A campanha eleitoral no Paraguai gira em torno de dois temas principais. O primeiro é uma troca de acusações de corrupção e irregularidades que não deixa ninguém imaculado. Subornos, comissões, contratos fajutos, conluios com o crime organizado fazem o trivial variado do cardápio de acusações que os candidatos presidenciais trocam entre si. O outro, como mostrou reportagem publicada na semana passada pelo Estado, são as relações com o Brasil, país que a maioria dos candidatos vê como um império que tem mal contidas ambições sobre o território e as riquezas paraguaias.
Dos três principais candidatos - o bispo Fernando Lugo, com 31% das intenções de voto, o general Lino Oviedo, com 28%, e a candidata do partido no governo, Blanca Ovelar, com 27% -, somente Oviedo não é francamente hostil ao Brasil. Entre os candidatos menos cotados também existe a mesma disposição. Júlio López, do Partido dos Trabalhadores, por exemplo, afirma que a "invasão" dos brasiguaios - fazendeiros brasileiros que possuem terras no Paraguai - não será resolvida com a naturalização desses proprietários. Quer uma reforma agrária radical, que inclua a expulsão dos brasiguaios.
O Tratado de Itaipu e os contratos assinados entre os governos do Brasil e do Paraguai para a partilha da energia da usina hidrelétrica binacional são o principal alvo da ofensiva guarani. Todos os candidatos querem a revisão desses documentos. O general Oviedo prefere a via diplomática para mudar o que puder ser mudado. Mas Fernando Lugo e Blanca Ovelar falam em decisões unilaterais, sugerindo que poderão tentar fazer com a eletricidade o que o presidente Evo Morales fez com os hidrocarbonetos na Bolívia - a nacionalização dos recursos e das instalações.
Fernando Lugo, candidato favorito até agora, tem como principal ponto de seu programa a "recuperação da soberania energética". Alega que o país recebe apenas US$ 200 milhões anuais - um "preço de custo" - pela venda da energia ao Brasil e quer transformar o Paraguai num exportador "livre" de eletricidade, com o que receberia US$ 1,8 bilhão anual - um "preço justo". A candidata Blanca Ovelar, do Partido Colorado, que está no poder há 66 anos, segue a mesma trilha.
Ocorre que os dois países têm obrigações contratuais. Cada um tem direito à metade da energia gerada por Itaipu. O Brasil tem mercado para a sua parte; o Paraguai só usa 13% da sua cota. A sobra é obrigatoriamente transferida para o Brasil, não a "preço de mercado", mas a uma remuneração previamente acertada que corresponde a uma compensação por cessão de direito de uso. Essa foi a fórmula encontrada em 1973 para viabilizar a construção da usina binacional, pois o Paraguai não tinha condições de compartilhar o custo financeiro da obra. O Brasil assumiu sozinho o encargo e, depois, também o ônus da instalação das novas turbinas que elevaram a capacidade de geração da usina. Ao Paraguai coube receber royalties, taxas de administração e supervisão, rendimentos de capital - como dono de metade da usina - e a remuneração pela cessão da energia, tendo assumido uma dívida que vencerá em 2023.
Há tempos, setores nacionalistas paraguaios defendem a revisão do Tratado e dos contratos. Há cerca de um ano e meio, por exemplo, o jornal ABC Color iniciou uma campanha de denúncias contra o "imperialismo" brasileiro. Segundo o jornal, a presença dos brasiguaios - que haviam sido atraídos pelo baixo preço da terra no Paraguai - nas áreas próximas a Itaipu é parte de um projeto geopolítico de anexação. "Não é difícil temer que, em poucos anos, o Brasil pretenda anexar o nosso país ou mantê-lo como Estado livre associado, como os Estados Unidos fazem com Porto Rico" - delirava o jornal em editorial.
Em janeiro, o candidato Lino Oviedo esteve durante uma hora com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Brasília, para expor a sua plataforma eleitoral. Em março, o bispo Fernando Lugo será recebido por Lula, a quem dirá, como anunciou, que pretende renegociar o preço da energia cedida ao Brasil. Essa é uma pretensão que precisa ser liquidada no nascedouro. Se o presidente da República não disser claramente ao candidato que o Brasil não admitirá mudanças no contrato, que garante o fornecimento de 40% da energia consumida no centro industrial do Brasil, Itaipu certamente se transformará em um grave contencioso político.
Dos três principais candidatos - o bispo Fernando Lugo, com 31% das intenções de voto, o general Lino Oviedo, com 28%, e a candidata do partido no governo, Blanca Ovelar, com 27% -, somente Oviedo não é francamente hostil ao Brasil. Entre os candidatos menos cotados também existe a mesma disposição. Júlio López, do Partido dos Trabalhadores, por exemplo, afirma que a "invasão" dos brasiguaios - fazendeiros brasileiros que possuem terras no Paraguai - não será resolvida com a naturalização desses proprietários. Quer uma reforma agrária radical, que inclua a expulsão dos brasiguaios.
O Tratado de Itaipu e os contratos assinados entre os governos do Brasil e do Paraguai para a partilha da energia da usina hidrelétrica binacional são o principal alvo da ofensiva guarani. Todos os candidatos querem a revisão desses documentos. O general Oviedo prefere a via diplomática para mudar o que puder ser mudado. Mas Fernando Lugo e Blanca Ovelar falam em decisões unilaterais, sugerindo que poderão tentar fazer com a eletricidade o que o presidente Evo Morales fez com os hidrocarbonetos na Bolívia - a nacionalização dos recursos e das instalações.
Fernando Lugo, candidato favorito até agora, tem como principal ponto de seu programa a "recuperação da soberania energética". Alega que o país recebe apenas US$ 200 milhões anuais - um "preço de custo" - pela venda da energia ao Brasil e quer transformar o Paraguai num exportador "livre" de eletricidade, com o que receberia US$ 1,8 bilhão anual - um "preço justo". A candidata Blanca Ovelar, do Partido Colorado, que está no poder há 66 anos, segue a mesma trilha.
Ocorre que os dois países têm obrigações contratuais. Cada um tem direito à metade da energia gerada por Itaipu. O Brasil tem mercado para a sua parte; o Paraguai só usa 13% da sua cota. A sobra é obrigatoriamente transferida para o Brasil, não a "preço de mercado", mas a uma remuneração previamente acertada que corresponde a uma compensação por cessão de direito de uso. Essa foi a fórmula encontrada em 1973 para viabilizar a construção da usina binacional, pois o Paraguai não tinha condições de compartilhar o custo financeiro da obra. O Brasil assumiu sozinho o encargo e, depois, também o ônus da instalação das novas turbinas que elevaram a capacidade de geração da usina. Ao Paraguai coube receber royalties, taxas de administração e supervisão, rendimentos de capital - como dono de metade da usina - e a remuneração pela cessão da energia, tendo assumido uma dívida que vencerá em 2023.
Há tempos, setores nacionalistas paraguaios defendem a revisão do Tratado e dos contratos. Há cerca de um ano e meio, por exemplo, o jornal ABC Color iniciou uma campanha de denúncias contra o "imperialismo" brasileiro. Segundo o jornal, a presença dos brasiguaios - que haviam sido atraídos pelo baixo preço da terra no Paraguai - nas áreas próximas a Itaipu é parte de um projeto geopolítico de anexação. "Não é difícil temer que, em poucos anos, o Brasil pretenda anexar o nosso país ou mantê-lo como Estado livre associado, como os Estados Unidos fazem com Porto Rico" - delirava o jornal em editorial.
Em janeiro, o candidato Lino Oviedo esteve durante uma hora com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em Brasília, para expor a sua plataforma eleitoral. Em março, o bispo Fernando Lugo será recebido por Lula, a quem dirá, como anunciou, que pretende renegociar o preço da energia cedida ao Brasil. Essa é uma pretensão que precisa ser liquidada no nascedouro. Se o presidente da República não disser claramente ao candidato que o Brasil não admitirá mudanças no contrato, que garante o fornecimento de 40% da energia consumida no centro industrial do Brasil, Itaipu certamente se transformará em um grave contencioso político.