Entrevista:O Estado inteligente

domingo, março 16, 2008

Filtro ético

Talvez não haja melhor termo para designar o que acontece na Assembléia Legislativa do Rio de Janeiro do que aquele criado pela oposição no segundo governo Vargas para denominar sobre o que estaria assentado o Palácio do Catete: “Um mar de lama.” É o que parece cercar a Alerj, foco de tantos casos de imoralidade pública e que agora é manchada por um dos mais grotescos escândalos da sua acidentada história: o uso de mulheres humildes, com vários filhos, para o desvio de dinheiro público em benefício de uma quadrilha ligada, tudo indica, a parlamentares.

As pessoas eram atraídas com a promessa de inscrição no Bolsa Família.

Para isso, entregavam documentos aos aliciadores. E terminavam nomeadas, sem saber, em gabinetes de deputados. E com isso cada um dos filhos passava a ser beneficiado por um auxílio-educação de R$ 450 mensais. Jamais receberiam salário e benefício, embolsados pela quadrilha, num golpe inominável. Oito deputados são investigados pela Comissão de Ética da Alerj: Álvaro Lins (PMDB), exchefe da Polícia Civil, investigado pela Polícia Federal por atos cometidos antes de assumir na Assembléia; Délio Leal (PMDB), que renunciou à presidência da Comissão de Ética ao ser denunciado; Edino Fonseca (PR), Jane Cozzolino (PTC), cuja irmã, Núbia, é prefeita de Magé, pólo de outro escândalo; João Peixoto (PSDC), Renata do Posto (PTB), Tucalo (PSC) e Marco Figueiredo (PSC).

Este caso, os sinais exteriores de riqueza de deputados sem respaldo na renda declarada à Receita — tema de uma série de reportagens do GLOBO em 2004 intitulada “Homens de bens” —, e várias outras passagens desabonadoras transformaram a Alerj em sinônimo de delinqüência política. A Câmara dos Vereadores, a “Gaiola de Ouro”, não fica atrás.

É pouco, embora correto, dizer que o eleitorado precisa ficar cada vez mais atento à folha corrida de quem pede voto. A questão requer, paralelamente a isso, a ação de organismos de Estado para investigar, julgar e punir os responsáveis por essa infiltração da criminalidade na vida pública. A polícia e o Ministério Público trabalham na investigação dessa fraude. Já a Justiça eleitoral tem a missão decisiva de servir de primeira barreira à candidatura de pessoas com prontuários policiais e fichas nos fóruns judiciais, ou reconhecidamente desonestas.

É animador que o ministro do Supremo a presidir o Tribunal Superior Eleitoral nas eleições deste ano, Ayres Britto, concorde que a Constituição dá respaldo a que juízes neguem o registro de candidaturas e até impeçam a posse de pessoas sem a devida qualificação para a vida pública, mesmo que jamais tenham sido condenadas em última instância. Os escândalos provam que muito do desgaste de instituições-chave para a democracia representativa será evitado se a Justiça eleitoral servir de filtro ético para evitar o uso da política pela bandidagem de colarinho-branco.

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