Entrevista:O Estado inteligente

sábado, março 22, 2008

Dora Kramer Por conta do Bonifácio

O MST e suas variações campesinas não têm hoje nem de longe a importância que já tiveram quando eram vistos como a encarnação do bem na luta dos desvalidos por justiça social. Impunham medo ao poder público, que não queria ser o algoz dos oprimidos.

Faziam sucesso nas pesquisas de opinião, eram convidados de honra nos ambientes bem pensantes, chegaram mesmo a exercer certa influência no cenário político. Chegou-se a cogitar que fundariam um partido, ao molde da trajetória do movimento sindical renascentista que resultou no PT.

Com o passar do tempo, o recrudescimento das ações meramente ilegais e a desconexão destas com qualquer coisa parecida com reforma agrária - cujo sentido de anacronismo também foi se tornando óbvio -, o movimento perdeu o encanto revolucionário, passou a ser visto como um ajuntamento de malfeitores.

Hoje não conta mais como ator político, em boa medida porque o governo Luiz Inácio da Silva adotou a estratégia de deixar o MST e adjacências falando sozinhos, sem estabelecer com eles nenhuma interlocução oficial nem para repreender nem para apoiar suas ações.

Seria uma boa idéia se por trás dela não estivessem objetivos pragmáticos que dependiam primordialmente da tolerância absoluta com toda e qualquer ilegalidade.

Parceiros quando os tempos eram de oposição, PT e MST ficaram tacitamente entendidos: um não criaria mais problemas para o outro.

Assim, Lula e o PT livraram-se de uma assombração político-eleitoral e os bandoleiros ficaram definitivamente livres para dar curso a invasões, depredações, interdições, agressões sem nenhum tipo de óbice e ainda contando com verbas federais para seu sustento.

No começo do primeiro mandato, o MST ainda era um fator de constrangimento. Os recém-empossados no poder mantinham as aparências.

Um ou outro condenava a "violência", ainda que o presidente tratasse esse pessoal com a deferência de um movimento social perfeitamente legítimo e legal, recebendo seus chefes no Palácio do Planalto.

Devagar, a simpatia explícita foi cedendo lugar à indiferença. Aparteou-se do problema e conseguiu transmitir a sensação de que esse negócio de invasões "faz parte" da administração geral das carências nacionais.

Há muito nem o presidente, nem ninguém no governo, considera mais necessário se pronunciar sobre as ações, por mais agressivas que sejam ao Estado como instituição da coletividade (e não instituto de propriedade partidária) e ao direito da sociedade de viver num País onde se respeitam as leis.

Os sem-terra fazem o que querem, o Estado dá de ombros e os agredidos que procurem seus direitos na Justiça. Esta tem reiterado a existência de uma situação de ilegalidades em série.

Quando encontra brecha manda prender um, multa outro, mas seu poder é limitado. E até debochado, como fez agora João Pedro Stédile ao receber com escárnio - "uma idiotice" - a fixação de multa de R$ 5 mil por ato de vandalismo que venha a "incitar e promover" contra instalações da Vale, antiga do Rio Doce.

A mineradora reagiu dando às coisas os nomes que elas têm. Denunciou o "banditismo" e chamou atenção para o "constante desrespeito ao Estado de Direito". Mas a maioria não reage. Rende-se ao clima de conformidade, difundido pela inércia do poder público.

Este parece considerar que, se ficar quieto, esvazia a repercussão das invasões. O problema é que só o governo enquanto força político-partidária tem a ganhar com isso e não mede outras conseqüências, só pesa o benefício em causa própria.

Os agredidos ficam largados à própria sorte como se a inviolabilidade de seus territórios não fosse uma questão de Estado. A ser tratada com o mesmo rigor legalista com que o governo brasileiro soube reagir à invasão do Equador pela Colômbia, não obstante tenha calado sobre a agressão das Farc às fronteiras colombianas.

Cada um, empresa ou cidadão, é soberano no seu direito à propriedade, cuja preservação o governo tem o dever de garantir de maneira igual para todos.

Quando não faz isso por esperteza, para fugir de um embate que possa lhe ser politicamente inconveniente, o governante falta ao País. Peca por omissão e deliberadamente quebra o juramento feito na posse, de servir a um só senhor: os ditames da Constituição.

Efeito colateral

Amigos de fé do governador de Minas Gerais no PSDB começam a se sentir no dever de avisar a ele que conviria, a bem da convivência e da prosperidade do apoio interno a seus projetos futuros, que desmentisse com mais contundência as versões de que pode deixar o partido.

Há compreensão em relação ao movimento de Aécio Neves para se fortalecer perante José Serra. Mas há também um sentimento de que deve ir devagar com o andor e tomar cuidado para não dar ao PSDB a imagem de legenda descartável.

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