O mercado sentiu em cheio o efeito de duas pressões de baixa: o anúncio de novos rebaixamentos de bancos americanos, que confirmaram perdas, e mais um aumento no preço do barril do petróleo, agora beirando os US$ 143. Nem animaram os bons resultados da economia americana - foi divulgado o consumo interno de maio, que teve aumento de 0,8%.
Vamos ter uma segunda-feira ainda tensa, com as bolsas podendo entrar numa fase de vendas. Isso, no entanto, não indica até agora descontrole ou movimento de vendas generalizadas. Muito vai depender dos balanços que devem ser anunciados.
AFINAL, O QUE ESTÁ HAVENDO?
Dá para entender o que está acontecendo na economia e nas bolsas do mundo? Vamos tentar. Primeiro, alguns bancos importantes anunciaram novas perdas em decorrência da crise do mercado imobiliário.
O segundo fator foi o salto do preço do petróleo, sinalizando menor crescimento e, em conseqüência, também menor lucro das empresas com ações na bolsa voltada para o mercado consumidor, seguindo as financeiras já em baixa. Aqui entram mais dois fatores perversos, que formam um círculo vicioso negativo:
1 - A desvalorização das ações, principalmente das financeiras, empurrou ainda mais os investidores para os fundos de commodities, em busca de lucro e segurança;
2 - Mas, por sua vez, esse afluxo de recursos para os fundos provoca o aumento do preço do petróleo, já em alta por causa da maior demanda, oferta estável e tensões geopolíticas. Isso também afeta os preços dos alimentos, através do alto custo de fertilizante, óleos combustível e diesel, intensamente utilizados no plantio, colheita e comercialização das safras.
Temos aí dois fatores convergentes que pressionam a inflação, migração para os fundos de commodities, preço dos alimentos. Isso, mais o aumento da demanda, explica em grande parte o surto inflacionário atual.
TEM MAIS, TEM MAIS...
Mas o processo não pára aí; a inflação alta obriga os bancos centrais a elevar a taxa de juro para conter a demanda. A conseqüência desse processo é um crescimento menor das economias americana e européia, já estagnadas, e de países emergentes, como o Brasil, ou em desenvolvimento.
E aí se fecha o círculo vicioso: menor crescimento, menor previsão de lucro, menor valorização das ações, quer seja das empresas voltadas para o consumo, ou das financeiras, já abaladas pela crise imobiliária. E começa tudo de novo, migração para os fundos de commodities, etc.
E TEM O DÓLAR TAMBÉM
Chega? Até seria bom, mas ainda não é tudo. Todo esse processo leva a uma desvalorização do dólar. Mas, como as commodities - alimentos, petróleo - são comercializadas em dólar, os produtores aumentam os preços para compensar a perda com o câmbio, com o dólar que vale menos. O petróleo é o principal afetado em curto prazo pelo recuo do dólar. Outros fatores determinantes da alta do preço são a permanência do consumo elevado, a estabilização da oferta e as tensões políticas nos integrantes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep).
O menor crescimento econômico e menor consumo dos países desenvolvidos estão sendo anulados pelo crescimento da demanda sustentado pelos países emergentes e em desenvolvimento, que não foram atingido pela crise.
E O BRASIL NISSO TUDO?
Nossa bolsa segue as oscilações da americana mesmo porque grande parte dos investidores de lá está aqui também. Além disso, as grandes empresas brasileiras estão na bolsa americana. É verdade que isso poderia ser contrabalançado pelos lucros que a maioria das empresas vem obtendo, há anos, na bolsa paulista, mas esse não chega a ser, no momento, um elemento determinante no comportamento das ações.
Quanto aos outros fatores, temos petróleo, mas importamos, e, mesmo o produzido aqui, em real, tem seus derivados vendidos com base na cotação internacional, hoje de quase US$ 143 o barril. O governo e a Petrobrás, estão, por enquanto, absorvendo em parte a alta dos preços internacionais sobre a gasolina e o óleo diesel, mas os repassa para os demais derivados.
Mas não estamos de todo imunes, porque a alta externa do petróleo é repassada para os demais derivados, principalmente fertilizantes e combustíveis. Além disso, o Brasil importa a maior parte do fertilizante que consome.
GOVERNO FEZ POUCO
Não estamos livres do que se passou lá fora, nesta semana, mas apenas melhor do que os outros. Temos um mercado financeiro e bancário sólido, que não foi atingido pela crise externa; somos afetados diretamente na bolsa, onde as empresas vão buscar capitais, no comércio exterior, que desacelera, e principalmente na inflação, hoje a principal ameaça do Brasil à preservação do crescimento econômico.
E aqui uma observação que deveria servir como alerta para o governo: não adianta a ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Roussef, afirmar que o governo está muito atento à inflação. Insistimos, falta uma ação mais firme que, decididamente, não vemos nessa decisão de aumentar o superávit primário 0,50 ponto do PIB. Na verdade, os gastos do governo, representando afluxo de recursos no mercado interno, podem até crescer com o aumento da arrecadação. Nunca o governo teve tanto dinheiro.
No fundo, é insignificante a contribuição fiscal anunciada pelo governo para conter o avanço da inflação, não significa praticamente nada. É preciso mais, ministra Dilma, muito, muito mais, principalmente com os índices confirmando, nesta semana, nova alta dos preços em tudo: alimentos, energia, serviços.
A manter o ritmo do primeiro semestre, se ficarmos apenas com o freio dos juros, mesmo apertados, vamos entrar na armadilha da indexação que nos leva à terra de ninguém. Exagero? Sim, e por que não? Tudo é válido para quebrar a expectativa e a inércia inflacionária.