PANORAMA ECONÔMICO |
O Globo |
14/3/2008 |
O Brasil sempre teve juros altos demais. Para manter a inflação controlada, a dose do remédio aqui foi mais alta que em outros países. E hoje, mesmo que os tempos sejam outros, com a alta de preços sob controle, esta seqüela de um país que conviveu com a superinflação por 30 anos se manteve. Com esse histórico, a ata do Copom assustou: por ela, ficou-se sabendo que os juros devem voltar a subir. Mas será mesmo necessário - e eficaz - subir ainda mais os juros brasileiros? Na última reunião do Copom, na semana passada, o Brasil voltou ao topo de um ranking indesejável, o de maior juro real do mundo. Considerando a taxa nominal, descontada a expectativa de inflação para os próximos 12 meses, estamos na liderança, segundo um levantamento da Uptrend Consultoria, com juros de 6,7%. Logo atrás vem a Turquia, também com 6,7%, e bem depois a Austrália, com 4,9%. Na classificação pela taxa nominal, somos os terceiros, estamos atrás de Venezuela e Turquia, mas ambas registram inflação mais alta que a nossa. É inegável que o Brasil tem atualmente juros bem mais baixos que outrora. Para lembrar, em setembro de 2005, por exemplo, o país também liderava a lista, mas, na época, estava com juro real de 11%. Em abril de 2007, ainda na dianteira, já estava a 8,5%. De fato, o número de agora é bem menor, mas comparando-o com o de outros países, nada mudou: nosso juro real continua o mais alto. Com a inflação subindo mundo afora, esta tendência de baixa pode até começar a mudar, mas, por enquanto, pelo menos aqui no Brasil, a inflação continua sob controle. No primeiro trimestre do ano, ela veio, inclusive, abaixo da expectativa de muitas pessoas no mercado. A alta de preços desacelerou, mas, mesmo assim, a ata do Copom de março piorou o tom em relação à de janeiro. O Banco Central valorizou mais o aumento do consumo do que a boa notícia da inflação. O BC demonstrou na ata excessiva preocupação com a pressão da demanda. Tanto que chegou a cogitar aumentar os juros já nesta última reunião; e não descartou fazê-lo em breve. Paulo Tenani, chefe de pesquisa do UBS Wealth Management, é um crítico desta atual política de juros. Segundo ele, o que ocorre no Brasil é que, com taxas muito altas por muito tempo, a parte da demanda que é sensível a um aumento de juros de 0,25 ponto percentual ou mesmo 0,50 p.p. é muito baixa. Ou seja, pequenos aumentos teriam muito pouco impacto para reduzir a pressão na demanda que, segundo o BC, é o que tem preocupado. - No Brasil, é diferente do que acontece na Europa. Aqui uma alta pequena não surte efeito a não ser no câmbio. Uma mudança assim tem pouquíssimo efeito, por exemplo, no consumo de bens duráveis - diz ele. Tenani acredita que uma alta dos juros pode funcionar, sim, para conter a inflação, mas de uma forma indireta. Quando eles sobem, normalmente, atraem mais dólares, que andam migrando pelo mundo atrás de maior rentabilidade (a taxa dos Estados Unidos está em apenas 3%). Assim, a moeda americana acaba caindo e derrubando a inflação. - O Banco Central brasileiro tem sido extremamente conservador. Deve ser por causa do passado de hiperinflação. Mas ele acaba agindo mesmo é sobre o câmbio. Seria mais eficiente se estivesse atuando, por exemplo, junto à Fazenda, na redução de gastos, isso ajudaria a conter a inflação. Atuar na política fiscal poderia dar mais resultado agora - defende Paulo Tenani. O professor Rubens Penha Cysne, da EPGE/FGV, tem visão semelhante: - Melhor que subir os juros agora para controlar a inflação seria agir em outros campos, como o fiscal, junto à Fazenda. O perigo de subir juros é que isso tira não só o oxigênio da inflação, mas também dos investimentos, que ainda são baixos no país, e das exportações líquidas - diz. Paulo Tenani chama a atenção também para o fato de que, quanto maiores forem os juros, mais dificuldade o governo terá para conter o derretimento do dólar; mesmo diante das medidas anunciadas. Gustavo Loyola, ex-presidente do Banco Central, acredita que há mais chances de o Copom subir os juros no curto prazo que mantê-los como estão. Pessoalmente, não acha que os juros devam ser aumentados. Ele reconhece que o tom da ata piorou, principalmente porque os integrantes do Comitê admitiram ter discutido a hipótese de aumentar os juros. Conversei com ele logo após a divulgação do documento do Copom e uma das coisas que me disse foi que o tom mais forte da ata poderia ser uma forma de levar o próprio mercado a ajustar os juros para cima. Com isso, não seria preciso o Banco Central elevar a Selic. E, ao fim do dia, foi realmente isso que se viu. Os juros futuros fecharam com forte alta ontem. Luis Fernando Lopes, do Pátria Investimentos, está mais preocupado. Ele diz que a inflação está fugindo do centro da meta e que há um desequilíbrio entre oferta e demanda, com o consumo das famílias crescendo forte demais. Assim, acredita que o BC não vai ter como fugir de uma alta na Selic até o fim de 2008: - A discrepância histórica dos juros no Brasil não vai mudar este ano - conclui. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, março 14, 2008
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