Entrevista:O Estado inteligente

sábado, julho 30, 2005

DORA KRAMER O não dito pelo mal dito

O Estado de S Paulo

Interessante como os políticos recuam quando é acesa a luz dos bastidores É bem possível que tenhamos todos ouvido mal, não custa dar aos que por alguns dias fizeram circular em Brasília a idéia de se fazer uma concertação geral em busca do arrefecimento artificial da crise política o benefício dessa dúvida.

Fato é que, se disseram qualquer coisa nesse sentido, trataram rapidamente de deixar o mal dito pelo não dito. Do governo à oposição, não houve quem ontem deixasse de mostrar indignação com a hipótese de acerto e registrar muito bem registrado que, se houve isso, foi por iniciativa do alheio.

Em nome do governo falou o ministro da Articulação, Jaques Wagner, cuja assessoria aponta a posição de cautela do ministro diante da possibilidade de se confundirem sugestões de preservação da "governabilidade" com tentativa de refrear o ânimo investigatório das CPIs.

Pelo PT falou seu presidente, Tarso Genro - "Acordo para reduzir investigações não é conosco" -, pelo PFL manifestou-se o deputado José Carlos Aleluia - "Estamos fora, não botamos fogo, mas também não jogamos água fria" - e em nome da CPI dos Correios e do Conselho de Ética da Câmara falaram o relator e o presidente, respectivamente, ambos rechaçando arranjos.

Sem dúvida é bom que seja assim. Afinal, negociações para arrefecer punições e preservar a priori a figura do presidente da República levariam à desmoralização geral. Mas convém anotar para efeito de fiscalização permanente que houve, sim, propostas de acordos impossíveis.

Claro que ninguém disse as coisas às claras, sugerindo escambos à luz do dia. Mas, como é hábito no mundo da política quando se quer chegar a um objetivo de transparência questionável, escolheram o caminho das tergiversações na penumbra.

O mais usado deles é justamente o da sustentação da governabilidade, seja para justificar a prática do fisiologismo, seja para dourar a pílula de uma partilha de prejuízos a um limite considerável suportável.

Era desta natureza a conversa que se punha em andamento e que, levada à luz do noticiário com seu exato nome de nascença - sem sofismas - provocou o recuo geral.

Nada indica seja permanente, porém, porque a motivação de ambas as partes - governo e oposição (principalmente agora o PSDB) - continua latente e voltará a ser posta em movimento.

Convém, no entanto, que suas excelências o façam de uma maneira mais convincente e sobretudo transparente, dando aos bois os nomes certos.

Se não é operação abafa o pretendido, apresentem-se então propostas claras, expliquem-se os objetivos a serem alcançados, digam quem cede o quê e a sociedade saberá entender e, quem sabe, até aplaudir.

Fato e ficção

No afã de ressaltar de José Dirceu o passado glorioso de lutas em defesa da moral e dos bons costumes, o senador Eduardo Suplicy cometeu uma gafe num trecho e e agrediu a História no outro, em seu discurso de ontem de manhã no Senado.

Ao tecer loas à trajetória ética de Dirceu, acabou ressaltando a atual condição de renegado do próprio passado frente ao volume de explicações que deve à Nação em geral e ao PT em particular.

Ao rememorar a participação do ex-ministro na luta democrática, Suplicy atribuiu ao PT a autoria do movimento pelas eleições Diretas-Já.

Foi cruel com o PMDB, partido do autor da emenda das diretas, Dante de Oliveira, do primeiro incentivador da idéia, Franco Montoro, e do grande símbolo do movimento, Ulysses Guimarães.

Foi Ulysses e não Lula quem ficou conhecido como "senhor diretas".

Anteparo

Não é por amor ou amizade que o Planalto se empenha em proteger José Dirceu e resguardá-lo ao máximo da condenação pelo comando do esquema de arrecadação de dinheiro público e privado para sustentação da máquina do PT.

O sentimento é de autopreservação, pois vigora no governo a certeza de que enquanto Dirceu estiver de pé ele serve de anteparo à figura do presidente Lula.

Voz do dono

Segundo a mais recente versão oficiosa espalhada pelos amigos de José Dirceu, enquanto era ministro da Casa Civil ele tentou afastar Delúbio Soares três vezes do cargo de tesoureiro do PT por discordar de seus métodos de administração das finanças, mas não teve força para tanto.

Os deputados Paulo Rocha, Professor Luizinho e José Mentor - todos integrantes da lista de clientes do mensalão do Banco Rural - foram visitar Dirceu e saíram dizendo à imprensa que o ex-ministro lhes confidenciou ter fracassado nas três tentativas porque "não deixaram" ele tirar Delúbio.

Considerando a hierarquia existente no PT e no governo, alguém para "não deixar" José Dirceu fazer alguma coisa só pode responder pelo nome de Luiz Inácio da Silva.

Das duas, uma: ou os três amigos de Dirceu queriam fazer as pessoas de bobas e mostrar o ex-ministro como inimigo de Delúbio a fim de preparar terreno para o depoimento do Conselho de Ética, ou Dirceu já começa a querer dividir responsabilidades em público com o presidente Lula.


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