Entrevista:O Estado inteligente

domingo, junho 01, 2008

dora kramer Tudo dominado

O ESTADO DE S PAULO
Anthony Garotinho provavelmente recebeu o golpe mais forte, mas a
operação da Polícia Federal que prendeu dois chefes de polícia em sua
gestão e o apontou como o chefe de uma quadrilha que operava na
Secretaria de Segurança Pública não atingiu apenas o ex-governador.

Expôs todo o aparato de Estado do Rio de Janeiro, que durante os sete
anos abrangidos pela investigação da PF no mínimo fez vista grossa,
podendo ter acobertado e até mesmo compactuado com os crimes de
corrupção passiva, lavagem de dinheiro e facilitação de contrabando,
apontados pelo Ministério Público Federal.

A despeito da abrangência do esquema, ninguém nos Poderes Executivo,
Legislativo e Judiciário estaduais jamais rompeu o acordo tácito do
silêncio.

A Polícia Federal mesmo só conseguiu romper essa rede de proteção e as
restrições legais que asseguram a autonomia das autoridades locais
depois de muita espera e de se valer da oportunidade criada por uma
outra investigação.

Anthony Garotinho, o deputado estadual Álvaro Lins, chefe de Polícia
Civil do Rio entre 2000 e 2006, e as outras dez pessoas acusadas de
participar do esquema obviamente não estavam sozinhos em suas
atividades nem são responsáveis pela invenção dessa roda.

Encontraram-na pronta para usufruto. A estrutura de Estado no Rio de
Janeiro está esgarçada há tanto tempo e o crime campeia por dentro
dela de maneira tão evidente que só os muito cínicos ou os muito
ingênuos estão autorizados a enxergar a cena como um caso isolado. A
operação da PF no Rio não conta a história de um governador, seu chefe
de polícia, dois laranjas e meia dúzia de delegados.

A operação da PF conta um pouco - mas muito pouco mesmo - sobre a
longa, obscura e não se sabe o quão abrangente história da conivência
entre o Estado e a criminalidade. Parceria que não é prerrogativa do
Rio, diga-se.

O inédito nesse episódio é a prisão em flagrante de um deputado, não
obstante a imunidade parlamentar, e a denúncia diretamente dirigida a
um ex-chefe de Poder Executivo. Isso nunca se viu.

Agora, é preciso que não se perca de vista o cenário como um todo.
Chefe de polícia nenhum põe a Secretaria de Segurança Pública a
trabalhar em prol de seu enriquecimento durante seis anos sem a
conivência - mesmo por omissão - do governador, que por sua vez não
sobrevive sem a colaboração da Assembléia Legislativa e a inércia da
Justiça.

O dinheiro arrecadado nesse tipo de esquema vai apenas em parte para
as compras de luxo do corrupto. Há que sustentar toda a rede de
cúmplices, mas o grosso mesmo vai para o velho caixa 2, financiador de
campanhas eleitorais.

É aí que se encontram as excelências mais insuspeitas. É aí que no
PMDB de Garotinho - para nos atermos ao caso em tela, embora o padrão
seja universal - muita gente se esbarra, gente de estofo federal,
estadual e municipal.

É aí também que se apresenta a encruzilhada. Se a investigação
prosseguir desenrolando a meada, pode ajudar a esclarecer, por
exemplo, por que 33 dos 70 deputados da Assembléia Legislativa do Rio,
que na sexta-feira votou a toque de caixa uma resolução para tirar
Álvaro Lins da prisão, têm débitos com a Justiça.

Pode auxiliar a desvendar o mistério da multiplicação de prestígio e
poder de deputados federais ligados (direta ou indiretamente) a
Garotinho que, do dia para a noite, de nulidades se transformaram em
sumidades dignas de ocupar postos de importância estratégica na Câmara
dos Deputados.

Mas, como reside também aí o grande perigo de começar a destrinchar os
caminhos do conluio entre o poder constituído e a criminalidade, o
mais provável é que a rede se movimente e assegure a devida proteção
aos seus.

Isto na melhor das hipóteses. Na pior, terminam os investigados
exigindo escusas dos investigadores. Para deixarem de ser ousados
antes de saberem com quem estão falando.

Negócio da China

O PT virou, mexeu e voltou ao ponto de origem na aliança entre o
governador Aécio Neves e o prefeito Fernando Pimentel, em Belo
Horizonte.

Se no fim era para aprovar a aliança "informal", a direção nacional do
PT não precisava ter feito tanto estardalhaço na encenação do
espetáculo do veto.

Bastava deixar as coisas seguirem o curso natural da aliança
não-oficial, construída por Aécio e Pimentel nesses moldes desde o
início, quando os dois combinaram lançar candidato filiado a um
terceiro partido, o PSB.

Depois de dois meses de vaivém, os fiadores da aliança ganharam
repercussão nacional, propaganda eleitoral gratuita no plano local e
posaram de mocinhos - os heróis da conciliação.

E o PT? O PT perdeu 60 dias debatendo o nada, criou um novo mote de
divisão no partido e ainda saiu na foto como o vilão da história.

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