais aproximam os tucanos do DEM. E nos jogam nos braços dos outros partidos". O caráter ideológico do PT também seria um empecilho a uma aliança política com os demais partidos da base do governo, o que não impede que Lula trabalhe para fortalecer esses laços em busca de um candidato potencial que possa unir os partidos da base. Se encontrar um nome do PT que seja palatável pelo PMDB, hoje o seu principal sustentáculo político, seria a solução ideal. Dilma Rousseff é sua primeira e maior aposta. Oriunda do PDT, ela tem, primeiro, que se impor dentro do PT, para depois tentar atrair a base aliada. A disputa com o PMDB em torno dos postos-chaves do Ministério das Minas e Energia desgastou seu relacionamento com o principal pólo de poder político do partido, o senador José Sarney, mas a reaproximação está sendo feita. É o primeiro teste real para uma possível candidatura. |
Entrevista:O Estado inteligente
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