A relação direta entre o aumento do Bolsa Família e os índices de popularidade do presidente Lula, que já emitem sinais iniciais de desgaste, é outro fator político preocupante, por mais que se conheça a relação direta de causa e efeito entre o assistencialismo do governo e sua popularidade.
O cientista político Sérgio Abranches, que faz um acompanhamento do índice de Confiança do Consumidor da Fundação Getulio Vargas e o relaciona com os índices de popularidade dos presidentes, ressalta que o índice geral, que havia subido ligeiramente, no mês passado (2%), em relação a abril, em junho caiu 6,5%, em relação a maio, passando de 114,6 para 107,2 pontos.
No boletim do mês passado, registrado aqui na coluna, Abranches havia chamado a atenção para o fato de que o índice de satisfação com a situação presente havia crescido mais que o de expectativas para os próximos seis meses, cuja melhora desacelerava claramente.
“Esse esfriamento das expectativas constituía um sinal provável de que o consumidor estava ficando mais pessimista por causa da inflação, e que essa deterioração de expectativas se acentuaria nos meses seguintes e contaminaria o nível de satisfação presente”, lembra ele.
Entre os meses de maio e junho, tanto o índice de satisfação quanto o de expectativas caíram na mesma proporção: 6,3 % e 6,6%.Sérgio Abranches nota que, se entre maio de 2007 e maio de 2008, o índice de satisfação teve um crescimento “ forte” , de 15,5%, entre junho/2007 e junho/ 2008, a alta de 6,6% foi “bem menos expressiva”.
Já o índice de expectativas teve comportamento mais negativo, ficando estável entre maio/2007 e maio/2008, e caindo 6,0% entre junho/2007-junho/ 2008. Segundo Sérgio Abranches, “essa deterioração nas expectativas e a menor satisfação do consumidor com a situação atual terão impacto negativo na popularidade do presidente Lula”.
Se a inflação não ceder “com rapidez e de forma significativa”, a tendência, diz ele, “é o aumento daqueles que avaliam negativamente a situação atual”. Nesse caso, “pode-se esperar quedas sucessivas e significativas da popularidade do presidente nos meses de julho, agosto e setembro”, afirma a análise do cientista político Sérgio Abranches.
O aumento da inflação trouxe a público outra questão política de relevo: a determinação do governo para que o Instituto de Pesquisas Aplicadas (Ipea), um órgão transferido recentemente para o Ministério de Assuntos Estratégicos, de Mangabeira Unger, suspendesse seu boletim de conjuntura divulgado trimestralmente desde 1987, originário de reuniões que começaram no fim dos anos de 1970, quando Delfim Netto era ministro do Planejamento, ainda, portanto, no período de governos militares.
O objetivo de trocar opiniões sobre economia, reunindo gente de fora e do governo, foi ampliado quando se decidiu usar as atas, que eram distribuídas entre diversas autoridades com base nas gravações dos debates, para colocar essas opiniões por escrito publicamente, surgindo assim o Boletim de Conjuntura do Ipea, de longe a publicação mais acessada de todos os produtos institucionais que o instituto produzia.
Durante todos esses anos, havia sido construída uma reputação de autonomia, que tornava os números do Ipea uma referência do debate econômico. O boletim teve, até 2007, seis coordenadores: José Claudio Ferreira da Silva; Ricardo Markwald; Claudio Considera; Renato Villela; Paulo Levy e Fábio Giambiagi, que assumira a coordenação em 2004 e meses atrás foi a “expurgado” pela nova diretoria do Ipea, juntamente com outros economistas não ligados à visão política predominante no governo.
Fábio Giambiagi classifica a decisão de “mesquinha”, pois, “por uma diferença de visão de mundo com as pessoas que estavam antes, acabam de uma penada com uma história de décadas que antecedeu em muito a presença dos responsáveis pela conjuntura nos últimos anos”.
Giambiagi registra, no entanto, a incoerência do diretor João Sicsu, que, depois de declarar que o Ipea não deve se manifestar sobre o curto prazo, disse que “a taxa de juros é exorbitante”.
Para Giambiagi, o instituto “está se convertendo em reduto de um grupo político cuja função primordial é atacar o Banco Central. Quando a inflação estava em queda, era uma excentricidade folclórica.
Com a inflação subindo do jeito que está, é um exercício perigoso”.
Foi indevida minha afirmação, na coluna de ontem, de que a prioridade ao combate à fome foi uma ação “apropriada” pelo governo Lula. A criação do Conselho de Segurança Alimentar (Consea) no governo Itamar Franco deveu-se à campanha de Betinho contra a fome e foi uma proposta do chamado Governo Paralelo do PT a partir do documento “Por uma política nacional de segurança alimentar”, levada a Itamar por Lula. E que, justiça seja feita, coincidia com o pensamento do novo presidente, que em um de seus primeiros discursos no cargo perguntou: “que modernidade é esta que produz tanta fome e tanta miséria?”.
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