O Estado de S. Paulo |
15/2/2008 |
O caso dos cartões corporativos ainda está longe de esfriar, o governo reconheceu que falhou na fiscalização, anunciou medidas para restringir abusos e já ficamos sabendo de mais dois episódios típicos de descontrole com gastos oficiais. Dois altos funcionários, o ministro dos Portos, Pedro Brito, e o secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Machado, trocaram de cargos, receberam auxílio para pagar as respectivas mudanças para seus Estados de origem, continuaram trabalhando em Brasília, embolsaram o dinheiro e, com o aval da administração pública, acham tudo muito natural. Cumpre registrar a título de parênteses: ambos os remanejamentos ocorreram não por conta de aperfeiçoamentos administrativos, mas para abrir espaço à acomodação fisiológica de 2007 apelidada de reforma ministerial. Brito cedeu o lugar na Integração Nacional ao PMDB e assumiu a indispensável pasta dos Portos, criada para atender à cota do PSB. Machado saiu da Previdência para abrir vaga ao presidente da CUT, Luiz Marinho, cuja realização mais vistosa até agora é conferir a invasores de terra o direito de contar tempo de aposentadoria. Prossigamos. Nelson Machado cumpriu um interregno de 20 dias entre um cargo e outro passando, como ele diz, as “férias” em São Paulo. Recebeu por isso R$ 18 mil, porque a lei que lhe dá o direito a uma verba para as despesas de mudança para o Estado de origem. Ele não mudou, mas ganhou o dinheiro, e se considera “convicto” da correção do ato. E ainda ensina: “É preciso esclarecer bem o conceito de mudança. A legislação diz que existe direito a ajuda de custo para mudança, transporte, viagens e etc. Isso eu fiz, fui embora daqui (de Brasília)”. Realmente, foi, mas o que ele chama de “mudança, transporte, viagens” resume-se ao pagamento de duas passagens de avião. Uma de ida, outra de volta. Coisa de R$ 1.000, na mais dispendiosa das hipóteses. E os outros R$ 17 mil? Embolsou. É pouco? Pode até ser, mas a questão não é o quanto se gasta do dinheiro público, mas o uso que se faz dele e os métodos que caracterizam o abuso. É como a tapioca de R$ 8,30 paga pelo ministro dos Esportes com cartão corporativo: não é o valor, mas o sentido de apropriação privada de um bem público. Passemos a Pedro Brito. Em março de 2007, deixou a Integração Nacional, voltou para Fortaleza e dois meses depois estava em Brasília de novo para assumir os Portos. Pediu R$ 8.300 de auxílio para cada mudança e não mudou. Como tem um flat em Brasília e a família mora no Ceará, limitou-se a transportar a si mesmo, gastando, no máximo, os mesmos R$ 1.000 do colega Machado. E os outros R$ 15.600? Gastou no táxi? Ou aplicou no sistema Matilde de locação de veículos? O destino não importa. O problema está na origem e na facilidade com que sai dinheiro dos cofres oficiais sem a menor preocupação com controle. Desse jeito, não há medida restritiva que dê jeito. Não se sabe se por falta de estrutura ou omissão proposital de orientação para que atuem com rigor, fato é que os instrumentos de fiscalização não funcionam. O controle externo é exercido pela imprensa, mas o interno simplesmente não se dá a conhecer. Nesses e em outros tantos casos como, por exemplo, o de liberações irregulares de emendas parlamentares e frouxidão perniciosa na execução de convênios. Casos assim ocorrem cotidianamente sem haja sinal de inquietação, a não ser enquanto estão sendo alvo do noticiário. O governo fala de fechar portas arrombadas, mas não se mexe para mantê-las trancadas. Melhor de três De um ano para cá, o tucanato já patrocinou três acordos sobre os quais teve de se explicar. O primeiro, em janeiro de 2007, elegeu Arlindo Chinaglia presidente da Câmara. Deu certo. O segundo, nos últimos meses do ano passado, quase resultou na aprovação da CPMF. Deu errado. O terceiro, para a criação da CPI dos Cartões excluindo das investigações Lula e Fernando Henrique, desandou, desempatando o placar saia-justa para 2 tentativas e 1 gol contra. Casa de lobby O reitor Timothy Mulholland deixou a cobertura montada pela UnB. Pode devolver o dinheiro gasto, como exige o Ministério Público. Pode até continuar no cargo por conta da apatia de um movimento estudantil pelego como nunca se viu. Mas o apartamento onde até lixo é de luxo continuará lá, servindo para “atividades de representação” da universidade, inaugurando, assim, o instituto da casa de lobby acadêmica. A prática, outrora muito comum em Brasília, foi aos poucos sendo abandonada pelas grandes empresas. Ressuscitou com a República de Ribeirão Preto, derrubou um ministro, e agora eterniza-se como um monumento ao desperdício das verbas que deveriam ser destinadas à educação. |
Entrevista:O Estado inteligente
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sexta-feira, fevereiro 15, 2008
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