Ministra Dilma Roussef, que presidente já chamou de ‘mãe do PAC, discursa em palanque no Recife
Elizabeth Lopes, Ângela Lacerda e Leonencio Nossa
A queda-de-braço entre tucanos e governistas no Congresso em torno da quebra de sigilo das despesas da Presidência subiu de tom e ganhou ontem contornos de um confronto direto entre o presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso. No Recife, Lula reagiu à carta em que o antecessor, na véspera, abriu o sigilo de seus gastos e à tentativa da oposição de convocar a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, para depor na CPI dos Cartões. “A oposição pensa que vai eleger o (meu) sucessor, mas pode tirar o cavalinho da chuva porque vamos fazer a sucessão para continuar governando este país”, afirmou em discurso, ao lado de Dilma, sua principal opção para sucedê-lo em 2010. “Se alguém pensa que vai atrapalhar o projeto de desenvolvimento, pode saber que terá de lutar e trabalhar muito. Só fazendo discursos não vai nos derrotar.”
Ao mesmo tempo, em São Paulo, Fernando Henrique voltou a cobrar a abertura dos gastos de Lula. “Se eu fosse o presidente Lula, eu diria: ‘venham ver o que eu fiz com o dinheiro, como é que foi gasto, não tem problema nenhum. Abre, mostra, é melhor’”, afirmou, após participar de conferência na Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) sobre agências reguladoras. “Não é preciso fazer dessa questão um cavalo de batalha.”
O ex-presidente lembrou que suas contas foram aprovadas pelo Tribunal de Contas da União (TCU)e considerou a inclusão dos gastos de sua gestão no âmbito da CPI “uma onda para disfarçar” o fato de que o número de cartões corporativos “foi multiplicado por dez” no atual governo e de que há um elevado volume de recursos sacados em dinheiro. “Esses são fatores concretos que deram origem à CPI, o resto é exploração política. Com relação ao passado, não tem nada determinado, é mera exploração política”, insistiu.
LEILÃO DA CESP
Em sua ofensiva, Fernando Henrique atribuiu até mesmo o fracasso do leilão da Companhia Energética de São Paulo (Cesp) ao governo Lula. “O leilão foi conduzido sob regras que não são tucanas”, ressaltou, ao ser indagado sobre o tema. “Na verdade, o problema é a estabilidade regulatória e a questão da duração das concessões (do atual governo). Não foi o governo tucano quem dificultou, foi a indefinição do governo Lula”, afirmou.
Se as declarações de Fernando Henrique vêm na seqüência da divulgação de um dossiê sobre os gastos de sua Presidência - cuja produção os tucanos atribuem ao Palácio do Planalto -, o discurso inflamado de Lula no Recife, além de responder à oposição, cumpriu o objetivo de embalar a apresentação de Dilma ao Nordeste. O presidente trabalha para viabilizar sua candidatura em 2010 e a tem chamado de “capitã do time” e “mãe do PAC” - o Programa de Aceleração do Crescimento, principal vitrine de seu segundo mandato.
Lula voltou a dizer que fará várias viagens pela região e depois percorrerá os demais Estados neste ano de eleições municipais. “Meus adversários vão dizer: ‘ele está em campanha, está em campanha’. Não estou em campanha, não, porque não posso concorrer”, disse. “Agora, se acham que vou ficar em Brasília ouvindo discursos, podem fazer quantos discursos quiserem, pois eu vou para a rua ouvir o povo, que eu ganho mais.”
FIGURINO
Depois de dizer que fez mais que o governo FHC, Lula deixou o palanque e foi abraçar simpatizantes. Deslocada, Dilma se esforçou para vestir o figurino imaginado pelo presidente e discursou para a comunidade do Jordão, um dos bairros mais pobres do Recife. “Estamos trabalhando para que, em Pernambuco, nenhum candeeiro esteja aceso até 2010”, disse, repetindo discurso tradicional de Lula nos grotões. E recebeu afagos: foi chamada de mulher “arretada” pelo ministro da Integração Nacional, Geddel Vieira Lima, e apontada como pessoa capaz de tirar projetos do papel pelo governador de Pernambuco, Eduardo Campos.
Um teste de fogo , segundo assessores, foi o momento em que uma menina do bairro foi levada até o palco. Lula beijou a criança, mas Dilma se limitou a um sorriso contido, sem se aproximar.
FRASES
Luiz Inácio Lula da Silva
Presidente
“A oposição pensa que vai eleger o (meu) sucessor, mas pode tirar o cavalinho da chuva porque vamos fazer a sucessão para continuar governando este país”
“Se alguém pensa que vai atrapalhar o projeto de desenvolvimento, terá de lutar e trabalhar muito. Só fazendo discursos não vai nos derrotar”
Fernando Henrique Cardoso
Ex-presidente
“Se eu fosse o presidente Lula, eu diria: ‘venham ver o que eu fiz com o dinheiro, como foi gasto. Não tem problema nenhum’”