Entrevista:O Estado inteligente

terça-feira, agosto 30, 2005

Miriam Leitão :Câmbio e clima

o globo

Hoje será divulgada a quarta deflação seguida no IGP-M, talvez de 0,5%. Isso leva a quase zero o IGP-M acumulado. Deve fechar o ano abaixo de 2,5%. Na pesquisa semanal, as previsões para o IPCA de 2005 ficaram em 5,2%. Como o mundo não é perfeito, o petróleo, empurrado pelo Katrina, é o que preocupa. O presidente da Petrobras não descarta uma alta nos preços dos combustíveis, mas diz que eles estão hoje 41% mais altos em dólar que no primeiro semestre de 2004.
Na quarta-feira, será divulgado o crescimento econômico do segundo trimestre e todas as previsões são de que será bom, bem acima do desempenho do primeiro trimestre. Certamente, com isso, bancos e institutos vão rever para cima as previsões de crescimento, depois de terem meses atrás as reduzido fortemente. O Ipea já avisou que vai elevar sua previsão de novo. Ele havia reduzido para 2,8%. Já o Banco Central, que havia baixado para 3,5%, acima da média do mercado, está convencido de que quem entende de nível de atividade é ele.


— Deve ficar mesmo em 3,5% o PIB, mas o mais impressionante é o que aconteceu com a inflação. Há três meses, nós discutíamos o risco de a inflação superar o teto de 7%. Agora, o mercado prevê algo muitíssimo próximo do centro da meta — diz o professor Luiz Roberto Cunha, creditando os números à ação do Banco Central.

O BC tem sido criticado por todos — inclusive por mim — pelo excesso de juros. Os críticos mantêm a convicção de que 19,75% é uma taxa gigantesca, mas o fato é que conseguiu derrubar a inflação, ninguém mais duvida que a meta será atingida, e o país permanece crescendo. Hoje, num seminário sobre metas de inflação, o ambiente será favorável ao BC, apesar de ele ter sido o campeão de críticas nos últimos meses.

— Além da atuação do Banco Central, há dois outros fatores que explicam o resultado: câmbio e clima — comenta Luiz Roberto.

O câmbio caiu muito mais do que o previsto, em parte, pelos juros altos; mas o clima não é resultado de política monetária.

— Tivemos um dos melhores invernos dos últimos tempos; ou melhor, não tivemos inverno. Com isso, não houve prejuízo para as plantações. No início do ano, houve um choque agrícola devido à estiagem, mas depois a agricultura teve a ajuda do clima. O resultado é que caiu a inflação de alimentos. Por causa disso, haverá uma melhora da renda. Quando o preço de comida cai, aumenta a renda disponível. Isso pode ser um gás para o Natal. Acho muito precipitadas essas análises de que o Natal será ruim — afirma.

Tudo continua bem na economia, no meio do furacão mensalão na política, mas o preço do petróleo é cada vez mais desestabilizador. Principalmente pela imprevisibilidade. De sexta-feira para a abertura de ontem, o gás natural havia subido 18% nos Estados Unidos e a gasolina havia subido 8%. Desta vez, sobem por um motivo concreto: o furacão Katrina.

— O risco é o petróleo virar um choque de oferta negativo, pesando sobre a inflação. Apesar de o BC ter previsto aumento zero para a gasolina, os combustíveis podem subir lá para outubro ou novembro. Mais ou menos como no ano passado. Eles aproveitariam a folga na inflação para reajustar este ano ainda. Se for um aumento de 10% a 20%, teremos um impacto de 0,3% a 0,6% no IPCA — calcula o professor.

A grande dúvida que paira sobre a economia mundial — não apenas sobre a brasileira — é quanto aos preços do petróleo. O presidente da Petrobras, José Sergio Gabrielli, acha que o quadro de dificuldade de oferta e de alta demanda deve continuar no mundo no futuro próximo. Ele acredita que só em três ou quatro anos os preços voltarão a níveis normais.

— Neste momento, não existe razão para a Arábia Saudita subir a produção; ela está com resultado fiscal suficiente para manter a produção no nível em que está. A produção da Rússia está com capacidade de transporte limitada e o problema logístico não se resolverá a curto prazo. Por outro lado, a demanda cresceu muito e não deve cair como em outros choques do petróleo. A China era exportadora líquida de três ou quatro milhões de barris/dia de petróleo há três ou quatro anos e agora importa liquidamente seis milhões de barris/dia. Na Europa e no Japão, o impacto da elevação do preço do petróleo em dólar tem sido minimizado pela queda do dólar frente ao euro e ao iene. Por fim, para o consumidor americano os derivados de petróleo têm um peso muito menor no orçamento do que nas crises dos anos 70, portanto não haverá queda de consumo — afirmou Gabrielli.

Ele acrescenta que o mercado de futuro de petróleo tem hoje um elemento muito mais especulativo, que faz com que qualquer boato seja motivo de elevação dos preços. Como o Katrina é fato, isso aumentou ainda mais a cotação nos últimos dias, cedendo um pouco com a redução da força do furacão.

A boa notícia neste mercado é que estão sendo feitos novos investimentos, inclusive em refinarias. No Brasil, a última refinaria foi construída em 1980; nos Estados Unidos, em 1976. Gabrielli não descarta a possibilidade de elevar os preços dos combustíveis este ano ainda, mas conta que, por causa da queda do dólar e do reajuste de novembro, os preços internos em dólar, no primeiro semestre de 2005, estiveram 41% mais altos que no primeiro semestre do ano passado.

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