O salto sumiu Na corrida pelo mais inusitado, estilista cria
Apoiada nos dedos, com o calcanhar nas alturas, a mulher caminha com o ar de poder e sensualidade que o salto alto lhe confere. Quem não usa, ou usa pouco, se pergunta como alguém se dispõe, por livre e espontânea vontade, a passar horas equilibrando-se em tão precária base. Pois os que consideram o salto agulha e as plataformas uma temeridade ainda não viram nada. Tendo nos acessórios a sua inesgotável fonte de renda, e sendo os sapatos um artigo ainda pouco explorado, o mundo da moda, nas últimas temporadas de desfile, tem ousado tanto na busca do inusitado que atingiu o impensável: o sapato alto sem salto. Isso mesmo: no grupo B dos estilistas que desfilam duas vezes por ano em Paris, o inglês Antonio Berardi, 39 anos, fez suas modelos caminhar na passarela em botas com o calcanhar pairando no ar, a 14 centímetros do solo. "Chegamos ao limite: o sapato que segura apenas o que precisa ser segurado", disse Berardi a VEJA, em tom de orgulho.
Os especialistas desconfiam. "A sola sustenta o pé, mas o salto tem papel importante no equilíbrio, evitando que se caia para trás", diz Jefferson Pereira, que há doze anos desenvolve sapatos para a marca Schutz, do Rio Grande do Sul. "A pessoa não deve andar do mesmo jeito que com um sapato com salto." Salto, simplesmente, porém, não é garantia de equilíbrio. Em seu último desfile em Paris, a platéia de outro inglês, Alexander McQueen – este do time A –, prendeu a respiração quando a oscilante modelo atravessou a passarela, evidentemente pouco à vontade, num sapato de dois saltos e inspiração oriental. Já no da Yves Saint Laurent, sapatos de salto agulha em que a sola era uma fina tira de metal (a tal "alma de aço" exposta ao público em sua mais reduzida versão) davam a impressão de que as moças andavam na corda bamba. Nina Ricci construiu saltos na forma de garras; Chloé criou triângulos invertidos, no formato do dente de tubarão dos desenhos animados. A diferença entre essas extravagâncias e o sapato alto sem salto de Berardi é que o dele já aceita encomendas e tem lista de espera de cinco semanas. O de couro preto custa 2.000 euros (5.300 reais); o de pele de cobra, 3.000 euros (8.000 reais), e Victoria Beckham já encomendou um par.
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