O prisioneiro cinco estrelas
Boa, muito boa, boa mesmo foi a vida de Salvatore Cacciola enquanto mandou e desmandou no comando do Banco Marka. Até que crise cambial de 1999 secasse a catarata de lucros, esse italiano naturalizado brasileiro freqüentou o circuito dos bilionários com a desenvoltura dos condenados ao êxito. E bem acompanhado, como recomenda o código de conduta dos cinqüentões endinheirados.
Ao lado da segunda mulher, a jovem e bela gaúcha Adriana Alves de Oliveira, o banqueiro em ascensão exibia o meio-sorriso superior de quem iria passar a noite com a Miss Brasil 1981. Ela tinha o sorriso conformado de quem não sofre erupções de entusiasmo quando confrontada com a idéia de varar a madrugada em companhia de um cifrão.
Nove anos depois da derrocada, as coisas mudaram muito para Cacciola. Além do banco, Adriana, perdeu uma filha, perdeu a liberdade (recuperada com o patrocínio do STF, mas novamente confiscada), perdeu o título de sócio do clube dos bilionários. Mas continua colecionando privilégios desconcertantes, souberam na segunda-feira os leitores da coluna de Monica Bergamo na Folha de S.Paulo.
A jornalista contou como foi a visita dos advogados de Cacciola ao cliente hospedado desde 15 de setembro numa cadeia em Mônaco, e como é o cotidiano do fugitivo capturado pela Interpol. A Justiça ainda não decidiu se deve extraditá-lo para o Brasil (onde deixou um rombo de R$ 1,6 bilhão) ou devolvê-lo à Itália, que também o quer.
Enquanto espera, Cacciola desfruta de regalias que o transformam em forte candidato ao título de preso mais bem tratado do mundo. Não foi assim nos primeiros dias. Sem chance de refestelar-se no apartamento reservado num hotel de luxo, teve de conformar-se com um cubículo de seis metros quadrados e sem banheiro privativo.
As coisas melhoraram muito para o hóspede involuntário da Maison D'Arrêt. Localizada no centro histórico de Mônaco, a prisão com nome de hotel parece mesmo um hotel. "Fumantes ou não fumantes?", perguntaram os cavalheiros da carceragem aos advogados Carlos e Guilherme Eluf antes da escolha da sala para a reunião com o cliente.
"Os funcionários são muito gentis, dispensam um tratamento bastante digno ao preso", impressionaram-se os Eluf. À saída, pareciam ansiosos por sugerirem a amigos em visita ao principado que se hospedem na Maison D'Arrêt. A sugestão seria certamente avalizada por Cacciola, que recebeu a dupla de bacharéis fantasiado de turista: moletom azul-marinho, camiseta branca ("de boa qualidade", sublinha), tênis e meias esportivas.
Tem livre acesso à biblioteca e à sala reservada a fisioterapia e ginástica, contou aos advogados. "Ocupo um cargo com banheiro próprio e frigobar", animou-se. Está liberado para comprar jornais e revistas, ou para encomendar refeições a qualquer restaurante. Mas raramente se vale de tal privilégio.
"A comida da Maison d´Arrêt é superior à dos melhores restaurantes de São Paulo", compara. As despesas são descontadas da sua conta bancária, que espera engordar espetacularmente com "uma ação bilionária" movida contra o governo brasileiro. "Tenho direito à liberdade e à indenização", repete. A terceira mulher, isso já conseguiu. Também é jovem. E muito bonita.
Cabôco Perguntadô
Depois de ter passado duas horas agitando na mesa do botequim uma bandeirinha do Brasil, comprada para festejar os dois gols de placa marcados por Lula no confronto telefônico com George Bush, o Cabôco foi assaltado pela suspeita de que o acesso de fervor patriótico o induzira a embarcar numa tremenda bravata. Lula não sabe nada de inglês, certo? Bush não sabe nada de português, certo? Portanto, todas as frases do diálogo – se é que houve algum – foram ditas por um intérprete, geralmente escalado pelo Itamaraty. Alguém aí acredita que algum intérprete tenha repassado sem retoques aquela bronca tremenda ? E tratado Bush com o informalíssimo "meu filho" que Lula jura ter usado?
O advento do Interino de Deus
Que Lula foi escolhido por Deus para salvar o país da danação eterna, disso o país já sabia. Sabia também que o Pai dos Pobres sempre conversou com freqüência e desembaraço com o Pai de Todas as Coisas. E sabia que, depois de proclamar-se o maior governante dos últimos 500 anos, o ouvinte atento ficou bastante loquaz. E hoje fala mais que o Parceiro.
Mas só na quinta-feira, ao ouvir o Sermão do Recife, o Brasil descobriu que o Criador e a criatura se tornaram tão afinados que, quando falta tempo ao titular, Lula assume o cargo interinamente. O mistério da Santíssima Trindade ganhou um quarto elemento. Havia o Pai, o Filho e o Espírito Santo. Agora há o Interino, que cuida do mundo, absolve, condena. E já começa a fazer milagres.
"A multiplicação dos pães de que Cristo falava é justamente essa que vem fazendo o Bolsa Família", ensinou o Interino. Ao localizar na multidão de devotos o pecador Severino Cavalcanti, decidiu premiá-lo com uma passagem para o céu. Absolvido o conterrâneo, contou ter ameaçado George Bush, pelo telefone, com o fogo do inferno. "O problema é o seguinte, meu filho", jurou ter dito ao ouvir o hello do colega. "Nós ficamos 26 anos sem crescer. Agora que a gente está crescendo, vocês vêm atrapalhar. Resolve a tua crise".
Só não pegou ainda mais pesado porque mesmo um Interino de Deus tem dúvidas a resolver. Lula ainda não sabe, por exemplo, o tamanho da crise americana. "Pode ser menor do que a gente acha", avisou. "Mas pode ser maior".
Deve ser culpa de José Serra
Entre janeiro e setembro, a epidemia de dengue que mataria 150 brasileiros até o fim de 2002 registrou 385.140 casos de contaminação. E feriu de morte a candidatura presidencial de José Serra, estigmatizado como "o ministro da dengue", nos debates transmitidos pela TV, pelos concorrentes Lula e Ciro Gomes.
Entre janeiro e setembro de 2007, que mataria 158 brasileiros até o fim do ano, registrou 438.949 casos de contaminação. Nestes três meses, só no Rio ocorreram 48 mortes. A multidão de contaminados incorpora mais quatro a cada dia. . Ninguém chama de "ministro da dengue" José Temporão, nomeado por Lula para cuidar de um sistema de saúde "próximo da perfeição".
A verdade está naquele cofre
Sem ter apresentado ao país qualquer obra física relevante, sem ter produzido uma só mudança notável na máquina administrativa federal, sem ter incluído no currículo uma única façanha, a ministra Dilma Rousseff, chefe do Gabinete Civil, exibe com justificado orgulho dois troféus muito cobiçados. Ganhou-os sem entrar em campo.. O primeiro homenageia a gerente incomparável, a chefe hiperativa e tão durona que virou a Mãe do PAC. O outro celebra a supercampeã do planejamento, capaz de remoçar velharias com a destreza de um Ivo Pitanguy.
Para evitar que o Brasil se interesse pela história guardada naquele outro, Dilma prefere deixar os troféus fora do cofre.