A esta altura, contudo, com a divulgação do milagre da transformação de um filho subempregado em sócio descapitalizado de uma grande empresa de telefonia num negócio rentável e com a multiplicação por três em dois anos e meio do faturamento da empresa da qual saíra o prestigiado secretário Luiz Gushiken, talvez o êxito desse golpe pelo avesso da blindagem venha a depender de um empurrãozinho de Sua Excelência.
Tendo ele próprio passado agora a depender do benefício da dúvida e da presunção de cega e surda ingenuidade, Lula precisa dar à Nação sinais inequívocos de que se arrependeu de não ter dado ouvidos a um companheiro probo (e, como Dirceu, valorizado pela participação na luta armada contra a ditadura) como Paulo de Tarso Venceslau, que levara a conhecimento dele evidências de irregularidades semelhantes praticadas para idênticos fins por seu compadre Roberto Teixeira em prefeituras sob controle petista. Eram gestões como a do fiel amigo Jacó Bittar, réu em oito processos, alvo preferencial do sucessor, Toninho do PT, assassinado quando o investigava, e pai de dois sócios de seu primogênito, Fábio Luís, num negócio que só rivaliza em crescimento com os dos sucessores do secretário de Comunicação e da rede de agências de publicidade de Marcos Valério de Souza.
Esse mea-culpa necessário deveria começar pela demissão do ex-prefeito de Campinas da sinecura em que se refestela e pela permissão para que Gushiken prove sua inocência passando uma temporada sem determinar que agências de publicidade abocanharão as milionárias contas do governo. Assim, a sociedade civil poderia até ter uma benéfica crise de amnésia em relação às pretensões que esse comissário com pose de filósofo zen já tivera ao controle de noticiário e opinião dos meios de comunicação por meio do Conselho Federal de Jornalismo (CFJ) e à sua capacidade de indicar técnicos de notório saber para dirigir fundos de pensão de estatais. Tais técnicos têm demonstrado peculiar zelo pela poupança dos aposentados em fundos como o Real Grandeza, de Furnas, que a depositou em instituições da inequívoca reputação dos bancos Santos, BMG e Rural. Se não tomar atitudes assim, talvez a blindagem se torne inviável.
Menos vulnerável ficaria o presidente se ouvisse os apelos de um aliado sabidamente honesto, o senador Pedro Simon (PMDB-RS), e nomeasse um Ministério acima dos partidos e composto por brasileiros reconhecidamente probos e competentes. Está certo que a experiência do "Ministério ético" de seu antecessor e adversário Collor não foi, de fato, um êxito e talvez não seja tão fácil achar quem aceite seu convite, mas desistir, no caso específico, pode significar perder uma excelente oportunidade de auto-ajuda.
Aí, Sua Excelência passaria a depender de um milagre que tornasse verossímil o enredo insinuado pela ex-líder do PT no Senado Ideli Salvatti (SC). Ao interrogar a ex-secretária de Marcos Valério Fernanda Karina Somaggio, ela deixou no ar a hipótese de que tudo pode resultar de uma armação da qual a depoente, que já teve 33 denúncias comprovadas, seria uma das artífices e cujo epicentro se situaria na cidade interiorana de Mococa, de cuja Câmara faz parte o vereador Bruno Somaggio, do PTB. Comprovada a "conexão Mococa", Dirceu voltaria com pompa à Casa Civil e Genoino, à presidência do PT; Delúbio iria para o lugar de Palocci e talvez alguém se aventurasse a apresentar a candidatura de Silvinho Pereira a uma canonização em vida, antes mesmo da de João Paulo II. Aí se restauraria a verdade do dito popular segundo o qual "só não se explica batom na cueca", em descrédito desde que o assessor do irmão de Genoino substituiu o adereço feminino por mil notas verdes de US$ 100. Além disso, a célebre ameaça de José Américo - "eu sei onde está o dinheiro" - seria esquecida de vez e o PT poderia retomar projetos adiados por culpa da ação solerte da elite golpista, tais como o CFJ, a Ancinav, o aparelhamento do Estado e a perenização no poder.
Caso, contudo, não se confirme a hipótese de Roberto Jefferson, Marcos Valério, Maurício Marinho e José Adalberto Vieira da Silva conspirarem contra a República petista a soldo do "suspeitíssimo" Bruno Somaggio e do solerte PTB de Mococa, resta a hipótese de a senadora se tornar um orgulho nacional ao superar o Código Da Vinci, de Dan Brown, e a obra completa de Paulo Coelho nas listas dos livros de ficção mais vendidos em Europa, França e Bahia... Mas, e o Brasil como é que fica, hein?
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