Entrevista:O Estado inteligente

sábado, fevereiro 09, 2008

Dólar Lojas de Nova York já aceitam o euro

Economia
Do Golfo Pérsico a Nova York

Desvalorizado, o dólar perde adeptos entre
países árabes e até em lojas de Manhattan


Giuliano Guandalini

Hashim/Getty Images
Shopping no aeroporto de Doha, a capital do Catar: dólar fraco encarece os importados

Desde 1975, o Catar, uma península do Golfo Pérsico com menos de 1 milhão de habitantes, possui um sistema monetário de paridade em relação ao dólar. Por meio dele, o rial, a moeda local, acompanha automaticamente a variação do dólar. Tudo caminhava bem, até que a cotação da moeda americana começou a afundar, trazendo contratempos para a economia do emirado. Como vive das exportações de petróleo e gás natural, o Catar praticamente importa todos os bens de consumo comercializados. Com o mergulho da divisa americana, o rial também ficou mais fraco, elevando drasticamente o preço local dos produtos vindos de fora. Não deu outra: a inflação disparou para 15% ao ano, e, para contê-la, o país anunciou que estuda abandonar o dólar como referência. O emirado poderá seguir o exemplo do Kuwait, que, no ano passado, passou a atrelar a cotação de sua moeda, o dinar, a uma cesta de outras moedas, entre elas o euro – o dinheiro preferido da modelo mais famosa do mundo, Gisele Bündchen. Se isso ocorrer, estima-se que boa parte das reservas em dólar compradas pelos países da região do Golfo Pérsico, no Oriente Médio, migre para outras divisas. Isso abriria espaço para uma desvalorização ainda mais acentuada da moeda dos Estados Unidos.

O mesmo dilema do Catar aflige também outras economias do Conselho de Cooperação do Golfo, uma entidade que congrega seis países da região (Barein, Ku-wait, Omã, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos, além do próprio Catar). Em maior ou menor escala, todas essas economias têm registrado aumento de suas taxas de inflação como decorrência da valorização do petróleo e do enfraquecimento do dólar. O Kuwait já mexeu no câmbio. O próximo poderá ser o Catar. Em seguida, provavelmente todos os demais exportadores de petróleo do Golfo Pérsico. Esse é apenas o mais recente golpe contra o dólar. Nem mesmo os americanos parecem estimar a própria moeda como faziam no passado. Nas últimas semanas, alguns lojistas de Nova York, o principal centro financeiro do capitalismo americano e mundial, começaram a aceitar euros e outras moedas que vêm se fortalecendo, como o dólar canadense e a libra inglesa. "Decidimos que dinheiro é dinheiro", disse à TV Reuters Robert Chu, dono do empório East Village Wines. Faz sentido. Apenas nos últimos doze meses, o dólar caiu 12% diante do euro (veja o quadro).

Em alguns aspectos, o enfraquecimento da moeda americana se assemelha ao ocaso mundial da libra após a II Guerra Mundial. Depois do conflito, com o tratado de Bretton Woods, o padrão ouro, que tinha a libra como referência, foi substituído pelo padrão dólar. A substituição foi simbólica da perda de influência inglesa com o desmantelamento do império britânico. Não se imagina agora que, em maneira similar ao ocorrido sessenta anos atrás, o euro vá assumir o papel que hoje o dólar possui nas finanças globais. Afirma Norbert Walter, economista do Deutsche Bank: "Nos próximos dois ou três anos, haverá muita especulação sobre o enfraquecimento do dólar. Olhando mais adiante, entretanto, não há dúvida de que o poder militar e político dos Estados Unidos, sua vitalidade demográfica e sua habilidade de implantar mudanças estruturais vão dar novo vigor ao dólar no futuro". No entanto, para que a moeda americana recupere seu brilho, muito dependerá da disposição do próximo presidente dos Estados Unidos para enfrentar os ajustes de que a economia do país carece, acima deles a redução dos déficits nas finanças públicas e nas contas externas.

Arquivo do blog