Entrevista:O Estado inteligente

domingo, fevereiro 24, 2008

Celso Ming

Recessão desmentida

A semana que passou fincou dois marcos impressionantes na trajetória dos preços das matérias-primas. Foram eles o reajuste do minério de ferro, de 65% (de 369% em cinco anos), e o recorde histórico das cotações do petróleo na New York Mercantile Exchange (Nymex), de US$ 100,86 por barril de 159 litros.

O esticão não se limita a esses dois preços. Quase todas as cotações dos preços das commodities - energéticas, metálicas e agrícolas - não param de subir.

O gráfico mostra como as curvas empinam, contrariando reiteradas previsões de analistas de que a iminência da recessão americana derrubaria tudo. No dia 10, esta coluna já havia chamado a atenção para a disparada. E, no entanto, de lá para cá os preços subiram em média 6,8%, o que exige atualização da análise.

Uma das avaliações que circulam por aí é de que a alta é sintoma de que os especuladores assopram nova bolha. Porque abandonaram o mercado imobiliário; porque fogem da volatilidade das ações; e porque não se sentem à vontade no mercado de títulos do Tesouro americano (uma vez que os juros estão baixos, as cotações do dólar não param de escorregar e a inflação está subindo), os investidores internacionais estariam mergulhando nas commodities. E isso explicaria por que as curvas se encabritam nos gráficos.

Esse ponto de vista é de difícil sustentação. Nenhuma especulação vai muito longe se opera contra os fundamentos do mercado. Se o diagnóstico da recessão mundial fosse procedente, quem estivesse comprando em commodities mais cedo ou mais tarde teria de enfrentar prejuízo com estoques e queda da demanda.

Parece forçoso reconhecer que a esticada reflete forte aumento da demanda que atinge grande universo de matérias-primas e não apenas as commodities consagradas.

Não há especulação financeira em mercados de liquidez relativamente baixa. Nenhum grande fundo de investimento especula com minério de ferro ou com ácido sulfúrico. Se os preços estão em disparada é porque o mercado vem sendo sustentado por forte aumento da demanda.

Esse movimento reflete o grande aumento do consumo dos países asiáticos, especialmente da China e da Índia que, nos últimos dez anos, empurraram entre 500 milhões e 600 milhões de pessoas para o mercado de consumo. Eles estão comendo mais, comprando mais industrializados e precisam de mais energia para tocar a economia. É o fenômeno que também autoriza a trabalhar com a hipótese de que a tão propalada recessão global talvez seja fenômeno circunscrito aos Estados Unidos e, ainda assim, pode não ser relevante.

Ainda há quem no Brasil esconjure a alta das matérias-primas. Para essa gente, é a doença que derruba o câmbio e mata a indústria, e não a oportunidade histórica a aproveitar, aquela que o Brasil não teve no século passado porque o emergente daquele tempo (os Estados Unidos) não precisava das matérias-primas brasileiras como os asiáticos precisam agora.

A nova demanda vai exigir ajuste e reciclagem da indústria, que podem ser dolorosos. Mas são o preço a pagar neste início de provável novo ciclo econômico de longa duração.

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