O Estado de S Paulo
Deputada vê nas ações de Valério pontos em comum com a máfia dos bicheiros do Rio A experiência profissional não deixa sombra de dúvida na convicção da deputada Denise Frossard: Marcos Valério de Souza administrou um esquema de lavagem de dinheiro muito parecido com a máfia que durante anos funcionou no Rio de Janeiro sob o comando de banqueiros do jogo do bicho e que ela, como juíza, desmontou e condenou à prisão. A maior das semelhanças, na opinião da deputada, é a amplitude e a ausência de preferências políticas ou identidade ideológica que caracterizam ambos os sistemas. "Marcos Valério me lembra muito o Castor de Andrade quando dizia que a contravenção é governo sempre e que não tem culpa se os governos mudam a toda hora." Com base nos fatos já apurados, a deputada afirma: "Ele recebia dinheiro de qualquer um e fazia o que era de interesse do cliente." Eleita pelo PSDB, hoje no PPS, juíza aposentada depois de 15 anos de julgamentos quase diários, Frossard não se abala, embora não esteja imune ao espanto geral, com o fato de a sistemática de distribuição de dinheiro alcançar os mais variados partidos, organizações não-governamentais e associações de prefeitos e até de juízes. Para ela, dá no mesmo: "A sociedade está diante de uma monumental ilegalidade que, pelo fato de atingir muita gente, nem por isso se torna legal. Os envolvidos terão de responder pelos crimes independentemente de suas origens partidárias ou profissionais. Quem entra na esfera da investigação está sujeito à punição, tem de responder pela quebra da lei." A partir do depoimento de Renilda de Souza, mulher de Marcos Valério, a deputada considera que o ex-ministro da Casa Civil José Dirceu entrou na "esfera da investigação", bem como o PSDB de Minas Gerais que, em1998, usou as empresas e o instrumental de empréstimos bancários de Valério para repassar dinheiro à campanha do então candidato ao governo do Estado, Eduardo Azeredo, hoje presidente do partido. "A mecânica é a mesma", diz ela. Em tese, as reuniões de José Dirceu com dois bancos para falar sobre empréstimos feitos ao PT nada teria de incriminador. "Não fosse o fato de que esses empréstimos, conforme está demonstrado, serem ilegais", ressalva Denise Frossard. Ilegais porque indubitavelmente, segundo ela, usados para lavar "dinheiro espúrio". Outra certeza da deputada diz respeito ao papel de Marcos Valério. "Ele é o dono da lavanderia, precisamos descobrir quem são os cúmplices e as fontes onde eram captados o dinheiro." Ontem mesmo a deputada apresentou requerimento pedindo a transferência do sigilo bancário do publicitário Duda Mendonça para a CPI, a fim de confirmar se recursos da campanha eleitoral de 2002 foram também repassados por intermédio das empresas de Marcos Valério. Ela fez o pedido em função de uma informação dada por Delúbio Soares, já no fim do depoimento dele na quarta-feira passada. De acordo com o ex-tesoureiro, os R$ 39 milhões de empréstimos feitos pelo PT foram para pagar também dívidas da campanha de 2002. Em relação ao depoimento de Renilda de Souza, Denise Frossard , autora da proposta para que ela fosse ouvida como investigada e não como testemunha, considerou a mulher de Marcos Valério bem instruída pelos advogados para fazer na CPI o papel exclusivo de dona de casa com conhecimento quase inexistente a respeito das atividades das empresas do marido. Como forma de garantir um desempenho razoável e evitar maiores comprometimentos na CPI, a deputada pode até concordar com a estratégia da defesa, mas lembra - e disse isso a Renilda - que a razão primeira de sua convocação foi o fato de ser sócia e não esposa de Marcos Valério. "Na Justiça ela responderá nessa condição, o juiz levará em conta suas omissões e isso pesará contra ela." O principal nesse tipo de investigação muito ampla, na opinião de Denise Frossard , é investigados e investigadores não perderem o foco e passarem a acreditar na possibilidade de o envolvimento de muita gente resultar numa absolvição geral. "Já tive casos de processos por homicídio com 190 réus, nem por isso todos deixaram de ir a julgamento. Se há muitos acusados, isso só significa que há uma gama maior de crimes e não que a sociedade aceitará a ilegalidade porque a transgressão foi coletiva." Co-autoria No jargão da Justiça, a atitude de Renilda ao levar espontaneamente o nome do ex-ministro Dirceu ao centro das investigações é conhecida pelo nome de "chamada de co-réu". Modelo A ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, evitou, ao se posicionar contra a indicação de um funcionário sob investigação para a presidência da Infraero, o que poderia ter sido evitado em diversas áreas do governo se outros integrantes da equipe presidencial conferissem aos negócios de Estado a mesma reverência. Contribuiria para isso, além dos atributos pessoais de cada um, uma orientação inequívoca do presidente da República no tocante à fiscalização das biografias que compartilhariam com ele a administração pública federal.
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Entrevista:O Estado inteligente
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quarta-feira, julho 27, 2005
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