O Globo
Primeiro de alguns cenários malucos: depois de sete dias de discussões atrás de portas trancadas, a CPI dos Correios (título mantido por razões sentimentais) informa ter chegado à conclusão de que caixa é substantivo feminino. Por maioria de votos, decide-se que o gênero do substantivo não modifica o numeral. Portanto, o certo será dizer "a caixa duas". Pode ser detalhe mas tem o valor histórico de ser a primeira decisão da CPI aprovada por todos os partidos.
Segundo cenário: É decidido que testemunhas suspeitas de relutância serão enquadradas numa de duas situações jurídicas: numa, já tradicional, estarão os proibidos de silenciar, mas autorizados a mentir; na outra, os proibidos de mentir mas com licença para dormir durante a formulação das perguntas. Apenas muxoxos são autorizados, e unicamente a depoentes de idade avançada.
Têm graça essas brincadeiras ridículas com assunto tão sério?
Claro que não. Mas o besteirol talvez chame a atenção para a necessidade de a CPI parar de servir de palco para o exibicionismo agressivo e a retórica vazia de alguns, como visto na apresentação integral pela TV e percebido no detalhado destaque dado pela imprensa aos depoimentos públicos.
O problema não está no palco, mas nos atores. Alguns deixam no eleitor-espectador a impressão de que CPIs servem mesmo como vitrine para parlamentares, e pouco ajudam na busca da verdade.
É conclusão falsa, como prova a história das comissões, e pelo que já se levantou nesta dos Correios. Só acontece que ninguém agüentaria passar horas na frente da televisão vendo a CPI trabalhando de verdade; ou seja, um grupo de senhores exaustos conferindo montanhas de folhas cobertas de cifras e nomes.
O resultado é que se passa para o cidadão a impressão de que os depoimentos são a essência da investigação parlamentar. Não é verdade: D. Renilda, mulher do candidato a vilão Marcos Valério, passou oito horas na CPI — e de todo esse tempo extraiu-se apenas a informação de que o hoje deputado José Dirceu sabia dos empréstimos articulados pelo marido da depoente para subsidiar a caixa-preta das despesas petistas. E tempo é bem precioso para toda CPI: inquéritos que se arrastam por meses a fio inevitavelmente perdem espaço na mídia, abrigo na memória da opinião pública e, com desagradável freqüência, a possibilidade de produzirem resultados práticos.
Há outro efeito: a seqüência de intermináveis depoimentos transmitidos ao vivo não ajuda a imagem dos interrogadores — e, por extensão, a do próprio Congresso. A que título e com que direito, pergunta o espectador, a discurseira interminável e auto-referente a que tantos se entregam? A repetição incansável de perguntas já diversas vezes respondidas? E as manifestações de agressiva falta de educação? Nem todos agem assim — mas são os excessos que ficam na memória da opinião pública e mancham a imagem do Congresso. Sem falar no risco de criar simpatia para depoentes que não a mereçam.
No essencial — o visível empenho na busca da verdade e no trabalho interno — a CPI e seu comando não parecem merecer nota baixa. Pelo menos até agora.
Será pena se a turma do picadeiro acabar conseguindo mais visibilidade do que o pessoal que trabalha de verdade.
Entrevista:O Estado inteligente
- Índice atual:www.indicedeartigosetc.blogspot.com.br/
- INDICE ANTERIOR a Setembro 28, 2008
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Arquivo do blog
-
▼
2005
(4606)
-
▼
julho
(532)
- Do foguetório ao velório Por Reinaldo Azevedo
- FHC diz que Lula virou a casaca
- DORA KRAMER A prateleira do pefelê
- Alberto Tamer Alca nunca existiu nem vai existir
- Editorial de O Estado de S Paulo Ética do compadrio
- LUÍS NASSIF A conta de R$ 3.000
- As elites e a sonegação JOSÉ ALEXANDRE SCHEINKMAN
- Lula se tornou menor que a crise, diz Serra
- JANIO DE FREITAS A crise das ambições
- ANTÔNIO ERMÍRIO DE MORAES Responsabilidade e amor ...
- ELIANE CANTANHÊDE É hora de racionalidade
- CLÓVIS ROSSI Não é que era verdade?
- Editorial de A Folha de S Paulo DESENCANTO POLÍTICO
- FERREIRA GULLAR:Qual o desfecho?
- Editorial de O Globo Lição para o PT
- JOÃO UBALDO RIBEIRO Não é por aí
- Miriam Leitão :Hora de explicar
- Merval Pereira Última instância e O imponderável
- AUGUSTO NUNES :A animada turnê do candidato
- Corrupção incessante atormenta a América Latina po...
- Blog Noblat Para administrar uma fortuna
- Diogo Mainardi Quero derrubar Lula
- Tales Alvarenga Erro tático
- Roberto Pompeu de Toledo Leoa de um lado, gata dis...
- Claudio de Moura Castro Educação baseada em evidência
- Dirceu volta para o centro da crise da Veja
- Ajudante de Dirceu estava autorizado a sacar no Ru...
- Até agora, só Roberto Jefferson disse a verdade VEJA
- O isolamento do presidente VEJA
- VEJA A crise incomoda, mas a economia está forte
- veja Novas suspeitas sobre Delúbio Soares
- VEJA -A Petrobras mentiu
- Editorial de O Estado de S Paulo A conspiração dos...
- DORA KRAMER O não dito pelo mal dito
- FERNANDO GABEIRA Notas de um pianista no Titanic
- Economia vulnerável GESNER OLIVEIRA
- FERNANDO RODRIGUES O acordão
- CLÓVIS ROSSI A pizza é inevitável
- Editorial de A Folha de S Paulo A SUPER-RECEITA
- Editorial de A Folha de S Paulo O PARTIDO DA ECONOMIA
- Zuenir Ventura O risco do cambalacho
- Miriam Leitão :Blindada ou não?
- A ordem é cobrar os cobradores
- Mas, apesar disso, o PSDB e o PFL continuam queren...
- Em defesa do PT Cesar Maia, O Globo
- Senhor presidente João Mellão Neto
- Editorial de O Estado de S Paulo 'Novo fiasco dipl...
- Editorial de O Estado de S Paulo 'Erros', fatos e ...
- DORA KRAMER Um leve aroma de orégano no ar
- Lucia Hippolito :À espera do depoimento de José Di...
- LUÍS NASSIF Uma máquina de instabilidade
- ELIANE CANTANHÊDE Metralhadora giratória
- CLÓVIS ROSSI Socorro, Cherie
- Editorial de A Folha de S Paulo SINAIS DE "ACORDÃO"
- Editorial do JB Desculpas necessárias
- Villas-Bôas Corrêa A ladainha dos servidores da pá...
- Editorial de O Globo Acordo do bem
- Miriam Leitão :Apesar da crise
- Luiz Garcia A CPI e os bons modos
- Merval Pereira Torre de Babel
- DILEMA PETISTA por Denis Rosenfield
- Ricardo A. Setti Crise mostra o quanto Lula se ape...
- Um brasileiro com quem Lula preferiu não discutir ...
- Editorial de O Estado de S Paulo Do caixa 2 ao men...
- Que PT é esse? Orlando Fantazzini
- Alberto Tamer China se embaralha para dizer não
- DORA KRAMER Elenco de canastrões
- LUÍS NASSIF Uma questão de tributo
- PAULO NOGUEIRA BATISTA JR. Antídoto contra a mudança
- JANIO DE FREITAS Questão de ordem
- Responsabilidade DENIS LERRER ROSENFIELD
- DEMÉTRIO MAGNOLI A ética de Lula e a nossa
- ELIANE CANTANHÊDE Caminho da roça
- CLÓVIS ROSSI Legalize-se a corrupção
- Editorial de A Folha de S Paulo PRISÃO TARDIA
- Lucia Hippolito :Uma desculpa de Delúbio
- Cora Ronai Não, o meu país não é o dos delúbios...
- Miriam Leitão Dinheiro sujo
- MERVAL PEREIRA Seleção natural
- AUGUSTO NUNES Tucanos pousam no grande pântano
- Villas-Bôas Corrêa- Lula não tem nada com o governo
- José Nêumanne'Rouba, mas lhe dá um bocadinho'
- Entre dois vexames Coluna de Arnaldo Jabor no Jorn...
- Zuenir Ventura Apenas um não
- Editorial de O Estado de S. Paulo As duas unanimid...
- Luiz Weiss O iogurte do senador e a "coisa da Hist...
- Nunca acusei Lula de nada, afirma FHC
- Editorial de O Estado de S Paulo Triste tradição
- Editorial de O Estado de S Paulo Lula sabe o que o...
- A mentira Denis Lerrer Rosenfield
- As duas faces da moeda Alcides Amaral
- LUÍS NASSIF O banqueiro e a CPI
- FERNANDO RODRIGUES Corrupção endêmica
- CLÓVIS ROSSI Os limites do pacto
- Editorial de A Folha de S Paulo O CONTEÚDO DAS CAIXAS
- Editorial de A Folha de S Paulo A CRISE E A ECONOMIA
- DORA KRAMER À imagem e semelhança
- Miriam Leitão :Mulher distraída
- Zuenir Ventura aindo da mala
- Merval Pereira Vários tipos de joio
-
▼
julho
(532)
- Blog do Lampreia
- Caio Blinder
- Adriano Pires
- Democracia Politica e novo reformismo
- Blog do VILLA
- Augusto Nunes
- Reinaldo Azevedo
- Conteudo Livre
- Indice anterior a 4 dezembro de 2005
- Google News
- INDICE ATUALIZADO
- INDICE ATE4 DEZEMBRO 2005
- Blog Noblat
- e-agora
- CLIPPING DE NOTICIAS
- truthout
- BLOG JOSIAS DE SOUZA
Nenhum comentário:
Postar um comentário