O GLOBO
A semana, vivida sob a tensão do desembarque da crise no coração da área econômica, começou ao meio-dia do domingo, com a entrevista do ministro Antonio Palocci, que injetou um novo ânimo no mercado. Ao longo dos dias, no entanto, novos fatos reduziram a confiança de que tudo já estivesse resolvido. Na sexta-feira, o governo divulgou um supersuperávit, a FGV divulgou uma sondagem mostrando confiança do empresário e a previsão é que, semana que vem, tem notícia boa sobre o PIB.
Enquanto a bolsa caía ontem e o dólar subia, puxados por mais um estresse da sexta-feira, quando boatos assolavam o mercado, uma notícia era comemorada: a Sondagem Industrial do Ibre/FGV identificou que quase 60% das 676 empresas pesquisadas "prevêem investir este ano um montante superior, em termos reais, ao efetivamente realizado em 2004". A notícia foi interpretada como um sinal de que a crise não chegou ainda nas intenções de investimento das indústrias.
— A minha dúvida é a seguinte: agosto já foi, este ano são só mais quatro meses e, no primeiro semestre, não vimos um aumento grande dos investimentos. Pelas conversas que tivemos com industriais, também não sentimos qualquer grande ânimo, não vejo um resultado assim tão positivo. Está todo mundo parado. A atitude é muito mais de "vamos esperar para ver o que vai acontecer". Esse dado se refere ao que foi programado. E o que foi programado, assim como no orçamento do governo, é muito diferente do que é executado. Seria mais importante ver 2006. Este número não diz muita coisa — comenta Luis Fernando Lopes, do Banco Pátria. Ele também lembra que os orçamentos das grandes empresas, das multinacionais serão fechados já em outubro e novembro, época em que a crise política deverá ainda estar influenciando bastante as decisões.
Para acompanhar com números mais atualizados o investimento, Luis Fernando Lopes usa três dados: a importação de bens de capital; a produção de bens de capital da PIM, do IBGE; e os insumos da construção civil, já que 60% da componente de investimento estão na construção.
— Houve uma queda forte no fim do ano passado e no começo deste ano. Agora está se recuperando. No segundo trimestre, os bens de capital cresceram 2,2% contra o trimestre anterior e importações também tiveram um aumento na mesma medida. Porém, no primeiro trimestre, o crescimento havia sido nulo e houve queda no último trimestre de 2004 — diz.
A expectativa do economista do Banco Pátria é que, no terceiro e no quarto trimestres, o crescimento seja menor na margem, ou seja, na comparação com o mês anterior, e maior na comparação com 2004. Mesmo com todo o suspense causado pelos tremores na política, a previsão deles continua sendo de um crescimento do PIB maior que 3% em 2005 e de cerca de 3,4% em 2006. O que podia até ser visto como bom; não fosse o fato de que outros emergentes crescerão este ano, segundo estimativas do FMI, cerca de 6%.
Na quarta-feira que vem, o IBGE divulga as Contas Nacionais do segundo trimestre. O Credit Suisse First Boston vê um resultado positivo nos números que serão divulgados, com crescimento de 1,2% na comparação com o trimestre anterior e de 3,7% na comparação com 2004. No primeiro tri, o crescimento havia sido de pífios 0,3%. Quem levará o número para cima, de acordo com as expectativas do CSFB, será a indústria extrativa-mineral, com crescimento de 6,9% na comparação com o primeiro trimestre (a estimativa para a indústria em geral é de um crescimento de 5,4% contra o ano anterior e de 0,9% contra o primeiro trimestre). Assim, cresceria bem mais que a atualmente combalida atividade agropecuária, que, segundo eles, deve crescer algo como 1,7% contra 2004 depois da quebra de safra. Para o CSFB, esses resultados farão mudar as expectativas do mercado quanto ao crescimento em 2005: "O resultado do PIB do primeiro trimestre levou à redução das expectativas de crescimento de 3,5% para os atuais 3%. A divulgação do PIB do segundo tri provocará, provavelmente, o retorno das previsões de crescimento para um nível mais elevado."
Eles acreditam que, no terceiro trimestre, a expansão continuará, mas de forma decrescente.
Porém o que preocupava o mercado ontem pela manhã era uma possível divulgação mais detalhada das gravações telefônicas de Buratti. Além de conteúdo pessoal e, diz-se, impublicável, ela teria mais referências aos contatos do ex-assessor. Uma outra história preocupou o mercado também desde cedo: uma denúncia de que Márcio Thomaz Bastos teria mais dinheiro no exterior do que declarara. Como os boatos não foram confirmados, o mercado tratou de "zerar suas posições" para enfrentar a tensão do fim de semana. Com isso, a bolsa acabou fechando em queda de 1,12% e o dólar com alta de 0,20%.
Nesta sexta-feira, também foi anunciado um superávit recorde até julho, que faz com que, em três meses, tenha sido superada toda a previsão de superávit do segundo quadrimestre do ano.
Ao contrário do que muitos ministros dizem, isso não é resultado de excesso de ortodoxia da equipe da Fazenda, mas de incapacidade administrativa de alguns setores do governo que não conseguem gastar o que está liberado para isso. O governo terá, portanto, que gastar mais nos próximos quatro meses para reduzir o superávit que está em mais de 6% do PIB. Isso pode injetar mais ânimo na economia. O problema é que a paralisia se agravou com a crise.
Do ponto de vista econômico, há chances de um bom fim de ano no país; do ponto de vista político, ruma-se para o desfecho de uma crise política de grande proporção.
Entrevista:O Estado inteligente
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