Entrevista:O Estado inteligente

sábado, março 01, 2008

Erros administrativos

Mauro Chaves

Apropriar-se o funcionário público de dinheiro, valor ou qualquer outro bem móvel, público ou particular, de quem tem a posse em razão do cargo, ou desviá-lo, em proveito próprio ou alheio, é um erro administrativo. Pois, sem dúvida, esse funcionário errou, administrativamente, por não ter percebido que o dinheiro público - como o nome diz - é do público, e não dele.

Apropriar-se de dinheiro ou qualquer utilidade, que, no exercício do cargo, recebeu por erro de outrem, é um inegável erro administrativo, pois quem faz tal apropriação não está administrando com correção o curso que o dinheiro deveria seguir, em direção diferente da que leva a seu próprio bolso.

Retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício ou praticá-lo contra disposição expressa em lei, para satisfazer interesse ou sentimento pessoal, é um erro administrativo. Sem dúvida, pois isso significa uma falha na administração do próprio interesse e do sentimento pessoal, assim como na administração da própria interpretação do texto legal.

Deixar o funcionário, por indulgência, de responsabilizar subordinado que cometeu infração no exercício do cargo ou, quando lhe falte competência, não levar o fato ao conhecimento da autoridade competente é um erro administrativo. Claro que é, pois esse funcionário não soube administrar seu relacionamento com o subordinado, deixando que o fator indulgência interferisse em sua capacidade de avaliação de quem está sob suas ordens.

Patrocinar, direta ou indiretamente, interesse privado perante a administração pública, valendo-se da qualidade de funcionário, é um insofismável erro administrativo, posto que o interesse privado tem formas de patrocínio que dispensam o uso da influência pública e o fundamental, para o servidor, é administrar a distinta posição que tem na vida pública da que tem na privada.

Auxiliar a subtrair-se à ação de autoridade pública autor de crime a que é cominada pena de reclusão é um erro administrativo, pois quem prestou tal auxílio não soube administrar adequadamente sua obrigação de comunicar à autoridade pública a ocorrência de desrespeito à lei, por parte de quem é seu conhecido.

Solicitar, exigir, cobrar ou obter, para si ou para outrem, vantagem ou promessa de vantagem, a pretexto de influir em ato praticado por funcionário público no exercício da função, é um erro administrativo, pois quem assim procede não está sabendo administrar com eficácia sua capacidade de isenção e lisura em relação aos que estão imbuídos, pelo Poder de Estado, da função de tomar decisões.

Exigir, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, é um indiscutível erro administrativo, porquanto é elementar que o servidor público saiba administrar seus desejos de modo a que eles se enderecem apenas a vantagens que lhe são devidas.

Solicitar ou receber dinheiro ou qualquer outra utilidade, a pretexto de influir em juiz, jurado, órgão do Ministério Público, funcionário de Justiça, perito, tradutor, intérprete ou testemunha é um notório erro administrativo, pois o que age dessa forma não está administrando, corretamente, a interpretação dos critérios de avaliação, que fazem os agentes da tutela jurisdicional do Estado, a respeito de sua própria moralidade.

Dar às verbas ou rendas públicas aplicação diversa da estabelecida em lei é um gritante erro administrativo, visto que o princípio elementar de uma administração correta é o da obediência às especificações dos destinos dos recursos públicos, definidas pela legislação vigente.

Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício, é um erro administrativo, pois quem assim procede não está sabendo administrar sua confiança no servidor público, na medida em que o julga capaz de sucumbir à mera atração das vantagens materiais, em detrimento da nobre função de servir à coletividade.

Subtrair, ou inutilizar, total ou parcialmente, livro oficial, processo ou documento confiado à custódia de funcionário, em razão de ofício, ou de particular em serviço público, é um claro erro administrativo. Pois quem assim procede está revelando incapacidade de administrar a valorização de guardião que o servidor público tem da coisa pública.

Falsificar, no todo ou em parte, documento público, ou alterar documento público verdadeiro, é um evidente erro administrativo, capaz de atestar que o falsificador administrou mal sua condição ética de distinguir o que é real do que é falso.

Omitir, em documento público ou particular, declaração que dele devia constar, ou nele inserir ou fazer inserir declaração falsa ou diversa da que devia ser escrita, com o fim de prejudicar direito, criar obrigação ou alterar a verdade sobre fato juridicamente relevante, é um característico erro administrativo, pois quem é administrativamente correto não costuma praticar essas coisas.

Todos estes conceitos, até aqui expendidos, derivam da profunda renovação do Direito Penal brasileiro, propiciada pela revolucionária interpretação, feita pelo chefe de Estado e governo, da conduta de sua ex-ministra da Igualdade Racial. Certamente os juristas do mundo inteiro haverão de debruçar-se em alentados estudos e mergulhar em infindáveis lucubrações para absorver, em toda a sua riqueza hermenêutica, o manancial de reflexões filosóficas que inspira o conceito de "erro administrativo" lançado por nosso presidente da República, inspirado no comportamento de sua ex-ministra. Esta é a contribuição que este país está dando à cultura jurídica do mundo - como nunca antes em sua História.

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