Entrevista:O Estado inteligente

quinta-feira, fevereiro 21, 2008

Alberto Tamer - O Brasil está perdendo a China

21/2/2008

A China está aberta para o mundo e espera pelo Brasil. Ela importa e exporta mais de US$ 1 trilhão e nós só exportamos US$ 10,7 bilhões. Mas não é só mercado, estamos perdendo também investimentos de um país que tem um fundo de US$ 200 bilhões em busca de oportunidades.

“O mercado chinês está aberto para o Brasil. Estamos esperando não só bens que precisamos consumir, mas investimentos de empresas brasileiras que queiram atender ao mercado interno e exportar”, afirma à coluna Paul Liu, presidente da Câmara Brasil-China de Desenvolvimento Econômico (CBCDE).

A China voltou à pauta porque, diante da crise financeira e da retração da economia mundial, é um dos poucos países que resistem e continuam crescendo. Prevê-se um crescimento menor este ano, mas, mesmo assim, cerca de 10%, o que ainda é fantástico. O mercado chinês surge, neste momento, como uma espécie de “abrigo” para os países emergentes, entre outros, que vêem reduzidas suas oportunidades para exportar, afirma Liu.

É A HORA DO BRASIL?

Sim, afirma ele, mas falta namismo nas nossas intenções. “As exportações brasileiras para a China estão crescendo, porém menos que o aumento das importações chinesas. Há um enorme espaço para o Brasil ocupar. Estamos consumindo muito mais por causa da melhoria do padrão de vida, que provocou mudança nos hábitos de alimentação”, diz Paul Liu.

E, esclarece, antes os chineses comiam basicamente cereais. Hoje comem carne, leite, doces, sucos de frutas e iogurtes. Aqui, um mercado novo que o Brasil precisa explorar, principalmente neste momento em que a Europa faz exigências severas à carne brasileira.

“Informa-se que o Brasil exporta 75% de produtos primários e importa 70% de industriais e insumos. Por que não tentar mudar isso?”

Mas, como? Para Paul Liu, um caminho possível é sermos mais agressivos no mercado chinês, que “absorve de tudo”.

“É isso que outros países estão fazendo, ocupando cada vez mais espaço. Mesmo assim, há ainda lugar para todos, principalmente o Brasil. Somos um imenso mercado de mais de 1 bilhão de pessoas agora consumindo cada vez mais. Hoje, a China vive um processo de urbanização acelerada e maior consumo.”

COMPETIÇÃO

Há, sem dúvida, a questão dos custos favoráveis à China - um décimo do preço no Brasil - por causa da grande oferta da mão-de-obra, que pesa nos salários relativos. Mas, para Paul Liu, o grande segredo da China é a produção e a escala. Um exemplo, no ano passado, o Brasil produziu 1 milhão de aparelhos de ar-condicionado split; a China, 80 milhões; o mesmo pode ser dito quanto à produção de computadores.

CULPA NOSSA?

Aqui, Paul Liu é incisivo: “Não é só a questão dá mão-de-obra que torna os produtos chineses mais competitivos. Na comparação com o Brasil, o que pesa consideravelmente é o custo interno de produção e exportação. Aqui, estão incluídos juros e impostos mais do que o triplo da China. A isso se associam o real valorizado, o pesado custo do transporte e embarque.

A taxa de juros na China, para empréstimos, é de 7,47%, e sobre depósito bancário é de 4,14%, ( dados de 2007, no Brasil o juro básico é de 12,5% e os produtos exportados são sobrecarregados por uma variedade de impostos em cascata). A carga tributária lá é de 15,8% do Produto Interno Bruto e aqui passa de 35%.

E alerta: “A não ser que se adotem medidas urgentes, o Brasil passará a não competir não só com a China, mas com outros países asiáticos também. Vai ficar para trás, o que é uma pena porque os produtos brasileiros têm boa aceitação no mercado chinês”.

FALTAM PROJETOS

Aqui também Paul Liu alerta: Brasil não tem apresentado projetos aos empresários chineses interessados no País e com grande freqüência não há regras definidas para os investidores, sem contar o excesso de burocracia, que desamina e retarda muito as decisões. Mesmo assim, há dois investimentos chineses no Brasil: uma usina termoelétrica, de US$ 500 milhões, no Rio Grande do Sul; o gasoduto que liga Rio a Vitória, cuja segunda fase implicará em investimento de US$ 1,5 bilhão; além de empresas privadas chinesas que estão vindo para o Brasil.

A China está atenta à evolução do etanol, no Brasil, pois depende decisivamente do petróleo importado a preços imprevisíveis. Agora, passa de US$ 100. Mas é pouco. O governo chinês prometeu muito mais e não fez nada, observa a coluna.

“Sim, reconheço, mas, pergunto, seria culpa de algum descaso só da China? Afinal, as empresas chinesas estão investindo dezenas de bilhões de dólares no mundo todo! Por que só não no Brasil?”

E fica a pergunta para o governo e empresários responderem: por que não aqui? Será que não é também nossa culpa estarmos perdendo a China?

A VIDA DIÁRIA NA CHINA

Quem quiser conhecer o dia-a-dia dos chineses e dos brasileiros na China, seus problemas e suas reações ao novo mundo, leia o livro O Renascimento do Império de Cláudia Trevisan, correspondente do Estado em Pequim. Você vai se sentir lá, percebendo como os novos “capitalistas do comunismo” estão vendo o seu País e o mundo.

*E-mail: at@attglobal.net

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