Ao lançar o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), há um ano, o governo prometeu fazer da Eletrobrás uma empresa exemplar, gigante e lucrativa, uma outra Petrobrás, na definição da ministra Dilma Rousseff. Nenhuma ação concreta nessa direção ocorreu até que, em 11 de março, uma Medida Provisória (MP) mudou a legislação e ampliou os poderes da estatal. É possível construir uma empresa musculosa, eficiente e lucrativa por decreto? É claro que não. E, no caso, é pior, porque usar a Eletrobrás e subsidiárias como instrumentos de barganha com partidos políticos, como tem feito o governo Lula, ao contrário de fortalecê-las, as enfraquece e as desmoraliza. Para crescer, ser forte e eficiente, qualquer empresa - estatal ou privada - precisa de gestores tecnicamente capacitados, experientes e com autonomia para recusar pedidos e favores político-partidários contrários aos interesses da empresa, sem temer ser demitido em represália.
Em meados do ano passado, a ministra Dilma Rousseff tentou buscar no mercado um executivo competente e sem ligação partidária para presidir a Eletrobrás. Orientou o ex-ministro Silas Rondeau a consultar o atual presidente da Light, José Luiz Alquéres, o ex-presidente da Eletropaulo Eduardo José Bernini e o ex-diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) José Mário Abdo. Nenhum aceitou por não acreditar que teria autonomia para conduzir a empresa sem ingerências políticas. E, na partilha do setor elétrico, venceram o PMDB, que ficou com as presidências da Eletrobrás, de Furnas e da Eletronorte, e o PT, que levou a Eletrosul.
A MP que ampliou poderes autoriza a Eletrobrás a se associar a consórcios empresariais e participar de sociedades, no Brasil e no exterior, para explorar energia elétrica sob regime de concessão. Esta definição simplória e genérica só dá poderes para a empresa expandir negócios, mas não garante dotá-la de musculatura e eficiência, simplesmente porque não há no comando um executivo experiente e competente, muito menos projeto e planejamento estratégico para alcançar o objetivo pretendido. Na verdade, a Eletrobrás precisa mudar radicalmente seus métodos de operação, eliminar a influência política que permeia seu cotidiano e faz de seus funcionários submissos servos de governadores, senadores, deputados e seus partidos políticos. Ao chegar à presidência da Petrobrás, em 1999, o economista Henri Philippe Reichstul não precisou mudar a lei para transformá-la em player internacional e abrir caminho para hoje ocupar o sexto lugar entre as maiores petrolíferas do mundo em valor de mercado. Bastou engajar diretores e funcionários na concepção e execução de um plano estratégico que definiu um rumo à empresa e planejou ações para lá chegar. Isso falta à Eletrobrás.
Ali a prevalência do interesse político sobre a conduta profissional gera situações que acabam desaguando, no mínimo, no desleixo gerencial. Exemplo recente foi a recomendação da Aneel ao Ministério de Minas e Energia para tirar da Eletrobrás a administração da Conta Consumo de Combustíveis (CCC), taxa paga pela população na conta de luz e que financia combustível para as termoelétricas. “A Eletrobrás está dos dois lados do balcão: gerencia a conta e, ao mesmo tempo, é a controladora das empresas de distribuição que gozam desse benefício”, alertou o diretor-geral da Aneel, Jerson Kelman, na reunião pública da diretoria em 4 de março. O problema é que a Eletrobrás paga pelo combustível à BR Distribuidora um preço 73% superior ao preço médio pesquisado pela Agência Nacional do Petróleo. Não há preocupação em provocar concorrência para obter preços mais baixos, como costumeiramente fazem empresas que buscam eficiência financeira. Para tentar coibir essa espécie de haraquiri, em 2006 a Aneel aplicou uma multa de R$ 12 milhões, mas até hoje ela paga 73% a mais pelo combustível.
Por tudo isso a Eletrobrás tem péssimo desempenho financeiro. Em patrimônio é uma gigante: possui cinco subsidiárias geradoras, inúmeras usinas e quase o monopólio do mercado. Mas, em lucro, é medíocre. Em 2007 seu lucro foi de R$ 1,547 bilhão - só 1,96% do patrimônio, enquanto a Cemig, com patrimônio 73% menor, lucrou R$ 1,735 bilhão, e a CPFL Energia, R$ 1,643 bilhão, 33,17% do patrimônio.