Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 02, 2005

Fica, Robinho!-GESNER OLIVEIRA

F0lha de S Paulo

Embora não seja santista, adiro ao movimento "fica, Robinho!", que procura convencer o atleta do Santos a permanecer no país e abrir mão de proposta milionária do Real Madrid, da Espanha. Apesar de romântica e com escassa chance de sucesso, a tentativa obriga a refletir sobre o que é necessário para reter os melhores talentos no país.
Todos os titulares da seleção que derrotou a Itália na final da Copa do México, em 1970, por 4 a 1, jogavam no Brasil. Apenas dois jogadores do time que derrotou a Argentina por 4 a 1 na última quarta-feira jogam em clubes brasileiros: Robinho, do Santos, e Cicinho, do São Paulo. O primeiro está de malas prontas, e o segundo já é assediado por clubes estrangeiros.
Nos anos 70, o país crescia à taxa média de quase 9% ao ano. Não se cogitava a hipótese de estagnação e não se conhecia o desemprego aberto. A Espanha, em contraste, era uma economia atrasada relativamente ao resto da Europa, marcada por quatro décadas de ditadura franquista.
Nas últimas décadas, o Brasil reconquistou a democracia, estabilizou a economia, mas cresceu de forma modesta (menos de 3% ao ano). A Espanha promoveu bem-sucedida transição para a democracia e acusou notável modernização ao se integrar à União Européia. O PIB por habitante da Espanha era cerca de 1,6 vez o brasileiro em 1970; atualmente, é mais de 7 vezes o do Brasil.
Nos anos 70, seria motivo de revolta se alguém ousasse molestar algum jogador de futebol, mesmo não se tratando de um ídolo como Robinho. Já houve caso de assaltantes que devolveram o fruto do assalto e pediram desculpas às suas vítimas ao se darem conta de que eram atletas conhecidos. Não faziam isso por medo, mas por respeito. Atualmente, não há respeito sequer pelas mães dos jogadores, que se tornaram alvos da indústria do seqüestro! Luis Fabiano, Grafite e o próprio Robinho, entre outros, tiveram as mães seqüestradas.
Em meio à comemoração da vitória sobre a Argentina, Robinho alegou que a segurança da família era um dos fatores que pesavam em sua decisão de partir. Quantos biólogos, engenheiros mecatrônicos, geneticistas e tantos outros profissionais talentosos o Brasil não perde pela mesma razão? Quantas empresas não deixam de expandir suas atividades no país em razão do crônico problema de violência? A criminalidade constitui hoje um dos entraves ao crescimento, e não há uma ação sistemática para reverter esse quadro.
Além disso, há a atração da moeda forte. Os mais fanáticos torcedores do Santos devem fazer um exame de consciência e se perguntar se estariam dispostos a deixar de receber de cinco a dez vezes mais em euros para permanecer no Brasil. Nenhuma moeda se torna forte por um passe de mágica. Juros excessivamente altos como os nacionais podem valorizar a moeda apenas temporariamente. No longo prazo, uma moeda só se fortalece com o aumento da competitividade, que, por sua vez, exige elevação do investimento e da produtividade. No entanto a taxa de inversão no Brasil é baixa e está declinando.
Não bastassem os fatores macroeconômicos, há os problemas gerencial e societário nos clubes de futebol no Brasil. Apesar de deterem marcas fortíssimas e um bom mercado doméstico, a maioria dos clubes nacionais ainda não adotou práticas modernas de governança corporativa e administração profissional. Será necessário um período de saneamento das finanças e reorganização dos clubes, como ocorreu na Espanha no início dos anos 90. Mais importante, será necessária uma nova geração de empresários esportivos de forma análoga à que ocorreu no agronegócio brasileiro nas duas últimas décadas.
Seria injusto pedir que um profissional abra mão de oportunidades de uma economia globalizada. Mas é inaceitável que o país assista de forma passiva a sua contínua perda de importância no cenário internacional. O apelo do "fica, Robinho" é legítimo, mas insuficiente. Para segurar outros Robinhos do futebol, das artes e das ciências, serão necessários mais segurança, educação e investimento. Isso, por sua vez, requer um choque de gestão pública e privada.

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