Entrevista:O Estado inteligente

quarta-feira, março 26, 2008

Celso Ming - Trégua nos mercados



O Estado de S. Paulo
26/3/2008

O mercado financeiro global teve dois dias de trégua ou de redefinição dos refúgios da riqueza. É um bom momento para perguntar para onde vai, no meio desta crise, o dinheiro mundial.

A tabela ao lado dá uma idéia do tamanho do mercado financeiro planetário em outubro de 2007. Os grandes bancos talvez trabalhem com dados mais atualizados. Mas, em tempos de crise e de destruição de riqueza financeira, ninguém deve ter números muito mais confiáveis.

Há algumas semanas, o crítico Nouriel Roubini fez lá seus levantamentos e descreveu uma paisagem de Juízo Final: somente o mercado de moradias nos Estados Unidos reduziu ou irá reduzir a cinzas patrimônios entre US$ 4 trilhões e US$ 6 trilhões. No mercado de crédito hipotecário, o calote dos mutuários pode subir a US$ 1 trilhão. Os títulos garantidos pelas seguradoras de bônus perderão US$ 150 bilhões. No sistema financeiro americano, os prejuízos podem passar de US$ 1 trilhão... E por aí vai.

Apesar dessa planície tomada por ruínas fumegantes, o volume de recursos que ferve pelos mercados é bem maior do que era há nove meses. De lá para cá, os bancos centrais injetaram soro nas veias dos bancos, os juros caíram nos Estados Unidos. São mais recursos circulando.

Se antes da crise havia uma dinheirama que procurava aplicação confiável e rentável, hoje há ainda mais porque, apesar do bloqueio do crédito, a liquidez à procura de um canto atraente e seguro é bem maior.

E, afinal, como se acomodará essa riqueza tão nervosa? Por um bom tempo os aplicadores esquecerão o mercado americano de hipotecas e adjacências que tanto trauma provocou nos últimos meses. Como sempre ocorre em tempos de crise, por reflexo condicionado, eles se refugiarão nos títulos do Tesouro americano (treasuries). Mas lá não estarão felizes. Os juros nos Estados Unidos já são negativos; não compensam nem a inflação que corrói o dólar. Afora isso, os treasuries estão em dólares e o dólar vai derretendo nos mercados.

Há o ouro, os títulos em outras moedas e as aplicações em moedas (currencies). Mas esse é um universo limitado para tantos recursos soltos pelo mundo. Isso explica por que fundos de hedge e de investimento e carteiras de patrimônio buscam algum calor nas ações e nas commodities.

Por falar em ações, é preciso puxar pela memória. Esta crise está sendo pintada com as cores do apocalipse, mas os analistas parecem ignorar que, apesar do que ocorreu com o patrimônio dos grandes bancos, as perdas nas bolsas americanas em conseqüência desta crise vêm sendo substancialmente menores do que as de 2000/2001, no estouro da bolha das empresas pontocom. Naqueles meses, a Bolsa de Nova York (Nyse) mergulhou 30% e a Nasdaq, 72%. Nestes quase dez meses de duração (de 1º de junho até ontem) desta devastadora crise subprime, a Nyse recuou dos 13.668 para 12.532 pontos, queda de 8,3%; e a Nasdaq, de 2.613 para 2.341 pontos, queda de 10,4%. É um estrago ínfimo para quem acompanha os horrores descritos por Roubini.

São considerações assim que podem explicar por que acontecem tréguas ou movimentos tão diferentes como nos dois últimos dias.

Confira

Vendedor de mico - O fracasso do leilão da Cesp não mostra apenas que o governador José Serra não avaliou o risco regulatório da operação.

Mostra que tentou empurrar um mau negócio para o comprador: nada menos que 67% do potencial gerador da Cesp está com concessão federal próxima do vencimento, que a lei proíbe renovar.

O leilão mostra também as precárias condições de produção de energia no País. Sem garantia de concessão, geradoras e transportadoras não podem se planejar. Não conseguem sequer financiamento.

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