Com o crescimento da economia e do consumo de energia, as distribuidoras elétricas privadas comemoraram em 2007 o melhor ano desde que se instalaram no Brasil, no final dos anos 90. Segundo levantamento do jornal Valor Econômico, o lucro de 17 delas somou R$ 11,9 bilhões, 35% acima do resultado de 2006. E o que aconteceu com as sete estatais administradas pela Eletrobrás? Justamente o inverso. Seus prejuízos somaram R$ 1,172 bilhão, com assustador crescimento de 49,7% em relação a 2006.
Mas o pior da notícia vem agora, caro leitor. Desde 2001 quem paga o prejuízo dessas empresas somos todos nós, brasileiros, ricos e pobres, com dinheiro de uma taxa cobrada na conta de luz e cuja arrecadação chegará a R$ 3 bilhões em 2008. Dessa cifra, R$ 2,5 bilhões são transferidos para cobrir prejuízos e subsidiar a operação dessas sete empresas e mais uma oitava, pertencente ao governo do Amapá. Mas por que as empresas privadas estão em festa e as estatais em luto, surrupiando dinheiro da população para sobreviver?
Elas já foram estaduais - como outras, depois privatizadas - e hoje estão sob o guarda-chuva da Eletrobrás. Distribuem energia em Rondônia, Acre, Alagoas, Piauí, Boa Vista, Manaus e no interior do Amazonas. A CEA, do Amapá, continua em poder do Estado por influência e poder do senador desse Estado, José Sarney (PMDB-AP), que tentou e não conseguiu fazer o mesmo com a Cemar, do Maranhão. Vendida para o Grupo Equatorial Energia, a Cemar saiu de elevados e crônicos prejuízos para registrar lucro de R$ 180 milhões no ano passado.
O péssimo desempenho dessas empresas decorre de sua histórica submissão ao poder político local. Ali mandam e desmandam governadores, senadores e deputados com suas barganhas políticas, perdão de dívidas de prefeituras em troca de apoio de prefeitos em eleições, da não cobrança de faturas de consumo de energia de amigos e de grandes empresas, convertidas em doações para campanha eleitoral. E outros favores que atrofiam, endividam e depredam o faturamento das empresas. Os diretores são escolhidos a dedo por governadores e políticos, que as lotam de apadrinhados, muitas vezes sem função alguma. Tudo ali é armado para as empresas servirem não à população local, mas às elites e a seus partidos políticos. Transferi-las para a Eletrobrás foi uma tentativa de amenizar o problema, mas eles continuam reinando por meio do ministro de Minas e Energia e de dirigentes da Eletrobrás e de subsidiárias (Eletronorte, Chesf, Furnas e Eletrosul), que eles tratam de indicar, tendo o governo federal por cúmplice. Como na recente e excitante disputa entre PT e PMDB por cargos de direção nas estatais federais.
Comparando o desempenho da Cemar (que atende ao Maranhão, região mais pobre do País) depois de privatizada com duas das sete estatais se conclui que a única solução é tirá-las do poder de influência das elites políticas e vendê-las a grupos privados. Enquanto a Cemar registrou lucro líquido de R$ 180 milhões em 2007, a Manaus Energia, que abastece só a capital do Amazonas, mais do que dobrou seu prejuízo de R$ 249,5 milhões, em 2006, para R$ 544,4 milhões, em 2007. E a Ceam, que atende a população do interior desse Estado, não ficou atrás: seu prejuízo cresceu de R$ 283,5 milhões para R$ 464,53 milhões entre 2006 e 2007. E isso num ano excepcional para o setor elétrico, em que todas as empresas privadas esbanjaram lucros. Até quando a população vai seguir sustentando a má gestão, as extravagâncias e os desvarios dos aventureiros políticos?
Embora indicado por José Sarney, o novo presidente da Eletrobrás, José Antonio Muniz, tem experiência no setor elétrico e por sete anos foi presidente da Eletronorte. Ele conhece bem o uso político dessas empresas e disse a esta articulista que vai intervir para consertá-las. Revelou que seu plano é administrar as sete com uma única diretoria, sediada no Rio de Janeiro - “longe das influências políticas locais”, diz ele -, e contratar uma consultoria privada para arquitetar um plano estratégico. “A decisão não é privatizá-las, mas ter uma gestão técnica e qualificada, seguindo regras de boa governança”, tenta convencer. A do Amapá - onde a situação é tão caótica que a Aneel pediu a caducidade da concessão até hoje não aceita pelo ministro Edson Lobão, amigo de Sarney - ele garante que cobrará a enorme dívida com a Eletronorte, esquecendo que o maior defensor de nada mudar na empresa é justamente seu padrinho político, José Sarney.
Entrevista:O Estado inteligente
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domingo, março 30, 2008
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