Entrevista:O Estado inteligente

sábado, março 08, 2008

Dora Kramer

Inspiração carioca


"O que acontece no Rio, inspira o Brasil". A frase, perdida lá no meio da entrevista do governador Aécio Neves sobre a aliança do PSDB com Fernando Gabeira para a eleição da Prefeitura do Rio de Janeiro, é mais que uma frase inspirada.

A começar pelo fato de não ser propriamente uma aliança, mas um ato de adoção: o PSDB incorpora Gabeira não como parceiro, mas como um dos seus, num lance em que a ficha de filiação é detalhe. O importante é o simbolismo.

Quando abre mão da candidatura própria, do ponto de vista formal, porque não tem um nome forte para disputar na segunda cidade mais importante do País, o PSDB mostra que resolveu não assistir impávido à movimentação do governo federal e começa a se mexer para a eleição municipal, esquentando os tamborins para a sucessão presidencial de 2010.

O controle das três principais capitais brasileiras, Rio, São Paulo e Belo Horizonte, já é, para o tucanato, um excelente início de conversa para 2010. À exceção de Minas, onde o peso do governador assegura a vantagem independentemente da vitória na capital, nos outros dois Estados a briga é dura. Em São Paulo com o PT e no Rio contra a própria fragilidade dos tucanos.

O PSDB emite sinal evidente, já detectado pelo prefeito Cesar Maia, de que não pretende dar prioridade, muito menos exclusividade, à tradicional parceria com o ex-PFL, hoje Democratas.

A análise de Maia põe a candidatura de Gabeira num cenário de "preparação" da candidatura presidencial tucana à Presidência da República (ele aposta que com José Serra na cabeça da chapa) e de aproximação com a esquerda.

Claro que o PSDB faz esse movimento. Vai disputar um eleitorado que ainda identifica o PT com esse campo ideológico e precisa pescar nessas águas. Mas se o tucanato não pretende ficar preso só ao Democratas, tampouco tem intenção de abrir mão dessa companhia. A ação não é excludente.

Obviamente quer todos os parceiros que puder conseguir, entre eles o PMDB, que estará com Lula enquanto ele for presidente da República, continuará com ele se exibir capacidade de transferir votos e eleger o sucessor, mas mudará de idéia ao menor sinal de alteração do quadro em matéria de perspectiva de poder.

O jogo do PSDB começa - o Rio é o exemplo - diferente do que foi em 2006, quando o partido fez a opção preferencial por jogar tudo para garantir o governo de São Paulo e, no mais, parecia concorrer para cumprir a tabela eleitoral, aí incluída a eleição para presidente.

Os tucanos deram-se ao desfrute de apresentar um candidato (Eduardo Paes) com zero chance, só para constar. Agora, porém, o gesto é na direção oposta: o PSDB deixa de lado afirmações partidárias irrealistas e adota um ícone do bom combate como candidato na cidade que produz as modas, cria as ondas, como diz Aécio, inspira o País, e pode forjar um discurso novo para substituir a cansativa, anacrônica e artificial cantilena de liberalismos versus esquerdismos que dominou o debate na última eleição presidencial.

A exigência de Gabeira, de que sua candidatura não sirva de instrumento à briga entre governo e oposição no plano federal, não é um obstáculo. Ao contrário: combina exatamente com o plano do PSDB de não se confrontar com Lula, mas de tentar suplantá-lo sem desqualificar seu papel de mito. Mas de uma época que se encerra.

Trindade

Juntos na operação de retirada da candidatura do radialista Wagner Montes, líder nas pesquisas, para abrir espaço ao senador Marcelo Crivella na disputa pela Prefeitura do Rio, o PDT e a Igreja Universal estão juntos também no furor litigante de abrir milhares de ações judiciais contra veículos de comunicação País afora.

Naquela fidalguia que lhe é peculiar, o deputado pedetista e presidente da Força Sindical, Paulo Pereira da Silva, anunciou aos palavrões que, assim como a Universal, vai retaliar.

Ambas as estruturas, a Força e a "Igreja", cresceram a poder de dízimos (a versão laica do imposto sindical) e favorecimentos do Estado ao qual sempre se aliam, seja quem for o ocupante da vez. Desse caixa forte sai o dinheiro para financiar suas ações, inclusive as judiciais.

Por identidade de procedimentos vai se configurando uma aproximação em que Força, PDT e Universal atuam como braços político, religioso e sindical de uma nem um pouco santíssima trindade.

A contar pela reação de ministros do Supremo, da OAB e da Associação dos Magistrados Brasileiros, a Justiça dificilmente aceitará servir de instrumento a esse tipo de guerra.

O custo financeiro de derrotas na Justiça não preocupa os "bispos", os sindicalistas nem os pedetistas, já que o dinheiro vem do alheio e não é problema.

Já o custo político é um risco para o Palácio do Planalto, pois a tríade hoje é fiel, mas poderá vir a ser uma desconfortável aliada.

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