Entrevista:O Estado inteligente

sexta-feira, março 21, 2008

Dora Kramer Síndrome do favoritismo

Luiz Inácio da Silva e Leonel Brizola já viveram o drama, que poderia ser chamado de síndrome do favoritismo antecipado: candidato a presidente que larga na frente muito antes da campanha, mobiliza as forças contrárias e a vantagem acaba funcionando como desvantagem.

A possibilidade de um dos dois, Lula ou Brizola, ganhar as eleições na década final do século passado, derrubou o parlamentarismo, o mandato presidencial de cinco anos e fez nascer a reeleição.

Mal comparando e ressalvadas as abissais diferenças de tempos e circunstâncias, o governador de São Paulo, José Serra, está sentado naquela mesma berlinda do favorito. É alvo ao mesmo tempo de dois fogos. O amigo, cujas chamas são lançadas de dentro de seu partido, o PSDB, e o inimigo propriamente dito arde no PT.

A estratégia do silêncio máximo e da mobilidade mínima adotada por Serra para ver se escapava ao bombardeio pré-eleitoral não deu certo. Ele acreditou que ficando quieto em público e oficialmente dedicado só à administração do Estado, estaria preservado até o início de fato do processo sucessório.

Ocorre que "os russos" não entenderam assim as regras do combinado e trataram de pôr seus blocos na rua com dois anos de antecedência e um objetivo comum: torpedear o primeiro colocado nas pesquisas.

Sem candidato, o presidente Luiz Inácio da Silva começou a campanha da própria sucessão de olho nos candidatos do adversário, os governadores de São Paulo e de Minas Gerais, Aécio Neves.

No primeiro, enxergou o perigo real da derrota no projeto de fazer o sucessor ou, pelo menos, de não ver eleito um político a ele completamente antagônico.

No segundo, viu a possibilidade de semear a discórdia no campo adversário, tentar interferir no curso das águas e de alguma maneira desviá-las para seu usufruto.

Assim, já enviou recados ao governador Aécio Neves dizendo que, se ele quiser, mude de partido e terá o apoio para se candidatar. Incentiva Ciro Gomes, cujo ódio a Serra (recíproco) certamente o fará porta-voz de pesados ataques na campanha e patrocina entre os aliados de seu governo a montagem de uma verdadeira armada contra o tucano de São Paulo.

Em 2006 já havia sido assim, quando governistas disseminavam a versão de que Geraldo Alckmin seria o candidato mais ameaçador à reeleição de Lula, enquanto torciam para que o escolhido não fosse José Serra.

Como para 2010 a coisa começou a parecer consolidada muito antes do tempo, o contra-ataque também foi antecipado, embora não seja ainda explicitado.

Internamente no PSDB dá-se movimento semelhante. O partido tem pesquisas mostrando a preferência de Serra até entre o eleitorado hoje fiel ao presidente Lula, mas, à exceção do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, não há um só cardeal tucano que não diga que Serra, antes de "querer", precisa "saber" ser candidato. Equivale a dizer que deve sorrir, abraçar, receber, falar, visitar, discursar, lavar, passar e costurar.

Resumindo: fazer como faz Aécio Neves.

Só que, para isso - e aí vemos como é difícil a vida de um favorito - teria de abandonar sua personalidade e virar um arremedo de quem com ele tenta ficar ombro a ombro mostrando-se como contraponto.

Cena

A oposição já está decidida a dar um fim na CPI dos Cartões Corporativos. Enquanto aguarda o momento ideal para atribuir o fracasso ao governo, vai ameaçando sair se a bancada governista não levar a sério a investigação.

A verdade é que os oposicionistas não agüentam mais CPIs e reconhecem que a dos Cartões foi uma jogada mal sucedida.

O último esgar investigativo será feito na CPI das ONGs com a apresentação de um relatório de irregularidades nos convênios do Ministério da Reforma Agrária, que está sendo preparado pelo PSDB.

No pé

Até o dia da votação da MP da TV pública, ninguém acreditava que prosperassem os esforços dos presidentes da Câmara e do Senado em prol da mudança no rito das medidas provisórias. Quando resolveu obstruir todas as votações, nem a oposição tinha, como ainda não tem, uma posição a respeito das mudanças que considera adequadas. Há uma ala do tucanato, por exemplo, que acha melhor deixar tudo como está para ver como é que fica depois de 2010.

Por uma dessas armadilhas que o destino reserva aos abusos da esperteza, o assunto "pegou" a partir do momento em que o governo resolveu extrapolar do direito de manipular as MPs, e o líder no Senado, Romero Jucá, advogou contra uma medida da qual ele mesmo era relator só para abrir caminho à aprovação da TV pública.

Ao forçar Jucá a trocar a habilidade pela ferocidade no trato congressual, o Planalto acabou criando uma agenda negativa em que, depois da aprovação do Orçamento, nada mais de importante haveria a tratar.

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