Quando Lula afirma que inventou a roda, sabe que os bem informados não o levarão a sério
A FRASE do Lula, afirmando que "se porrada educasse, bandido saía da prisão santo", deixou muita gente chocada. É que, segundo aquelas pessoas, uma expressão tão chula não deveria ser usada por um presidente da República.Mas é que Lula faz isso de propósito, ainda não perceberam? Há ocasiões em que ele finge ser gentleman, usa até palavras eruditas, e há outras em que faz questão de mostrar que veio do povo, que ele é povo. Este ano é um ano eleitoral e Lula, que nunca desceu do palanque, vai aproveitando as oportunidades para mobilizar seu eleitorado. Esperto, alega que não é candidato para assim justificar o programa Territórios da Cidadania, que vai beneficiar 24 milhões de pessoas e carrear votos para seu partido e os partidos aliados. Planta os alicerces da campanha presidencial de 2010, lance decisivo para o seu futuro político. Já imaginou se o candidato dele perde as eleições? Isso não vai permitir, nem que seja a porradas.
Lula não dorme de touca. No final do ano passado, já lançara um programa que beneficia jovens em idade de votar e em seguida aumentou a dotação do Bolsa Família. Lembram-se do que ele disse quando sentiu que a CPMF ia acabar? Afirmou que a oposição -que é inimiga do pobre, claro-, cortando R$ 40 bilhões do orçamento, ia deixar sem dinheiro o Bolsa Família e a Saúde. Defensor dos desvalidos, esbravejou, gesticulou. E o que aconteceu? Deu mais dinheiro para o Bolsa Família e inventou agora esse programa de ajuda aos pobres do campo. O lançamento de cada programa em cada município ele faz pessoalmente e diz que não está em campanha.
Sem compromisso com a verdade, afirma o que lhe convém. Outro dia disse, depois de insultar o Judiciário: "Quando estavam na oposição não governaram e agora querem me impedir de governar". Ninguém nunca governou o Brasil, só Lula. Tem a coragem de afirmar que foi ele quem acabou com a inflação, quando todo mundo sabe que a inflação foi controlada graças ao Plano Real e a medidas complementares como o superávit primário e a Lei de Responsabilidade Fiscal. Lula e o PT se opuseram a essas medidas: Lula chegou a afirmar, então, que o Plano Real era uma jogada eleitoral que ia durar só até o fim do ano; que o superávit primário era para beneficiar os banqueiros internacionais e, quanto à LRF, tentou impedir-lhe a aprovação tanto na Câmara como no Senado; não o conseguindo, entrou com uma ação no Supremo Tribunal para sustar-lhe a aplicação.
Opôs-se ferozmente à privatização das telefônicas, graças à qual, hoje, dezenas de milhões de brasileiros possuem um celular. Chegou a dizer que, se fosse eleito, iria reestatizar as telefônicas e todas as empresas que haviam sido privatizadas. Como as privatizações deram certo, calou-se e agora privatiza estradas, usinas, portos, rindo das antigas bravatas, de quando era oposição.
Lula é um populista típico. Quando afirma que inventou a roda, sabe muito bem que as pessoas bem informadas não o levarão a sério. Mas ele não fala para essas pessoas e, sim, para as que, beneficiadas por ele, acreditam em tudo o que diz. Do mesmo modo age o Maluf, quando afirma que a assinatura no documento que veio da Suíça, provando que a conta é sua, foi falsificada por seus inimigos. "Mas o senhor tem inimigos na Suíça?", alguém perguntou. E ele: "Tenho inimigos em todo canto". E os malufistas dirão: "É mesmo, ele tem inimigo em todo canto". Sim, porque Lula e Maluf, como se sabe, são perseguidos por aqueles que odeiam pobres e falam uma língua em que não existe a palavra "porrada".
Usar palavras chulas não é o pior do Lula, menos ainda neste caso, já que "porrada" deriva de "porra", que significa "cacete". Logo, "porrada" não é nada mais do que "cacetada". É que, com o tempo, ela adquiriu outras conotações, até mesmo obscenas. Por isso que, muitos anos atrás, quando aqui chegou um embaixador venezuelano cujo sobrenome era Porras y Porras, criou-se, por assim dizer, um impasse diplomático. Já imaginou, no Itamaraty, anunciar-se a presença de um embaixador com aquele sobrenome? O jeito foi trocá-lo por Parras y Parras.
Para quem fala espanhol, a palavra "porra" não tem conotação obscena, como tem para nós, tanto que, no Peru, um dos santos mais adorados é San Martín de Porras, também conhecido como San Martín de Porres. Quando estava exilado em Lima, mandei uma nota para o "Pasquim" brincando com o nome do santo. Aliás, a nota era dirigida particularmente ao Jaguar ("Confesso que Bebi"), menos pelas "porras" do que pelos "porres".